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Ensaios-->Sans Gruvitch e a obra do único sentido -- 03/06/2002 - 20:30 (Almado Corpo) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Sans Gruvitch é holandês da cidade de Amsterdã. Nasceu no dia 18 de maio de 1948, numa tarde em que o sol estava incrustado entre nuvens e uma montanha ao longe partida e mostrava apenas um dos lados de sua face.
Sua mãe, após meses de uma gravidez complicada que já predizia a troca de existências, morreu assim que deu a luz e a sombra ao menino. O pai foi quem lhe ofereceu, em substituição, o conforto do colo materno, preservando sua segurança durante o período em que a criança não conhecia os sacrifícios que viria a fazer em nome da razão adulta de viver em sociedade. Portava, ainda, a condição infantil de ser plenamente livre dentro da prisão de seu lar.
Sans diz recordar-se por completo da mãe:

- Me lembro de todos os detalhes, incluindo as partes do corpo e do temperamento mantidas em segredo. Sinto-me igual a ela. Tenho a plena sensação de conhecimento mesmo sem ter tido contato com ela fora da barriga. É como se o cordão umbilical não apenas me alimentasse com as substâncias necessárias à sobrevivência, mas também fornecesse algum tipo de alimento espiritual, um pedaço da alma feminina atiçando todos os sentidos. Acredito que ela sabia de sua morte após o parto e utilizou-se de algum sortilégio para registrar em mim a tatuagem de sua alma.

Sans foi deseducado pelo pensamento. Sem freqüentar escolas ou obter informações de outros vivia insistindo em criar sensações que pudessem ser traduzidas em mais sensações. Um relâmpago rendia-lhe traços dispersos da face de deus colocadas no molde circular de seu cérebro anarquista. Aprendia todas as coisas que necessitava através do sonho. Suas experiências resumiam-se a sentir as imagens apresentadas sem atribuir-lhes um valor menor ou maior. Tudo permanecia como resquício de uma vibração orgânica. Criadas, percebidas e vividas sem qualquer forma material que pudesse lhe servir de referência após a passagem para seu íntimo.
Dizia ele:

- Concretizar, realizar, materializar são palavras usadas apenas como sinônimos de outra realidade onde a identificação não é dada pelo tato. Todos os sentidos são necessários para a pura apreensão da materialidade do imaterial, da concretude do inconcreto, da realização da irrealidade. Para entender minha obra é preciso deitar as categorias de tempo e espaço em uma cama de nuvens. Não existem definições. Tempo e espaço são desnecessários, são fôrmas antigas, balaios de palha, panelas de ferro. A compreensão mata o sentido único.

Ao mesmo tempo, Sans Gruvitch refugia-se na arte. Uma arte imaginada, virtual, sem materialidade. Concebe e não realiza. Tem todo um sistema artístico abstrato pronto. Sua arte - e quando digo 'sua', é só dele mesmo - é plena de sensações de realização mas, exclui a realização prática e a técnica de qualquer formulação, pois sua arte é perfeita e ideal, só para si mesmo, como tudo que é ideal e perfeito.

- Em meu cérebro fundem-se formas, cores, pinceladas e objetos. Todos formam um único. Visível e invisível. A totalidade da obra é minha matéria-prima. Os elementos são descritos a posteriori, toda nominação é explicativa de algo, determina-se o objeto e nomeia-o. Isto mata a criação. Cores não tem nome nem explicação, gestos são momentos únicos. A técnica é o que da mágica pode-se mostrar. Não almejo a compreensão dos outros.

Sans tem o estado da alma quando fotografa a imagem da pintura conservando-a em seu íntimo depois de atravessado o filtro cultural pessoal que é nulo. Aí mora a matéria subjetiva das construções artísticas de Sans. Trabalha com as impressões originais em sua totalidade, criadas pela realidade das imagens em seu cérebro, num fluxo egoísta de auto sensações.
Sans Gruvitch:

- A arte não existe para ser apreciada. Apreciar é desgastar o sentido único e inicial, dado pelo criador. Nem mesmo os que esfacelam a vida de grandes homens e publicam imensas biografias são dotados da capacidade de adentrar no complexo corpo/alma singular e morto. Sempre apreciarão como malditos intérpretes. Não há como dois corpos ocuparem o mesmo lugar. Nem mesmo depois das teorias quânticas mistificadas não há como dois cérebros desfrutarem da mesma sabedoria. Não há totalidade de conhecimento do outro, não nos foi dado o prazer de perceber a tão amada obra em toda sua totalidade justamente por ser de outro. Não há como obter todas as sensações e pensamentos que geraram uma obra num instante perdido e sem volta. A técnica é a única coisa que se deixa descrever, logo após compreenderem a materialidade doada pelo benevolente criador, apenas uma metade. A outra não se descreve, não se delimita, nem tão pouco se analisa. A outra metade é dado perceber somente aos loucos, possuidores da desrazão.

Ele não realiza materialmente. 'Realizar', neste caso, significa apreender e sentir em si uma obra cega, surda e muda. Realizar subjetivamente um objeto irreal e inútil. A realidade existe para quem a vive. A arte aqui só existe para o artista, no silêncio de seu processo criativo.

- Notas de Sans Gruvitch encontradas em seu caderno de anotações

Realidade: Imaginação
Realidade: Interpretação
A indissociabilidade entre artista e obra.
O sentido único não interpretado.
A realidade nas formas imaginárias.
ARTE:
1. concepção- TOTAL
2.realização- NULA
Não há possibilidade de julgamento.
Meio e fim se fundem em uma coisa só, quase morta.
Nada justifica nada.

A interpretação não diz nada sobre a obra em si. Por essa razão a mantém em seu cérebro. Não expõe aos olhos sedentos por sua entrega. São estes olhos que deixam gênios morrerem de fome. A santa necessidade de mitos os impelem a adorar a morte. Quanta inveja sentem pelo fato de não terem pintado a 'Gioconda', não terem composto músicas como Mozart, nem escrito como Fernando Pessoa ou Goethe. Humilham-se ao escreverem livros e mais livros interpretativos que visam alguma verdade. Não lhes foi dada a verdade. É por isso que mantém sua obra irrealizada. Aí está a originalidade: os sentidos são dele.
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