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Ensaios-->Carta de um turista lusitano -- 19/03/2001 - 23:39 (Ignácio Camillo Álvares Navarro) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Brasil, 1º de maio de 2000

Patrícios,

Aos 22 de abril desembarquei no Brasil. Desde o primeiro momento e dia após dia é maior o meu espanto com a grandeza da terra e de seu povo.
É um país com dimensões continentais, dividido em cinco grandes regiões: Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro Oeste. Já haviam me dito (agora constato) que encontraria em cada estado brasileiro gente e hábitos diferentes, uma riqueza cultural sem par, mas todos sob o manto da bandeira brasileira e da língua portuguesa. O clima é quente e acolhedor, e o povo que aqui habita, cheio de vida e paixão. Muitas são as raças, culturas e credos. São muitas as formas de nossa língua, são variações de entoação e vocábulos que nunca ouvira, todos com base na língua trazida por nossos antepassados que se enriqueceu com as contribuições do léxico tupi e dos dialetos africanos. O curioso é que toda a gente se entende muito bem e, vejam vocês, eu também já estou falando e escrevendo como eles. Esta é uma das razões do Brasil ser um país tão singular: encontrou sua unidade na diversidade.
Ao viajar por esta terra, tenho experimentado muitas emoções e, a cada dia, sinto-me parte dessa cultura. Nós, portugueses, não nos damos conta da dimensão da descoberta de nossos antepassados. Agora vejo que Portugal, há 500 anos, tornou-se muito maior que Dom Afonso Henriques poderia sonhar quando fundou o reino lusitano. Pois é que a terra descoberta, um dia batizada de Ilha de Vera Cruz, transformou-se em nação de muitos povos e raças, irmanados numa só alma – a brasileira. E nas palavras de cada falante da língua pátria, soam ecos da alma lusitana. Percebo que um pedaço de mim pertence a esta terra; e não é pelo fato de entender a língua como se estivesse em meu próprio país: é como se aqui eu tivesse raízes profundas. Acredito que muitos brasileiros sintam o mesmo ao pisar em nosso Portugal.
Sem notarmos, nós portugueses, nas figuras de Fernão de Magalhães, Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral, fomos os pioneiros da chamada 'aldeia global', não só a da comunicação pregada por McLuhan e vivida hoje no mundo virtual da internet. Nós iniciamos nesta terra o processo real de um mundo sem fronteiras. Vejam vocês que o povo daqui é branco, é negro, é índio, é japonês, italiano, alemão, espanhol, chinês, é o encontro dessas raças numa só. E não vivem em guetos, separados por raça ou credo, se misturam e, irmanados, formam um só povo.
Na alimentação encontramos um saboroso reflexo dessa realidade: come-se aqui a saborosa bacalhoada portuguesa, o sushi japonês, a autêntica massa d Itália, os defumados eslavos, sabores da cozinha regional, um típico churrasco gaúcho e, coroando essa democracia gastronômica, a deliciosa (e substanciosa) feijoada com caipirinha dos sábados.
Na música brasileira podemos encontrar acordes do fado, da ópera, do rock, dos tambores africanos. Do clássico ao popular, são muitos os sons e mil tons que deixam esse povo alegre e festivo de janeiro a janeiro.
O primeiro lugar que visitei foi Porto Seguro, local do desembarque de nossa esquadra há 500 anos. Assim como Cabral, encontrei nativos quase nus, muito felizes e hospitaleiros, gente alegre e bronzeada de sol. Só que o local agora é uma cidade de veraneio muito famosa. A Bahia, de todos os santos, assim conhecida pelo ecumenismo religioso, revela-nos a tensão constante entre o sagrado e o profano que habita o espírito desse povo forte, de muitas cores, cheiros e temperos inesquecíveis.
Passados alguns dias, e já com saudades, deixei a Bahia, certo de que voltarei por essas paragens com mais calma. Recebi muitas recomendações sobre as belezas e a riqueza cultural dos estados nordestinos. Deixarei para visitá-los oportunamente.
No Rio de Janeiro, região sudeste, a cidade que é o cartão postal desta terra, descobri muito mais que samba, mulatas e o Cristo Redentor, tão conhecidos por aí. Trata-se de uma grande metrópole, com arranha-céus, túneis e viadutos integrando montanha, cidade e mar num belo espetáculo. Em suas famosas praias convivem pobres e ricos, doutores e analfabetos, turistas nórdicos e mulatas do morro; todos debaixo do mesmo sol, absorvendo algo que paira no ar, alguma energia vital que parece sair da água, junto da maresia, que invade e inebria toda a cidade, contagiando a todos com uma ginga própria – é o espírito 'carioca'.
Já em São Paulo, o povo é sério, olha dentro dos seus olhos, estão sempre apressados, são trabalhadores, empresários, capitães de indústrias, executivos que apostam na bolsa e não têm tempo a perder pois, afinal, tempo é dinheiro! São Paulo é o centro financeiro do País, a maior cidade da América do Sul e lá existem grandes fábricas e empresas nacionais e internacionais. Dizem que Nova Iorque é a capital do mundo; depois de conhecer São Paulo tenho certeza de que não há somente uma capital no planeta.
Nos estados sulinos, senti-me em solo europeu; imaginem que neste país quente, de clima tropical, até neve peguei por lá. O sul é uma região rica e florida onde o povo preserva tradições trazidas pelos antepassados italianos, portugueses, alemães, poloneses... No entanto não abrem mão de sua pátria e cidadania brasileira. As raízes em nosso velho mundo só reforçam e enriquecem este belo país.
Em Minas Gerais, descobri uma outra nação dentro deste País, um povo com orgulho de ser brasileiro, e mais ainda em ser mineiro! Com uma história marcada por lutas pela liberdade, dizem que em Minas bate um coração de ouro num peito de ferro. São de lá muitos dos hábeis políticos nacionais, músicos, poetas e escritores de grande talento. Um povo que mantêm suas tradições ao mesmo tempo que desenvolvem tecnologias de ponta. Belo Horizonte, a capital, foi apontada pela UNESCO como uma das melhores cidades para se viver na América Latina. Uma curiosidade lingüística: há uma palavrinha na fala do mineiro que ninguém sabe o que é – nem ele mesmo. Quando perguntei: Ó gajo, o que é “uai”? O mineiro respondeu-me: Uai é uai, uai! E indagou-me de pronto o que era o nosso “pá”. Ora, pá, todos sabemos que pá é pá, pá!
A capital do Brasil, Brasília, é uma cidade especial, e muito espacial. Situada no planalto central em pleno coração do País, é o seu centro político e administrativo. Sua arquitetura, tombada como patrimônio cultural da humanidade, é a concretização de um sonho; suas linhas retas e modernas fundem-se no horizonte com um enorme e onipresente céu, que mais parece um oceano. A impressão ao ver a cidade pela primeira vez é de que não é real e sim uma miragem ou uma imagem espelhada no firmamento; porém à medida que nos aproximamos, ela se personaliza e se torna intimista, transformando-se em algo novo e mágico como jamais vi.
Depois fui conhecer o norte do País, a Amazônia, pulmão do mundo composto de uma floresta densa e riquíssima em sua biodiversidade. Região de muitas lendas, clima quente e população com fortes características indígenas. No Acre, no extremo oeste do País, pareceu-me que havia subido em uma grande plataforma. O firmamento e as estrelas parecem tão próximos, que nos dá a impressão de poder pegá-las com as mãos. A borracha, o cacau e o gado são os sustentáculos da economia da região. Mas, o que impressionou-me sobremaneira foi a riqueza mágica que a região possui. Os raios de sol recortados pelos seringais, integrados ao céu tão próximo, deu-me a impressão de estar penetrando num mundo mágico de fadas, gnomos e duendes.
Ah, engana-se quem pensa que este é só o país do futebol, como se fala aí na Europa. Por onde andei, encontrei atletas de várias modalidades esportivas, e descobri que em muitas delas o País já é campeão.
Este é um país jovem, polivalente e criativo, rico por sua natureza e pelo povo que o habita. Aliás, há muito que sabemos que tudo que aqui se planta, dá. Há uma pujante atividade agropecuária no Brasil. As safras agrícola batem sucessivos recordes de produtividade e o rebanho é dos maiores no mundo.
Conterrâneos, sinto-me privilegiado em festejar os 500 anos do Brasil junto de seu povo. Feliz por fazer parte dessa festa, por estar aqui hoje e poder relatar para vocês no que se transformou a 'Ilha de Vera Cruz' que um dia achamos. Com certeza posso afirmar que o Brasil é um país do presente com um futuro muito promissor. Seguramente nos próximos séculos o mundo ouvirá falar muito desta nação. O brasileiro, ciente de seu passado e trabalhando por um amanhã cada vez melhor, deseja uma nação justa, baseada nos valores da democracia, no pluralismo ideológico, na tolerância dos contrários.
A minha sensação é a de estar presenciando um momento histórico da humanidade. Por isso quero comunicar-lhes que não voltarei agora a Portugal; sinto que devo e preciso conhecer mais o Brasil. Uma missão que levaria uns 500 anos. Então, contento-me com os próximos 50 – fico por aqui. Tornei-me mais um brasileiro!

Saudações tropicais.

Pedro Vai e Caminha
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