Meu horóscopo hoje disse para eu parar de ter medo de ousar e começar a agir. Daí eu liguei pra ele, mas ele não me atendeu, mandou dizer que não estava. Eu, então, fui até a casa dele, mas ele se escondeu no quarto e mandou a empregada me dispensar. Ora bolas, como é que eu vou agir se ele não deixa? Mas não me abati. Fiquei ligando para o celular dele e deixando mensagens na secretária eletrónica - é óbvio que ele não me atendia - até que a caixa de mensagens ficasse cheia. Depois, mandei e-mails. Muitos, aos quilos, mas a cx. postal também fechou. Então, mandei flores. Primeiro um ramo de flores silvestres discretinhas, daí mandei violetas em cachepós bonitinhos e, por último, mandei bromélias grandes e espalhafatosas.
Tudo sem efeito.
O dia estava acabando, precisava agir rápido. Contratei um daqueles carros de som que fazem escàndalo na porta das pessoas e duas drag queens dispostas a um strip tease se não tivessem a merecida atenção por parte do gajo. Houve o strip tease, mas ele não veio sequer à janela. Alguém chamou a polícia - acho que foi ele, por que a pequena multidão que se apinhava em torno do show estava a-do-ran-do - e tudo teve que ter seu final antecipado. Tudo menos o meu objetivo de ousar e começar a agir (estava imersa na palavra "agir").
Então, sem outra alternativa, invadi o apartamento dele - tinha que ser antes da meia noite, o dia estava quase no final. Entrei pela porta da cozinha, com a chave velha que ele me deu e esqueceu (sabia que ia ter utilidade um dia) e o encontrei dormindo. Estava tão lindinho, cabelos revoltos espalhados pelo travesseiro, um leve cheiro de água de colónia (acho que é aquela que eu dei pra ele no último aniversário - veja você, que canalha!), os lençóis brancos. Antes que tivesse tempo de titubear e, claro, antes que o relógio soasse as doze badaladas (cinderela!), não pisquei, atirei na cabeça dele cinco vezes e sujei todo o quarto azul com o sangue nojento dessa criatura infeliz que me ignora. É... Ignorava, eu diria.
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