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Ensaios-->AMAZÔNIA E DESENVOLVIMENTO -- 14/05/2000 - 16:52 (Paccelli José Maracci Zahler) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
AMAZÔNIA E DESENVOLVIMENTO

Paccelli M. Zahler

1. INTRODUÇÃO

A Região Amazônica brasileira possui uma grande diversidade biológica de fauna e flora, cuja maioria das espécies permanece ainda desconhecida pela Ciência. Seu subsolo, rico em jazidas minerais como o inóbio, o estanho, o calcário, o ouro, o ferro, o urânio entre outras, tem sido objeto de interesses internacionais. Para garantir sua ocupação e desenvolvimento, o governo federal criou diversos programas de colonização na década de setenta, os quais acabaram levando para lá muitas famílias de agricultores do sul e do nordeste do país, principalmente, garimpeiros e empresários rurais. Conseqüentemente, aumentaram os problemas de desmatamento, queimadas e conflitos de terra entre os novos donos e as famílias de posseiros lá estabelecidas desde o início do século. Ações governamentais dessa natureza parecem ter sido uma constante ao longo da História do Brasil e precisam ser corrigidas para evitar a destruição total dos recursos naturais.

2. PEQUENO HISTÓRICO DA PREDAÇÃO AMBIENTAL

Acreditando que os recursos naturais do Brasil eram inesgotáveis, não houve muita preocupação com a proteção ambiental do século XVI ao início do século XX. Enquanto a Europa, incluindo Portugal, se ressentia com problemas ambientais devido à exploração predatória da fauna e da flora, e tratava de protegê-la da melhor maneira possível, no Brasil Colônia a legislação ambiental portuguesa não era cumprida.
Com a crise do sistema colonial português no século XVIII, as esperanças para solucioná-la recaíram sobre o Brasil Colônia. E, dentre os planos de desenvolvimento que tinham por objetivo aumentar a produtividade das culturas de exportação, como a cana-de-açúcar, o chá e o algodão, para vencer a concorrência das colônias européias, principalmente das Antilhas, surgiram idéias para a realização de uma reforma agrária, o que incluiria as terras do norte do país e, logicamente, a Amazônia. Entretanto, tais idéias entraram em choque com o que já estava estabelecido e não surtiram efeito.
Em 1770, um padre, chamado João Daniel, propôs medidas para o desenvolvimento da Amazônia, levando em conta as características da região, dizendo que para as terras do Amazonas não servia a técnica de cultivo utilizada em outras regiões do mundo. Era preciso buscar novos métodos de cultivo e adaptá-los àquela área. Por tais idéias, acabou morrendo no exílio.
Com a Independência, em 1822, mudou-se a legislação sobre a ocupação de terras, cuja propriedade passou a ser comprovada através da posse e da exploração. Isto causou uma ocupação desregrada do território nacional, com a derrubada de matas nativas e a realização de queimadas para a comprovação do uso e a obtenção do título de propriedade. Uma prática que ainda persiste.
Em 1970, durante o governo Médici, foi instituído, através de Decreto-Lei, o Programa de Integração Nacional (PIN), que determinava a construção das rodovias Transamazônica e Cuiabá-Santarém; o levantamento sistemático da região de influência do Programa pelo Projeto Radam; o Plano de Irrigação do Nordeste; a implantação de corredores de exportação para permitir o escoamento de produtos agrícolas e manufaturados; e a colonização da Região Amazônica.
A Transamazônica acelerou o fluxo de migrantes para a Amazônia, originando conflito de terras, pois, de um lado era incentivada a migração de posseiros, sem terras e sem condições de legalizar suas posses; de outro lado, incentivavam-se as grandes empresas e os grandes proprietários a se instalarem e investirem na região, em detrimento das famílias lá estabelecidas há mais de cem anos, porém, sem registro legal. Isto contribuiu para a prática da falsificação de títulos de propriedade ('grilagem'), invasões de propriedades, assassinatos, desmatamento desenfreado, queimadas, em desrespeito total não só às pessoas (trabalhadores rurais, principalmente, tendo sido registrados muitos casos de escravidão) como ao ambiente. Este problema já era preocupante três anos após o lançamento do PIN.
Na I Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada em Estocolmo, o governo brasileiro afirmou que a desvastação ocorrida nas margens da rodovia Belém-Brasília não mais aconteceria pois os programas de colonização às margens das novas rodovias estabeleciam áreas de reservas florestais; e que o país vinha realizando sérios estudos com relação à flora e ao regime hidroviário da bacia Amazônica, porém não abriria mão de colonizar e integrar o norte do país, deixando 50% da área como reserva florestal.
Esta preocupação dos governos militares em ocupar a Amazônia através de programas de colonização teve como causa a importância geopolítica daquela região, pois há muito tempo os países desenvolvidos, principalmente, os Estados Unidos da América, vinham pressionando o governo brasileiro a internacionalizá-la. Eis alguns exemplos: em 1850, Matheus Maury, diretor do Observatório Naval dos EEUU, lançou a idéia de invadir o rio Amazonas à força e exigir a internacionalização junto aos organismos jurídicos mundiais, ao mesmo tempo em que seriam levados para a floresta mais de um milhão de escravos americanos que abririam caminho para a colonização, o que foi frustrado pelos diplomatas brasileiros.
Em 1921, foi enviada uma proposta ao governo brasileiro sugerindo a instalação de colonos negros norte-americanos na floresta amazônica, o que foi vetado pelo Congresso Nacional. Mas o plano mais mirabolante viria na década de 60, quando um grupo de cientistas do Hudson Institute lançou a idéia de aproveitar o imenso potencial hídrico da Amazônia e construir ali um sistema de diques e represas que formariam um imenso lago no interior do continente, tornando a região navegável do Atlântico ao Pacífico e interligando cinco países sul-americanos, o que foi impedido por manifestações contrárias.
Tais tentativas de internacionalização continuam ocorrendo porque, com suas reservas minerais e produzindo alimentos em larga escala (com uma tecnologia de produção adequada às suas condições ambientais), a Amazônia se transformaria rapidamente em uma arma capaz de definir qualquer guerra econômica ao longos de muitos anos seguidos.
Na época da participação do Brasil na I Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, em Estocolmo, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA e o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal - IBDF ( hoje, IBAMA) garantiram que o desmatamento estava sendo feito com todo o cuidado e que o reflorestamento estava previsto como uma das etapas imediatas. Mas, tal cuidado não foi suficiente para garantir a preservação ou a utilização racional dos recursos naturais, tanto que já foram detectadas algumas clareiras desertificadas no Mato Grosso e em Rondônia.
O desmatamento desenfreado vem contribuindo para o empobrecimento dos solos e para o aniquilamento de grande parte das florestas nativas.
Com a implementação dos programas de colonização e o incentivo à ocupação de terras no Centro-Oeste e Norte do país, tem havido um incremento na taxa de desmatamento naquelas áreas. Em Rondônia, por exemplo, o percentual da área total desmatada era de 0,5 % em 1975 e passou para 5,74 % em 1983; a continuar assim, provavelmente não haverá florestas naquele Estado na próxima década. No Mato Grosso, menos de 1 % da área total estava desmatada em 1975 e em 1980, esse total era de cerca de 3,5 %, observando problemas de erosão eólica e ataques de gafanhotos, pois, além de deixar o solo desprotegido, o desmatamento acaba com o habitat dos inimigos naturais daquela praga. Estima-se que o país desmate anualmente uma área equivalente ao Estado da Paraíba.
Muitos rios, outrora piscosos, têm apresentado baixa produtividade pesqueira, como por exemplo, o rio Araguaia, devido à poluição por produtos químicos (agrotóxicos, mercúrio utilizado em garimpos) e assoreamento pelo abate de árvores nas suas margens, bem como a lavagem da areia para a extração de minerais nas áreas de garimpo.
Para agravar a situação, o próprio governo federal nem sempre cumpre a legislação ambiental em vigor. Um exemplo disso ocorreu em 1983, quando foi autorizada a construção de uma estrada atravessando ao Parque Nacional do Araguaia, em detrimento da legislação de parques nacionais brasileiros (Decreto nº 84.017, de 11/09/79), e mantendo uma tradição do período colonial - o não cumprimento das leis! Na opinião de Negret, tais incoerências ocorrem porque 'alguns cidadãos que têm participado da tomada de decisões nas esferas governamentais supõem, erradamente, que a investigação ecológica é um utopismo romântico que se opõe frontalmente aos projetos de desenvolvimento' quando, 'na realidade, (...) o conhecimento científico dos recursos naturais permite avaliar o potencial produtivo da região, conservá-la e aproveitá-la sob planos de manejo que visem o desenvolvimento regional em função das necessidades das populações humanas'.
É preciso reconhecer que os modelos de desenvolvimento adotados não têm correspondido à realidade do país e têm agravado a destruição ambiental. Um exemplo disto é a construção de grandes barragens hidrelétricas (como Tucuruí e Balbina) que acabam inundando imensas áreas, destruindo exemplares da fauna e da flora, sepultando solos férteis sob água, inundando cidades, causando uma série de problemas a médio e longo prazos, ao invés de fornecer soluções.
Segundo Teixeira e Câmara, o aproveitamento do potencial gerador da Bacia Amazônica até o ano 2010 prevê a inundação direta de 10 milhões de hectares com conseqüências imprevisíveis para a região. Somam-se a estes exemplos os grandes projetos agropecuários, os quais, contando com incentivos do governo federal, têm tentado explorar a Região Amazônica utilizando técnicas agrícolas adequadas a países de clima temperado, esquecendo as características da região e as recomendações feitas pelo padre João Daniel há cerca de 200 anos. Conseqüentemente, muitos exemplares da fauna e da flora nativas, ainda desconhecidos pela Ciência, os quais, se adequadamente estudados, poderiam trazer divisas para o país por já estarem adaptados à região, estão condenados à extinção ou sendo substituídos por espécies exóticas cuja pesquisa e manejo consomem milhões de dólares anualmente por não estarem adaptados ao clima tropical - tudo em nome do lucro imediato. Convém lembrar que a recuperação dos recursos naturais é bem mais cara que sua preservação e pesquisa para futuro aproveitamento econômico.




3. CONCLUSÃO

Diante das pressões de países desenvolvidos para a internacionalização da Amazônia, o Brasil não pode deixar de estudá-la, ocupá-la e desenvolvê-la racionalmente, No entanto, urge desarraigar da mente dos governantes e dos grandes investidores a herança atávica do desrespeito ao meio ambiente e às pessoas, do imediatismo, da importação de tecnologias em detrimento da pesquisa e da experiência secular das comunidades locais; do não cumprimento da legislação, inclusive da legislação ambiental; das obras faraônicas e dos planos megalomaníacos que consomem milhões de dinheiro do contribuinte e, ou não terminam devido ao alto custo, ou não atingem os seus objetivos, trazendo prejuízos irreparáveis à nação - os chamados 'rombos financeiros'.
Observando as lições da História, o Brasil tem condições de desenvolver a Região Amazônica sem cometer os mesmos erros que os colonizadores e os últimos governos republicanos cometeram. Para isso, deve definir uma política de desenvolvimento integrada com a pesquisa ecológica, a legislação ambiental e o aperfeiçoamento de tecnologia adequadas à região, levando em conta as suas aptidões de uso e os interesses e o bem-estar das comunidades nativas.

(Publicado na Revista BRASÌLIA nº 66, nov/dez/1994, p.8-10)

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