Digo à flor que aprendi a amar que não mais a desejo...explico.
Quando a vi pela primeira vez, crescendo, ganhando corpo, sobressaindo-se às demais daquele jardim, desejei-a imediatamente. Queria tê-la em minhas mãos, não apenas por sua formosura, que era imensa, mas também pelo suavíssimo cheiro que emprestava ao ar daquela rua, meu caminho obrigatório.
Não tinha como entrar naquele jardim. O dono parecia muito hostil a todos. Espantava-me sobretudo como ele resolvera cultivar um jardim, sabendo que suas flores iriam despertar a curiosidade e outros sentimentos menos nobres...Quem nunca quis roubar uma flor para presentear alguém querido?
Pois é, eu também fui tomado por esse desejo. A diferença é que eu queria aquela flor somente para mim. Queria guardá-la em meu quarto, para todos os dias observar como suas sensíveis pétalas harmonicamente se juntavam, formando um halo ponteado de azul...era azul a flor. O sol de minha janela iria alimentá-la, renovando seu perfume, revigorando sua cor, esticando o tecido de que se formava. Quem nunca teve um sol assim milagroso? O amor...
Fui um covarde, sem coragem de pular a cerca e roubar aquela flor...O meu amor por ela era menor do que supunha. Não dizem todos que o amor é capaz de fazer loucuras, de destruir qualquer força que se levante contra ele? O que explica o fato de eu abrir mão da flor que me conquistou o coração?
Quem sabe ela não precise de alguém que a proteja, e zele por sua existência; quem sabe ela esteja plenamente feliz por saber que é a mais bela flor do jardim. Ou, o que duvido, não se julgue tão digna de ser amada a ponto de decidir que mão alguma deverá tocá-la.
Bem, nesse caso, talvez seja destino da minha flor, que não é minha, tornar-se a alegria de um faminto pássaro, que não a estime tanto quanto eu, que queira dela apenas o que o alimenta, nada dando em troca, desprezando em seguida aquela de cuja entranha extrai o doce que o mantém vivo.
Que pássaro egoísta!
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