Lageado, hoje
eu vejo, essa cidade
cresceu tão demais, que eu
já não venço a pé
o tempo de outros tempos
léguas que me levam
mágoas que me lavam
mato desapareceu
crenças do passado
línguas esquecidas
lambem a ferida aberta
que ficou sangrando
para nunca mais
Lageado, hoje
eu choro, essa cidade
se esqueceu demais de mim
já não vejo a fé
da gente, éramos crentes
hoje esquecimento
hoje não é nada
hoje quem secou fui eu
criança do passado
língua ressequida
lambo a cicatriz medonha
que fechou meu sonho
para nunca mais
[Obs.: Lageado era o nome de um lugar na minha
infância em Sorocaba. Um riozinho de águas claras
(já li isso em algum lugar, digo, em vários
outros lugares)correndo sobre pedras. Lugar comum.
Ali nadávamos aos domingos, as crianças.
Os adultos se sentavam à margem, conversavam.
Às vezes, havia ali um batismo de crentes,
os catecúmenos sendo literalmente metidos dentro
d água. Alguma dificuldade na transcrição
dos versos, que primeiro foram cantados,
e só agora aparecem impressos, como
sendo um poema.] |