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Erotico-->8. DESPERTAR -- 06/12/2002 - 06:41 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Quando acordei, recordava exatamente de todos os sucessos da derradeira vida, tanto os fatos bons, quanto os ruins. Fui capaz de analisar friamente as razões profundas do suicídio, embora, mais tarde, devesse refazer os conceitos à luz dos procedimentos evangélicos. Mas o encadear psíquico e físico de causa e efeito foi possível deslindar a contento.

Recebi os incrementos de memória por via artificial, dado que meu estado não comportava desdobramentos lógicos autônomos. Se me permitirem a comparação, ficará fácil de compreender o que estou dizendo, quando nos lembrarmos dos analgésicos e distônicos, que tomamos quando perturbados por dores diversas ou tontos por fatores de pressão. Parece que o cérebro recebe quota de clarividência que, no estágio doentio, não se permitia. Quem experimentou os psicotrópicos (que não podemos recomendar pelas conseqüências alucinógenas e pelas dependências física e psíquica que criam) saberá melhor aquilatar a sensação de independência, relativamente às pressões emocionais. O êxtase aliena da realidade. Pois foi esse desprendimento que me levou a considerar todos os episódios da vida, sem cair em crises de quaisquer espécies.

Vou fugir de relatar minha vida, simplesmente. À medida que a narrativa for avançando, deverei fazer citações elucidativas, para que se compreendam os motivos pessoais, para as reações que me caracterizam como o ser Roberto, diferente de todas as demais pessoas, pela incidência dos fatores existenciais que tornam cada criatura única no Universo.

Quando acordei, embora tivesse tido essa panorâmica existencial, não juntara condições de restabelecimento. Tinha desejos de recuperação. Sentia a necessidade de participar das atividades hospitalares, adivinhando que, além daquelas paredes, a existência estuava. Mas não conseguia sequer pôr-me sentado no leito.

Começava a longa fase de regeneração perispiritual, sob a assistência caridosa de meu bisavô, coadjuvado por inúmeros atendentes, assistentes e enfermeiros, todos sob a vigilância do Doutor Castro, o médico que cuidava de mim.

Ouvi falar em pacientes que se desesperavam, não resistindo ao tormento da prisão em que se constituía cada pequenina operação perispiritual. Na ocasião, não distinguia direito a diferença entre corpo material e corpo espiritual. Tivera, nas Trevas, a impressão de estar carregando o corpo que se dependurara na árvore. Custei, no hospital, para entender que prejudicara também, inapelavelmente, o perispírito, que é como se chama o segundo corpo a envolver o espírito.

Honorato é que me explicava:

— Segundo a freqüência vibratória da “matéria” em que devemos desempenhar as funções vitais ou existenciais, ganhamos um corpo apropriado. Se você tivesse estudado a doutrina espírita, segundo as transcrições efetuadas por Allan Kardec...

— Ouvi falar desse culto ou religião...

— Pois, no estágio atual, é mais uma ciência, com fortes tendências religiosas. É que está voltada principalmente para a assistência social e espiritual, o que determina que as pessoas se voltem para a miséria material alheia e para a miséria espiritual própria. Mais tarde, iremos visitar núcleos terrestres, para que você possa observar como se promove o desenvolvimento doutrinário, junto aos encarnados.

— Será que esse glorioso dia vai demorar?

— Não tenha pressa. Quanto menos pressa tiver, mais rapidamente irá readquirindo as condições de locomoção e de trabalho. Pense estar afundando em poço de areias movediças. Se permanecer imóvel, mais tempo levará para submergir, dando oportunidade a que o socorro chegue. Se se agitar, afundará, pondo fim às esperanças de salvação.

Não assimilava direito as informações. Ficava longos períodos introjetando as noções novas, até que me dava por satisfeito.

O paciente instrutor não dava mostras de nenhum cansaço. Sempre que volvia a prestar atenção à realidade circunjacente, reatava ele o sentido da conversação, buscando atender aos anseios da curiosidade. Mas não respondia a todas as questões, somente àquelas que tinha eu capacidade de absorver. Bem pensando, ensejava-me raciocínios a cujas conclusões estava inabilitado, mas insistia com exemplificações abonatórias.

Um desses temas se deu quando me preocupei com o destino dos familiares. Tinha forte tendência a anular as lembranças relativas a eles, contudo, girava dentro do cérebro a idéia dos anos que se passaram, de sorte que tudo deveria ter mudado substancialmente na família, independentemente de havê-la deixado de forma tão intempestiva. Agora, seria capaz de dizer ingrata, injusta, imbecil, ignorante. No leito, não me encorajava a acusar-me, para não despertar autopiedade, sentimento que me arrastara pela escuridão do báratro, durante longo e lento período de sofrimento.

— Você irá saber, oportunamente, quais foram as conseqüências do tresloucado gesto para cada pessoa. Saiba que já se encontram conosco quase todos os parentes, restando na Terra...

Meu bisavô falava com tanta naturalidade da passagem de um estado de vida para outro que não me permitia “sofrer” com a morte de nenhum dos seres queridos. Todavia, lágrimas me encheram os olhos, em “mea-culpa” tardio e impotente.

— Não se comova que isso retardará o processo de restauração corporal. Pense nas entidades com quem você esteve após o desenlace. Não é verdade que o mundo em que estamos é tão concreto, tão sólido, tão tangencial e compreensível quanto o anterior? Sensação de perda tem quem pensa na morte como inexorável separação. De certa forma, há egoísmo nesse sentimento. Por isso, Jesus disse que deveriam “os mortos enterrar os mortos”. No etéreo, nós sabemos que ninguém se enterra, mas se afasta temporariamente. Muito mais justo será lamentar-se pela internação dos entes queridos na escuridão do Umbral. Mas, mesmo em tal situação, o mais certo será trabalhar em prol do reerguimento dessas criaturas.

Sem querer, o querido instrutor dava razões para as lágrimas. Pensava nas angústias que provocara e desejava ardentemente que jamais tivessem acontecido.

— Vamos orar!

E Honorato recitava o pai-nosso, elevando as mãos por sobre minha cabeça, como a me passar vibrações de temperança, de paciência, de paz. Eu recobrava a serenidade e a conversa prosseguia, interminável.



Um dia, me pus de pé, sem que ninguém estivesse presente. Desejei caminhar, mas o máximo que consegui foi ajoelhar-me. Gesto instintivo, transformou-se na mais linda prece que dissera na existência, pela força emotiva das palavras:

— Obrigado, Senhor!

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