I
Quem trouxe a trova ao parvo suicida
Queria ver como se põe o verso,
Estando o torvo meditar disperso,
Por ter desperdiçado, em culpa, a vida.
Não julguem ver, no ato, algo perverso,
Que é sempre bom saber que, arrependida,
A alma há de encontrar uma saída,
Embora, em dor, o coração imerso.
Basta acionar do médium a memória,
Para anotar a nossa triste história,
Em rimas repetidas, sem capricho.
Pois quem perdeu a vida não quer ter
A glória infausta de sentir prazer,
Pelas momices broncas deste bicho.
II
Ao menos, os sonetos são preciosos,
No esquecimento instante dessa dor,
Misericórdia augusta do Senhor,
Que sempre há de acenar com puros gozos.
Porém, não veja, irmão, qualquer valor
Nestes sonetos flácidos, gasosos,
Que até podem tornar-se perigosos,
Se o mal ficar de lado, ao se compor.
Tendo aprontado os versos neste tom,
Reserva-se ao autor o compromisso
De repetir a trova, em alto som,
O que faz parte ativa do serviço
De oferecer às gentes algo bom:
Este trágico exemplo em que os atiço.
III
Quem vem para a instrução da melhor vida
Não pode ter mui sério o compromisso,
Pois deveria ter muito mais viço
E não a escuridão de um suicida.
Assim, a tentativa do serviço
É boba, opaca, lúgubre, perdida,
Conquanto jamais fuja desta lida,
Pois sem o tal trabalho mais me enguiço.
Anote aí, amigo, esta lição,
Que dá de graça o pobre coração,
Que se embaraça todo nesta rima:
Atenda aos compromissos assumidos,
Por mais horrores veja reunidos,
Que a dor em paz o amor toda sublima.
IV
Quisera ser nos versos mais terrífico,
Trazendo rimas ricas de montão,
P ra que nenhum leitor dissesse “não”,
Sem conhecer o mérito específico.
Do jeito que componho, rir-se-ão,
Pensando ser quimérico, mirífico,
O exemplo simples de um viver pacífico,
Em busca de alcançar evolução.
Porque fui complicado em minha vida,
É que acabei com tudo, suicida,
Sem refletir nas dores que causei,
Agora, corro atrás de resgatar
Os males, mas só vou mui devagar,
Pois, ao rimar amor com dor, errei.
|