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Erotico-->4. A SEGUNDA ETAPA DA JORNADA -- 02/12/2002 - 06:55 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

A cabeça não mais doía. Pelo menos o sofrimento não era tão deprimente. Podia observar o que se passava ao derredor, sem compreender muita coisa. Sabia, porém, que estava sendo auxiliado.

Através da tenda de luminosidade transparente, percebia que, nas outras esferas de luz, seres como eu estavam recolhidos. Eram disformes. Monstruosos. Mal reconhecia neles seres humanos.

Do lado de fora, a proteção se estendia mais além. Os rumores das entidades perversas chegavam abafados. Mas distinguia nitidamente o meu nome, em clamores que o eco se encarregava de divulgar pela amplidão:

— Roberto! Roberto! Roberto! Roberto! Maldito! Maldito! Maldito! Maldito!

Busquei o aconchego do protetor. O bom velhinho estava junto a mim. Passava os dedos por entre os meus cabelos. Como quando era bem pequeno e brincava com meu avô.

— Que bom se ele estivesse aqui!

— Quem, meu filho?

Sentia medo de magoar tão meiga criatura. Não queria dizer que o outro saberia cuidar melhor de mim. Que me afastaria dos temores infantis. Que me agasalharia e me contaria histórias de fadas. De cavaleiros andantes. De castelos medievais. De bruxas castigadas. De amores para sempre.

— Quem, meu filho?

Ousei encarar o meu salvador. Aqueles olhos. Aquela serena fisionomia. De onde vinham as lembranças? Lágrimas incontidas partiam do meu ser estremecido. Seria aquela criatura esplêndida meu avô Rogério? Por que não o reconhecia logo? Estava muito mudado.

— Seu avô Rogério está em missão. Contente-se com seu bisavô Honorato. Você não me conheceu na derradeira romagem terrestre. Mas me viu em retrato descorado, quando eu era ainda jovem e posava de soldado para as lembranças da família. Quando você nasceu, Roberto, fazia mais de vinte anos que eu havia deixado a convivência familiar. Mas sinta-se comigo como se estivesse com seu avô.

O som mavioso da voz da extraordinária criatura me comoveu, ao repetir-me o nome. Parecia encarnar a carícia suprema do amor paternal.

Naquele momento, longo toque de corneta se fez ouvir, como a anunciar a partida. Levantava-se acampamento. Uma a uma, as esferas foram congregando-se até que o conjunto se desfez em única e grande abóbada protetora. Lá fora, intensificavam-se os ataques contra as paredes energizadas. E a caravana seguiu, lenta, determinada, arrastando-se pelos caminhos ínvios, pedregosos, estreitos. Ao longe, conseguia divisar uma luz. Mas, à medida que avançávamos, a luz como que se distanciava. Quanto tempo haveríamos de permanecer naquela sinistra agonia?

O pessoal uniformizado, à proporção que nos afastávamos dos locais mais populosos, ia retirando os capacetes e os guantes. Eram pessoas como nós. Sem as cicatrizes, sem os estigmas da dor. Não sorriam. Permaneciam concentrados, como em prece. Mas olhavam para os assistidos com extraordinária boa vontade, a transmitir-nos confiança.

Olhei para as mãos. Estavam coradas. As veias enchiam-se de sangue. Os pés readquiriam a mobilidade e a sensibilidade. O restante da carcaça estava coberta por manta alvinitente, impregnada de vibrações reconfortantes. Às vezes, alguém gemia, estertorava, gania. Algum dos enfermeiros acudia com medicamento leitoso, calmante. O infeliz punha-se em condições de prosseguir.

Quanto tempo mais ficaríamos naquela dolorosa caminhada? De repente, a luz da entrada se expandiu. E ofuscou-nos. Adentrávamos outra esfera, outro plano, outra realidade. Quis volver os olhos para trás, mas não percebi a porta da caverna. Perdera-se em meio à neblina esbranquiçada. Os sofredores intentaram coro de agradecimento. Ouviu-se terrível vozerio esganiçado. Súplicas e angústias, antes que graças. O velho egoísmo prevalecia.

Aos poucos, os agudos clamores foram calando-se. Estranha sonolência ia envolvendo-me o cérebro. Antes de adormecer, percebi que estava sendo colocado sobre rústico veículo. Dava-se início à derradeira etapa da jornada.

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