Parece, menina, que tens mais alegria no meu amor por ti do que eu mesmo tenho ao te amar. Todavia a tua constante alegria depois de teres conhecido o que meu coração não pôde mais ocultar contrasta com minha evidente tristeza por tua não correspondência, não na alegria, mas no amor. E tanto tem sido absurda a diferença entre a tua e a minha satisfação, que, ao passo que desejo estar contigo o tempo inteiro, quero igualmente não mais te ver. Se não posso ficar contigo sempre, também não o quero jamais...
Quanto a ti, não sei o que sentes na minha presença, visto que não compreendo o que quer dizer tua amabilidade ao aceitares de mim um beijo nas mãos e um toque no rosto, tímidas iniciativas e preciosas delícias pra quem ama.
E por que de uns tempos pra cá tens revelado tanta alegria? Basta-te saber que um homem te ama loucamente pra que tua alma feminina se julgue a mais preciosa do universo? De quantas outras mulheres eu poderia gozar o amor? Além de ti quantas há de maior beleza e encanto? Não é cego o meu amor, nem surdo, que não possa ver e ouvir nos entremeios do teu jovial comportamento uma vontade de esnobar quem te escolheu dentre as milhares. Humilhar seria a palavra mais adequada.
Dizes gostar de mim, contudo asseveras que a natureza desse sentimento não é da mesma daquele que me faz te desejar tão loucamente como um guarda noturno deseja a chegada do dia. Dizes mais, que não sabes ainda o que é sofrer com as coisas do coração! Como? Como é possível que tu, já chegados os anos em que as mulheres suspiram por homens gentis, não tenhas sido ainda atingida pelo fogo que queima o peito, que leva o coração a suspirar por um beijo de mil horas? Não é possível que nunca tenhas te entregado às fantasias que dão sentido a qualquer vida.
Não sendo loucura a razão de pareceres imune ao amor, sou levado a admitir que uma tragédia seja a única explicação à recusa que experimento ao me revelar tão apaixonado: tua aversão ao sexo...oposto!
Sofro a dor de sete vidas ao suspeitar disso, e quero encontrar outra razão pra não me devolveres o calor do olhar nem o sorriso nos lábios quando te contemplo.
Não sendo eu um reles qualquer por quem nenhuma mulher se encante, tens porventura uma invencível muralha a cercar o coração, de modo que homem algum, o mais gentil, belo, rico ou inteligente, poderá um dia destruir? Pra salvar o meu amor por ti, obrigo-me a concluir que tua recusa em ser amada, fêmea sejas, é por esse coração de gelo ao qual o maior dos fogos, a maior das paixões, chegam sequer a emprestar mínimo calor!
Serás assim a vida inteira? Que a morte te livre de mim e então me livre de ti também...