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Erotico-->25. MANHÃ DIFERENTE -- 18/11/2002 - 06:40 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

— Pai, se você quiser ficar em casa, pode ficar. Eu posso ir dirigindo.

— Filho, você vai voltar dirigindo, se o médico permitir. Eu o levo à clínica.

— Tudo bem. Eu já estou mesmo acostumado a ser “paparicado”.

— Por que está levando o violão?

— Vou demonstrar que minha mão está perfeita.

— Boa idéia. Assim o doutor vai poder ver como é que você está forçando os músculos e tendões.

— Como você disse: é o médico quem decide.

No curto trajeto, ainda trocaram algumas palavras, observando Joaquim:

— É difícil de acreditar que o rapaz de ontem era o mesmo que o agrediu.

— Ele estava tomado pelo álcool e pelo ciúme.

— É até compreensível, porém, meu caro, a transformação deve ter sido muito grande, para ele, de repente, ter compreendido tudo.

— Naquele dia, baixou a guarda e permitiu que obsessores sugerissem o mal que acabou praticando.

— Mas não me diga que deixou de ser responsável pelo que fez!

— De jeito nenhum, e recebeu o impacto da ação criminosa que se voltou contra ele mesmo. Não é assim que todos nós aprendemos?

— É e não é. Toda criança sabe que o fogo queima, mas nem por isso precisa ficar dentro de uma casa incendiada.

Prisco não respondeu de imediato. Imergiu em sua triste lembrança da santinha que morrera um dia ao seu lado no hospital. Compreendeu a que o pai fazia referência e, finalmente, aduziu:

— De qualquer modo, sempre é possível restaurar as coisas que se quebram, como o meu violão, por exemplo.; ou o meu pulso. E, se a pessoa vem a falecer, quem acredita em outra vida e em reencarnação vai sair na frente na compreensão desta vida.

— Meu filho, você está me saindo melhor do que a encomenda.

— Como assim?!...

— Está sendo capaz de expender idéias de caráter religioso, quando a gente tinha medo, principalmente Dona Maria, de que você ficasse para sempre materialista.

— Quando Eulália era viva, ela me dizia coisas nesse mesmo sentido. Eu é que não punha interesse em entender aquilo a que ela se referia. Chegamos. Espero que o médico esteja na clínica, apesar de ser sábado.

— Vamos ver.

Precisaram aguardar cerca de dez minutos até serem chamados para a terapia. Logo a enfermeira foi informando que o médico não se achava. Havia um de plantão. Prisco não achou conveniente ouvir a opinião de alguém que não acompanhara o seu caso. Quis saber onde poderia encontrar-se com o facultativo. Estava, conforme se inteiraram, no mesmo hospital em que Prisco cuidara da insolação.

Após o tratamento, que demorou cerca de quarenta e cinco minutos, exatamente às nove horas, saíam ambos, Joaquim dirigindo, Prisco sobraçando o violão.

Ao adentrarem o saguão de recepção, logo se depararam com Mirtes, dando atendimento aos que chegavam.

— Boa dia, caríssimo médium. Que o traz aqui?

Rapidamente, Prisco pôs Mirtes a par de sua vontade de conversar com o médico.

Ela lhe explicou:

— Hoje é dia de festa na pediatria. As crianças internadas são conduzidas ao auditório para assistirem às palhaçadas e aos números circenses de diversos voluntários. Faz parte de uma idéia que está se generalizando, segundo a qual o estresse aliviado faculta melhora mais rápida dos pacientes. O seu médico está fantasiado, realizando um esquete cômico. Quer ir até lá?

— Claro!

No caminho, Prisco fermentava a idéia de apresentar-se também para as crianças, matando dois coelhos com uma só cajadada. Não gostou da agressividade do refrão popular. Ia pensando em substituir por dois sorvetes a que daria uma lambida em cada um, alternadamente, quando chegaram.

Logo na entrada, estava uma mulher ainda jovem, com uma peruca verde e um nariz vermelho, cujo semblante Prisco pareceu reconhecer. Mas logo sua atenção foi chamada pela gritaria que se estabeleceu mediante o ato que se desenrolava no palco. Realmente, havia um pastelão em pleno desenvolvimento, baldes de água que os palhaços jogavam entre si, até que o indefectível punhado de confetes caiu sobre a platéia.

— Meu bom amigo e paciente, veio colaborar conosco?

Era o médico que o abordava.

— Vim fazer uma consulta, porque eu acho que estou inteiramente curado.

— Se você acredita nisso. Deixe ver sua mão.

O médico apalpou, apertou, puxou, esfregou, sempre recebendo respostas positivas no sentido de que nada estava dolorido.

— Surpreendente. Mas, por que o violão?

Joaquim não se conteve:

— Ele teve a idéia de mostrar que é capaz de executar o seu instrumento. Doutor, por favor, não deixe que tenha uma recaída.

— Calma, “Seu” Joaquim, o seu filho não vai fazer nada que o prejudique. Se quiser tocar para nós, eu vou anunciá-lo.

Prisco concordou, embora o pai lhe dissesse para moderar o entusiasmo.

Como o médico estava molhado, Mirtes se propôs a fazer a apresentação do guitarrista. Enquanto estavam dirigindo-se para a frente da sala, Prisco perguntou:

— De onde eu conheço a mulher da porta?

— Januária é a mãe da criança que faleceu no dia em que você se internou. Agora ela vem trazer um pouco de alegria às crianças, com certeza porque, assim, se esquece um pouco do sofrimento de sua menina.

Foi com essa impressão misturada de dor e de admiração que Prisco se viu diante da criançada, reparando logo que havia alguns estropiados, outros deformados, muitos amparados por enfermeiras, presos a recipientes de soro, mas todos com ares de curiosidade e de plena esperança em que a vida poderia oferecer-lhes ainda muitas alegrias.

Prisco tocou como se cumprisse o melhor contrato da vida, perante público de aficionados e de críticos, enchendo de sonoridade o pequeno salão. Foi ovacionado como nos dias mais gloriosos, deixando-se empolgar por um sentimento de amor que o levou às lágrimas. Tocou várias melodias e, com tanta perfeição o fez, que o seu médico se surpreendeu com tão integral recuperação. No final, como o povinho ali presente não poderia ultrapassar os limites de tempo determinados pelos médicos, imiscuiu-se no meio da petizada, deixando a gente miúda tanger as cordas da guitarra, conversando e respondendo à chuva de perquirições de que foi alvo. Uma pergunta permaneceria no ar:

— Você vai voltar na semana que vem?

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