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Artigos-->SINOS DE PÁSCOA -- 09/10/2009 - 08:08 (LUIZ ROBERTO TURATTI) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos








SINOS DE PÁSCOA



Padre João Modesti




Sinos de Páscoa! Sinos de Páscoa! Como reboais melancolicamente no céu azul. Flores estioladas, porque esparzis, sobre o transeunte solitário, tanta saudade, nostalgia tanta?



Ele conta então os anos, os numerosos anos em que ouviu o vosso canto, sinos de Páscoa, por um dia semelhante a este, áspero e claro, por esse mesmo azul esplendente de outono. Ele conta os anos, os numerosos anos em que vos escutou.



E este pensamento grave cai-lhe então na alma:



“Mais uma estação vivida!”



Lembra-se de uma juventude, quando vós lhe entornáveis a alegria, sinos, flores, e quando, escutando-vos, e respirando-vos, sentia que o coração se lhe enchia de uma esperança vaga mas deliciosa.



Sua juventude! Como está longe e como foi breve! Durou, para ele, quando despertou, cada manhã, repetindo consigo: “Que me acontecerá de feliz, hoje?” Pois tal é a juventude: a expectativa da ventura, – e da ventura absoluta, completa, absurda – “Amanhã, encontrarei a mulher cujo sorrir me franqueará um eterno paraíso... Amanhã estalará a guerra onde eu me tornarei herói eqüestre vitorioso, a quem suplicantes levarão as chaves da cidade... Amanhã, esboçarei o plano e alinharei os primeiros versos do drama ou do poema que me há de imortalizar”.



Amor! Glória! Gênio! Quem vos não sonhou, que digo? Quem vos não esperou ardentemente, apaixonadamente, pode acaso pretender que foi moço?



O transeunte já envelhecido, a quem embala a voz dos sinos e acaricia o fugitivo aroma de flores, recorda-se da sua mocidade, tão breve. Findou-se, há muito tempo, no dia em que ele reconheceu a mediocridade da vida, em que percebeu que só o desejo é bom, que todo prazer é seguido de amargura e dissabor, que a meta recua sem cessar diante do esforço. Findou-se quando acordou numa triste manhã, sem mais aguardar nada de sublime e extraordinário; no dia em que, relendo a página que escrevera na véspera, ele a encontrou fria e desmaiada, aquém de seu sonho; em que viu estorcer-se, ao lado de tantos sorrisos, o pequeno lagarto de que fala Henrique Heine, o inquietante réptil da ironia e da traição.



Entretanto, a vida lhe parecia ainda mais saborosa, mas como um fruto aquecido pelo sol de Março. Perdido estava, e para sempre, esse frescor d’alma que dá a sensação iguais às das frutas colhidas no ramo e comidas ao pé da árvore, de manhã, quando elas ainda estão orvalhadas pelo bafejo das noites.



Por vezes ele se revoltava e se indignava ao ver que o prestígio da esperança e da ilusão baqueava tão de pronto; e, como para o consolar um instante, a cada primavera nova, um pouco de mocidade lhe voltava em acessos inesperados, em subitâneas baforadas.



Era em manhãs outonais como esta, nas proximidades da Páscoa, quando no jardim, com os goivos e as tulipas, desabrochavam suavemente as rosas; quando, semelhantes a monstros captivos nos campanários frestados, os pesados sinos se baloiçavam e atiravam seus graves convites às amplidões do céu.



Ele então recobrava alento para a vida; volta-se um pouco de crença na glória e na felicidade. “Ama!” aconselhavam-lhe as tenras flores; e o bronze heróico lhe dizia: “Trabalha!”



Ele as evoca, entre as melhores de seu passado, essas vívidas e frescas manhãs de festas.



E, nessas manhãs de Páscoa de outrora, não era somente o vento que se achava de tão bom humor.



Tudo respirava alegria. O céu estava límpido e as mulheres tinham no olhar um como brilho que denotava felicidade: era o mesmo azul no firmamento e nos olhos das loiras. E o verdor! Oh! que fresco, que tenro, leve e delicioso verdor! Sobre o esqueleto das árvores ele ainda assomava.



O passeador solitário relembra seus anos passados.



Como tudo isso o inebriava: aquele vento traquinas, o azul novel, as flores serôdias, o verdor tão tardio, e, lá bem alto, o harmonioso tumulto dos sinos de Páscoa sobre a multidão jubilosa a passear à soalheira! Inda há pouco, como tudo isso lhe dava uma revivescência de mocidade!



Ai! estará isso decididamente acabado? Hoje, trôpego e doentio, tiritando ao menor sopro um pouco áspero do vento, o conserto aéreo o importuna. Será mesmo ele, o namorado e o poeta – que afinal, é uma e a mesma cousa – ele, que outrora, em cada flor imprimia um beijo, ele a quem todo ritmo inspirava logo mil canções, será mesmo ele que ora pode quedar-se indiferente a um perfume, a uma harmonia! Oh! cruel pensamento! Será verdadeiramente o fim, e não tornará ele a conhecer os encantos da natureza da vida?



Neste momento, a alguns passos diante de si, no grande jardim público onde espairece indolentemente o seu ócio, topa com um moço e uma moça, sentados num banco, na tepidez do sol que a tênue folhagem tamisa. É um casal de operários d’entre os mais pobres; pois, não obstante seja dia de grande festa, a mulher está em cabelo e veste modesto saial – e que saial! – e o homem conservou sua malha e sua blusa de trabalho.



No carrinho de vimes, em que repousa um inocentinho, bem perto de si, a mulher colocou um tufo de flores e o pequenino, que acaba de acordar, escancela os olhos ante esta maravilha e leva instintivamente para as flores suas mãozinhas polpudas.



O homem sustém de pé, sobre uma de suas coxas, o mais velho que terá dois anos quando muito – e o menino, que escuta os sinos da igreja vizinha, está encantado com a bela música e inclina compassadamente a cabecinha, a cada vibração do bronze. Então, os esposos olham sucessivamente seus dois filhos com os olhos dos pais e das mães, depois olha um para o outro e, em silêncio, sorriem-se longamente – não com o pálido sorriso dos inditosos! – mas com o sorriso onde há, pelo menos nesse momento, para esses dois humildes, um pouco de alegria e de amor.



Oh! como se envergonha, agora, o passeador pensativo, de sua tristeza egoísta e má de há poucos instantes! Que importa que ele envelheça e que o outono lhe derrame cada vez menos vigor! Flores de abril, desabrochai! Reboai, bimbalhai, sinos das aleluias! Outono, riqueza dos pobres, floresce! E sê abençoado por todos os infelizes e por este homem em declínio, a quem tu vens reaquecer o coração enternecendo-o à vista da felicidade alheia!



François Coppée – Paris (França) – 1897

Adaptação de João Modesti – Araras (SP-Brasil) – 2002





Padre João Modesti (1919-2005), Sacerdote Salesiano, professor de Física, Química e Matemática; Psicólogo doutorado pela Universidade Salesiana de Roma; autor com variada produção literária para cursos secundários e superior, de índole filosófica-religiosa.





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“Fora da VERDADE não existe CARIDADE nem, muito menos, SALVAÇÃO!”



LUIZ ROBERTO TURATTI.







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