O nobre e o escravo *
“A beleza do Super-homem vem a mim como uma sombra;
que me importa, agora... os deuses!...” F. Nietzsche
Nietzsche, através de Zaratustra, anuncia o novo homem, o Übermensch. O Super-homem assume seu desejo de poder, que traduz-se, para ele, como desejo de viver. O Übermensch é a superação do homem e Nietzsche conclama este novo homem: “um homem que justifique o homem, de um acaso feliz do homem, complementar e redentor, em virtude do qual possamos manter a fé no homem!” (NIETZSCHE).
Os homens da praça pública, conforme anuncia Zaratustra, dizem que todos são iguais. Perante Deus não há superiores, não há um mais que outro: é a uniformidade humana. Entretanto, este Deus está morto, e o forte não quer ser igual a população, ele deseja ser o além: o Além-homem. Anuncia Zaratustra: “Homens superiores, fugi da praça pública! (...) Homens superiores, esse Deus foi o vosso maior perigo. Ressuscitastes desde que ele jaz na sepultura. Só agora torna o Grande Meio-Dia; agora torna-se senhor o homem superior”.
O Super-homem é o homem forte, o homem do não-ressentimento, o que realiza sua Vontade de Potência, assumindo-a a todo custo sem jamais se culpar, sem jamais se ressentir; é o homem do amor a si, do cuidado de si, é o homem ético. O homem superior é o homem que afirma a vida em sua maior instância. “Na Escola Bélica da vida - O que não me faz morrer me torna mais forte” afirma Nietzsche. O homem superior é o homem do Sim.
Em contrapartida a esse homem superior, ao nobre, nasce o escravo. Eis a fórmula escrava: “Eu sou bom, portanto tu és mau. Tu és mau, portanto eu sou bom”(DELEUZE). O escravo é o sujeito do ressentimento, da culpa e da negação. O escravo é necessário ao nobre para que este realize sua vontade de poder, de dominação. Entrementes, quando isto ocorre, o escravo utiliza da fórmula acima para se defender. O escravo é fraco, não luta e não pode lutar contra o forte, todavia, ele usa de conceitos para frear a dominação e a violência do nobre: eis a moral universal triunfante.
O escravo tem ciência de sua fraqueza, mas cria meios de sobrepujar o nobre, meios como a união, Deus e o preceito moral ame a teu próximo como a ti mesmo. Aí residem a força do escravo. O nobre termina por não realizar sua vontade, pois agora residem em sua consciência o ressentimento, o medo da punição divina, o medo de uma eternidade sofredora. A moral escrava é tão poderosa que se tornou real - ao menos intimamente - os conceitos consciência, eternidade, Deus. E, com o triunfo de tal moral, o homem, literalmente, esqueceu-se que estes não passam de conceitos e palavras vazias, que na verdade não existem e nunca existirão.
Taitson A. L. dos Santos
* Texto originalmente publicado em "A Tribuna Piracicabana" - 26/10/2001.
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