INSPIRAÇÃO - O que mais posso esperar de ti se tudo o que me disseste era mentira?
RAZÃO - Nada disso! Só quis mostrar o quanto foste imbecil.
INSPIRAÇÃO - O quê?! Imbecil por aceitar teus conselhos? Tu mesma afirmaste que quando eu não pudesse mais prosseguir que desistisse ou que esperasse um pouco...
RAZÃO - Não foi isso que te disse, não...
O pequeno diálogo acima, iniciado e abortado com a mesma rapidez, parece provar minha tese de que para os escritores não é a inspiração o fator determinante na produção literária.
Não é verdade que os escritores sentem dores incríveis ao ter que abortar um texto? Não se compara sua dor à de uma mulher obrigada a perder um filho? Em que circunstância, então, um escritor deve abrir mão do seu texto?
Em minha pouca experiência posso afirmar que é quando, tendo iniciado um texto qualquer, o autor se deixa vencer por uma espécie de bloqueio cuja natureza, pelo menos é o que comigo ocorre, não consegue definir nem identificar. É claro que para o escritor o escrever é compulsivo. Não acredito em momentos especiais de inspiração; não creio que deva haver uma motivação interior especial pra que algo seja produzido. Se escrever é o que dá prazer, então não se pode admitir que por qualquer causa de natureza emocional um escritor deixe de produzir, ou, pela mesma causa, sinta-se compelido a escrever. E a inspiração? E a luz que brilha sobre a cabeça? E o insigth?
Devemos crer nisso? É claro que não. Se a inspiração fosse o motor da criação literária ficaria muito prejudicada a continuidade de determinada obra, que poderia nem ser concluída, visto que nossa natureza susceptível a mudanças inexplicáveis de comportamento não pode garantir jamais que em todo o tempo em que quisesse escrever um escritor encontrasse condições propícias, sejam externas ou internas.
Digamos que o escritor tenha um cachorro ao qual dedique ternos afetos, cuidando dele como se fosse um filho e esse cachorro venha a morrer, será que, nesse dia, tal escritor terá motivações para escrever? Não? E a inspiração? Ah! Quer dizer que a inspiração só prevalece em condições tranqüilas? Seria ela incompatível com as desgraças? Será que um escritor sensível deixará de escrever porque as cenas cruentas de uma guerra o impressionam deveras? Não seria o caso de admitirmos que a desgraça mesma de uma guerra deveria ser sua principal motivação? Então a inspiração não está no escritor mas fora dele? E o que inspira um inibe a outro?
Por tudo devo concluir que o que leva um escritor a sofrer dores ao ter que desistir de um texto não é a falta de inspiração, uma vez que ela não existe no caso do escritor, apontando definitivamente a falta de motivação por carência intelectual, parcos conteúdos, informações insuficientes ou não seguras relativas a um tema específico, o que determina o aborto de determinado texto.
Assim é comigo, e com os colegas da Usina, como se dá isso? Espero compartilhar do assunto com vocês.
P.S. se alguém desejar, pode terminar o diálogo que encima o artigo.