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Erotico-->1. ARPEJOS INARMÔNICOS -- 25/10/2002 - 07:08 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Considerando que o momento não lhe propiciava cabal controle de si mesmo, Prisco deixou de lado o instrumento que dedilhava com perfeição, pondo-se a meditar a respeito dos males que o haviam atingido ultimamente.

Começou pela perda do filhinho recém-nascido e da esposa bem-amada.

Sem lágrimas já, era capaz de elevar os pensamentos aos planos superiores em que imaginava os espíritos dos que partiram.

Na verdade, materialista contumaz, apenas dava asas à imaginação, expressão esta que elegeu para justificar os devaneios irresistíveis, como se a mente estivesse submetida a soberano poder.

Olhou demoradamente para as mãos, examinando as calosidades provocadas pelas cordas do violão, mãos de artista habituadas ao ritmo frenético das composições andaluzes. Daria ambas as mãos e também sua arte para ter de volta a mulher com quem vivera os últimos dois anos, em plena felicidade.

“Se, ao menos, tivesse ficado comigo a criança, haveria um consolo para este vácuo de sofrimento.”

Lá no fundo da consciência, surgiu-lhe a idéia da possibilidade de que o pequenino ser pudesse vir a concentrar-lhe o ódio pela perda da mãe, já que...

Esforçou-se para não levar adiante a intuição, explicando-a como a necessidade de se ajustar ao desengano. Sentiu que agredia o filho morto, sem motivo. Desejou superar os frêmitos provocados pela visão interior da imperfeição moral.

“Que bom seria se eu não assumisse jamais papel de vítima nesta dolorosíssima circunstância. Mas, se não me distrair trabalhando, vou acabar paranóico.”

Foi quando tentou delinear o futuro. Havia contratos a cumprir. Havia amigos a atender. Havia parentes a consolar. Era preciso ser forte entre os fracos que, mais que ninguém, fora ele quem perdera.

Recordou-se do pranto silencioso dos sogros. Reviu a expressão dolorosa no semblante dos pais, que sofriam o seu sofrimento, ainda mais do que a perda da nora e do neto.

“Minha vida sempre foi uma ilha cercada de amor por todos os lados.”

Achou a comparação muito infeliz. Queria algo mais poético, mais sutil, que expressasse com maior vigor a delicadeza das recordações afetivas.

Retomou a guitarra e executou uma peça do cancioneiro cigano, interpretando com o coração os dizeres com que o poeta invectivava o céu, desafiando-o a retirar-lhe da alma o amor ali arraigado pela eternidade. Os despojos da amada se desfaziam no cemitério.; mas sua presença ideal não fora jamais tão forte. Tresvariava em soluços na melodia, cuja letra não cantava, para uma platéia inexistente.

Nessa fúria quase incontrolável permaneceu por mais de duas horas, terminando por arremessar o instrumento contra a parede, saindo de casa sem rumo certo, pisando sobre a umidade da areia escaldante do meio dia.

Acordou no ambulatório de um hospital, recebendo tratamento para insolação.

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