György Ligeti versus Kubrick: 3000 dólares pela atmosfera de "2001"
Entrevista conduzida por Sven Ahnert (DIE WELT online, 26/02/2001)
Trad.: zé pedro antunes
A obra-prima de Stanley Kubrick "2001: Uma odisséia no espaço" tem uma trilha sonora famosa, com música de Johan Strauss, Richard Strauß, Katschaturjan - e György Ligeti.
Seqüências essenciais do filme, como a psicodélica viagem no tempo ou o primeiro encontro com o monolito em solo lunar são devedoras do universo sonoro de Ligeti, ("Atmosphères", "Aventures", "Requiem", "Lux Aeterna").
A forma bastante pessoal de Kubrick, com a inclusão de música já composta anteriormente ao projeto do filme, eletrizou opositores e defensores.
Deixando de lado o debate estético, houve problemas com dinheiro e pagamentos. "2001" é, em termos de direito de propriedade, um caso único na história do cinema.
Com algum rancor, Ligeti, em conversa com Sven Ahnert, lança um olhar retrospectivo sobre os fatos.
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DIE WELT: Como foi que Kubrick chegou à idéia de incluir a tua música em "2001: Uma odisséia no espaço"?
György Ligeti: Isso eu não sei. No início de 1968, eu apenas recebi de um conhecido de Nova Iorque uma carta que trazia a notícia de um filme incrível de ficção científica, do Kubrick, com a minha música. Nunca estive pessoalmente com o cineasta, apesar de ele, inúmeras vezes, ter feito uso de minhas composições ("O iluminado" e "De olhos bem fechados"). Só posso ser muito grato a ele por isso, pois o considero um gênio. Mesmo assim, o tratamento que ele me dispensou foi tudo menos algo inteiramente em ordem. Muito mais tarde eu li que Alex North escreveria a música para "2001". Música que, no final das contas, não foi utilizada. Kubrick ouviu discos com as minhas peças e queria que North escrevesse música semelhante àquela. North, porém, jamais lhe entregou essa encomenda. Aí, ele lançou mão do original. O pessoal da MGM, que havia pago a North por aquela música, nem sequer em sonho pensaria em fazer o mesmo comigo.
DIE WELT: Gosta do filme?
Ligeti: A parte do meio, o vôo a Júpiter, eu achei maravilhosa, mas gostei sobretudo do final, com a viagem no tempo. Também achei maravilhosa a forma como a minha música foi usada. Menos maravilhoso que isso tudo: ninguém me perguntou e nem me pagou coisa nenhuma. Há, nesse filme, aspectos de que eu não gosto e que não entendo: o início e o final. São coisas tão místicas, para tratar da luta darwiniana pela sobrevivência.
DIE WELT: Acha que a sua música está bem colocada no filme?
Ligeti: De forma extraordinária. Ao compor essas peças, não tinha em mente coisas cósmicas. "Atmosphères" tem a ver com o ar, só isso. Pela escolha de Kubrick, minha música passou a permitir adequação ideal a fantasias espaciais e ligadas à velocidade. Tenho o maior respeito pela arte de Kubrick, mas não por seu egoísmo, pelo desdém com que trata as pessoas.
DIE WELT: Como o senhor, na época, tentou se defender?
Ligeti: Juntamente com a minha editora, entrei com um processo contra a MGM. Eles responderam: "Ligeti deveria se dar por satisfeito com o fato de ganhar notoriedade nos EUA com esse filme".
DIE WELT: E Kubrick, o que disse?
Ligeti: No início dos anos 80, na BBC, eu contei esse fato. O Kubrick deve ter ouvido a respeito e me escreveu uma carta absurdamente agressiva. Dizia que eu deveria, em caráter oficial, retirar a acusação. Mandei-lhe uma carta em resposta: "Mr. Kubrick, poderia me enviar uma fotocópia do contrato?" Não houve retorno.
DIE WELT: Qual foi o desfecho do caso, do ponto de vista financeiro?
Ligeti: Mais tarde, um jovem advogado da MGM me contou: "Sua história é bastante famosa, e, na época, as pessoas da firma riam muito da ingenuidade do seu advogado berlinense". Naquele momento, haveria o processo, e o valor em questão era de 30.000 dólares. A MGM respondeu: "O senhor vai ganhar esse processo em Frankfurt, Viena e Londres. Mas aqui, em Los Angeles, podemos arrastá-lo por uns 20 anos. O senhor não preferiria 1000 dólares agora? Acabaram me pagando 3000 dólares.
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