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Erotico-->14. EM COMPASSO DE ESPERA -- 15/09/2002 - 07:19 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

O restante do dia foi sem atropelos.

Ao acordarem, os dois mandriões do etéreo, com medo de justificadíssimas reprimendas dos mandachuvas da gangue malfazeja, combinaram nada dizer sobre o que se passou durante sua permanência no lar do médico. Estava ele bem? Era suficiente. Cederam a vez à vigilância de outros comparsas do período diurno e se puseram, indolentes, a descansar das peripécias da noite e da manhã.

Alfredo e Dráusio quiseram acompanhar o Doutor, mas logo perceberam que estariam colocando em risco a operação-Isabel. Resolveram, então, buscar o conselho dos colegas e do Irmão José.



Isabel e Joana estabeleceram convívio mais íntimo, já que as coisas pareciam ter caminhado bem. Joana deu de barato que a verdade sempre vem à tona e se dispôs a aguardar por ela. Isabel tinha tirado um peso da consciência, ou melhor, agia mais confiantemente sobre o que fazia, pois a patroa se havia resignado ao papel de orientadora moral. Não se aproximava das crianças senão quando a mãe estava presente, com o que esperava demonstrar que atendia às recomendações de Mário.

Este, muitíssimo preocupado, montou acampamento no quarto de Orivaldo, buscando entender as reações orgânicas do petiz, acudindo à moléstia mais aguda, no entrechoque com as resistências naturais. As transfusões sangüíneas produziram o efeito almejado, dando ao enfermo condições de resistir. Enquanto tomava notas a respeito do quadro clínico do paciente, imaginava que daria para escrever belíssima tese de livre-docência universitária, através da descrição da patogênese das diferentes infestações microbianas, à vista do tratamento que se ministrava. Principalmente, julgava impossível impedir que houvesse intercorrência dos fatores... Perdia-se em emaranhado de termos técnicos, muitos dos quais iam faltando à prontidão dos conhecimentos, uma vez que os vinte anos de pronto-socorro não lhe facultaram a atualização científica desejável.

Mas as reflexões profissionais, na modorra da observação, tendiam a deixar passar os recentíssimos acontecimentos domésticos. Quando resolveu pensar sobre o que fazer com Isabel, notou que o inconsciente formara completo panorama do drama em que se envolvera. Diante dele, a criança, ou melhor, o passaporte para o sossego urbano, caso satisfizesse os desejos do pai-traficante. Nunca se sentira refém dos bandidos, mesmo quando levado sob o guante da autoridade paralela para o socorro emergencial. Agora, via que a sociedade estava dentro da terra de ninguém da guerra oficial contra o crime organizado.

Sabia da existência de detetives e de militares acoplados ao sistema do submundo, mas dava o desconto da minoria. Quantos guardas tinha recebido baleados, muitos dos quais em óbito. Não havia dúvida quanto à necessidade de apontar às autoridades governamentais o despropósito das ameaças que recebera. Mas a quem recorrer? O próprio administrador, o Doutor Darci, estava recebendo ordens superiores, no sentido de preservar a vida do menino. Não havia o que delatar a ele. Se fosse para entregar o bandido a alguém, deveria ser no âmbito da Justiça. Lembrou-se de Marlene falando a respeito de advogado. Fazia sentido.

Nisto, a criança se pôs a gemer. Delirava:

— Mãe, me ajuda! Fica comigo! Mãe...

Mário fez os cálculos dos anos. Pelas informações de Isabel, o pequeno Leandro deveria ter entre dois e três anos, quando ela o deixou. Não podia ter lembrança da mãe. Estaria chamando a tutora? Só poderia ser... Decididamente, estava encalacrado. Teria de manter Isabel em sua casa. Ela seria muito mais perigosa solta. Pelo que entendeu, iria tentar levar embora o filho, assim que pudesse. Por outro lado, se o pai...

— Por Deus! Eis a solução!

Lembrou-se Mário de que os pais falavam em arrumar uma ajudante. Os velhos, há tempos, vinham “quebrando o galho” com faxineiras eventuais. Não tinham posse para contratar empregada com carteira assinada e tudo. Eram só os dois. Isabel lhes serviria plenamente.

— Será que Marlene aprovaria?

Saiu ao corredor para oportuno telefonema. O movimento fez que voltasse rapidinho para o quarto. Era o medo do “grampo” telefônico. A coisa mais fácil era a colocação de “araponga” externa, com transmissor paralelo. Vira reportagens em que são empregados pequenos gravadores. Mas o nível de adiantamento eletrônico de posse dos contraventores deveria ter-lhes fornecido material bem mais sofisticado. Deveriam estar em escuta permanente, no resguardo da saúde do filho do chefe...

Pôs a mão na testa. Se isso era possível no hospital, em sua casa deveria ter sido facílimo. Tomaria cuidado com as ligações de Marlene.

Derivou o pensamento para a área policial.

— Morreram três soldados e mais quatro estão internados. Por certo, se souberem que Orivaldo é filho do chefe...

Não queria fazer previsões catastróficas, mas a verdade é que, quanto mais pensava no assunto, mais se via no meio de enorme furacão, sem mastro onde se amarrar.

— E os bandidos rivais? Não terão interesse em seqüestrar...

Realmente, se qualquer palavra dita por ele, Marlene e até Joana fosse traduzida convenientemente por aquelas pessoas, iria sofrer rudes conseqüências. A partir desse instante, redobrou o interesse em cuidar do menino. Imaginou que havia suficiente proteção do bando infiltrada entre os seguranças do hospital. Não poderia facilitar. Além disso, dentre os enfermeiros, com certeza, havia quem estivesse controlando suas idas e vindas, marcando as horas de permanência junto ao doente. Era preciso ampliar o horário de atendimento. Era preciso demonstrar que o tratamento estava absolutamente adequado. Imaginou que, se trouxesse livros para a cabeceira da cama, poderia iludir o olheiro, passando-lhe a idéia da abnegação. Mas poderia ser que pensassem que era incompetente. Alimentou a ilusão de comentar sobre a necessidade de especialistas. Mas estes iriam saber que tudo estava sob controle...

Levantou-se do leito. Apanhou o termômetro. Mediu a febre do pequeno. Temperatura normal. Auscultou o coração. Batimento cardíaco regular. Examinou o branco dos olhos. Cedera bastante a anemia. Só os pulmões acusavam problemas. Pôs atenção na cicatriz fresca da perna. Recompunham-se os tecidos lesados. Apanhou a tabuleta já volumosa. Procurava o resultado dos exames de fezes. Os vermes tinham diminuído drasticamente. Haveria perfurações intestinais? Uma hemorragia interna seria letal.

Orivaldo não se debatia. Através da agulha destinada ao soro, há meia hora, a enfermeira lhe administrara a dose de antibióticos e de analgésicos que lhe dera essa contemporização com as doenças. Além do mais, era mantido sedado a maior parte do tempo, para as constantes avaliações radiográficas e hematológicas. Se sobreviesse a possível complicação prognosticada por Mário, deveria estar muitíssimo atento, para volver com o paciente para a sala de cirurgia.

Antes de adormecer, Mário teve tempo para observar que não sairia ileso dessa aventura:

— Vou precisar tomar cuidado com possíveis úlceras...

Mas a noite passaria sem novidades.

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