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Artigos-->OS MÚSICOS DO CLÃ DOS BANDEIRAS -- 22/03/2007 - 09:49 (LUIZ CARLOS LESSA VINHOLES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


OS MÚSICOS DO CLÃ DOS BANDEIRAS



L. C. Vinholes





Nota de 21 de março de 2007: este texto teve a intenção de resgatar informações esparsas sobre membros da família Bandeira e foi publicado no Diário Popular de Pelotas (RS) em 10/02/2002.





Artigo



Às margens do Araguaia, concluí a leitura da tese, redigida em espanhol, O piano na Cidade de Pelota (RS, Brasil) de 1918 a 1968, uma Leitura Histórica, Musicológica e Antropológica, de Isabel Porto Nogueira, doutora em História e Ciência da Música pela Universidade Autônoma de Madri, hoje professora do Instituto de Letras e Artes da Universidade Federal de Pelotas.



Grande parte deste esmerado trabalho gira em torno do Conservatório de Música de Pelotas e da figura ímpar do pianista e professor Milton de Lemos, diretor deste estabelecimento por 30 anos, alguns dos quais coincidem com curto período em que ali fui aluno de Antônio Margherita (teoria e solfejo), Lourdes Nascimento (canto), Olga Fossati (violino) e Jean Jacques Pagnot (violoncelo). Aluno que tinha como objetivo conhecer melhor um pouco de tudo aquilo que lhe seria útil durante sua já, na época, escolhida carreira de compositor.



Fui testemunha de parte do que consta da referida tese e, justamente por isto, sua leitura foi imensamente interessante e proveitosa, uma vez que muito aprendi sobre o que não imaginava, vindo a conhecer melhor “a memória musical da nossa cidade”, como escreve a autora na dedicatória com que me distinguiu.



Mais de três centenas de páginas de leitura fácil e atrativa e, o que nos dias de hoje é surpreendente, de texto escorreito e de revisão minuciosa. Quadros estatístico, possíveis graças às facilidades da informática e reprodução de documentos significativos, inclusive fotos, enriquecem a extensa pesquisa realizada pela autora.



No decorrer da tese, é mencionado, de passagem, o nome de João Pinto Bandeira (30/03/1845 - 02/05/1931) figura proeminente do clã dos músicos Bandeira que, por mais de meio século, tiveram papel relevante na vida musical pelotense.



João Pinto Bandeira, filho de Porfírio Pinto Bandeira, músico e afinador de pianos em Pelotas, e dona Bárbara Rodríguez Pinto Bandeira, descendente de índio paraguaio, foi 2º sargento na guerra do Paraguai tendo, muito cedo, dado baixa como alferes “em virtude de ferimento grave em uma das pernas”. Como seu pai, foi excelente executante de instrumentos de corda. Dos 15 aos 83 anos, inicialmente, desempenhou a função de organista da Igreja Matriz de Pelotas, a atual Catedral, e, depois, nos limites das possibilidades da época e da região, responsável “mestre capela” do coro e dos conjuntos que organizava para os eventos religiosos mais importantes. Foi regente da Banda Santa Cecília, fundador da Banda Bellini com membros da colônia italiana com primeira apresentação pública em 20 de abril de 1879, e um dos criadores da Estudantina Esmeralda Filarmônica de Pelotas. Era poliglota conhecendo italiano, francês, latim e espanhol. Foi acompanhador de cantores que chegavam à cidade com as companhias de ópera; respeitado professor de piano de três gerações de pelotenses às quais impressionou com sua virtuosidade e técnica; e, juntamente com o tenor Gambine, repetidor de Zola Amaro com quem ele trabalhou, de maneira intensa, a partitura da ópera Aída de Verdi, com a qual ela fez tanto sucesso.



Em uma das visitas de Dom Pedro II a Pelotas, em sarau na casa do Visconde de Piratini, declinou oferta do imperador de uma bolsa de estudos para aperfeiçoar seus conhecimentos de piano em Paris, “devido a compromissos de família que não permitiam seu afastamento de Pelotas pois, já estava casado, tinha um filho e era arrimo de sua mãe e irmãs, por falta de seu pai que não existia”, conforme memória de Maria Pina Bandeira de Tólla de Almeida, em 1978, oferecida à professora Candinha Rocha.



De João Pinto Bandeira conheço o Hino a São Francisco de Paula, padroeiro de Pelotas, que no coral da Catedral tive várias oportunidades de cantar; o Canto Patriótico dos Farrapos em suas Marchas - 1835; o Canto da Verônica, da procissão do Corpus Christi da Semana Santa, cantado pela primeira vez por Vivi Campos e que, anos depois, escutei por Suzana Pereira; e o Hino de S. Gerardo (16/10/1908).



A morte de João Pinto Bandeira foi noticiada pelo Diário Popular (03/05/1931) com a seguinte chamada: “desapareceu a relíquia de Pelotas: Maestro Bandeira”.



Os estudos de música, que iniciei desde cedo por conta própria, só foram aprofundados e ampliados depois que, em 1947, comecei a freqüentar o coro da Catedral de Pelotas e a casa do maestro José Duprat Pinto Bandeira (11/06/1885 - 03/04/1955) ou, simplesmente, José Bandeira, conforme era conhecido. Com ele tive as primeiras noções de composição e orquestração e aprendi a ler e cantar o gregoriano, matéria até hoje, lastimavelmente, desconsiderada pelas escolas de música do Brasil. Sentado no seu harmônico de foles a pedal, pacientemente satisfazia minha curiosidade e ensinava a apreciar determinadas passagens e soluções harmônicas de obras clássicas. As primeiras noções de regência as aprendi dos braços do maestro José Bandeira à frente do coro da Catedral e, posteriormente, da Orquestra Sinfônica de Pelotas, da qual fui copista. Dele ouvi falar, pela primeira vez, do movimento musical de Pelotas desde meados do século XIX e nas primeiras décadas do século XX, quando seu pai, o maestro João Pinto Bandeira, e seus irmãos Demétrio, Domingo e Leonídia (Mimosa) participavam de eventos com peso no calendário cultural da cidade e, por extensão, do Estado.



José Bandeira era exímio arranjador, orquestrador e compositor de música sacra. Dele conheço a redução para piano da Serenata Granadina, obra de 1920 na qual usa o pseudônimo de Terpandro e que, por ele orquestrada e dirigida, foi apresentada no concerto de 30 de outubro de 1930, no Theatro Guarany, “em favor das famílias dos soldados que marcharam para o campo de operações” da revolução daquele ano; os esboços da Novela Sinfônica il Destino, de 1931, inspirada na novela homônima do escritor polonês Wladislaw Raymont; a canção Eu Pensando em Ti, com letra de Francisco Barcelos; a “preguiera” Santo Antônio (15/04/1937), com letra em italiano, dedicada aos irmãos D. e C. Camorali; o Cântico à Nossa Senhora de Lourdes (14/04/1939), composto a pedido de Elisa e Carlos Camorali, para ser cantada na Novena de Santo Antônio na Matriz da Luz, em 9 de maio de 1939; o Hino a Santa Terezinha (25/05/1941), escrito a pedido do professor e diretor do teatro David Zanott, “para cantar durante apresentação da vida” desta santa; a canção Você (1942), com letra de Azevedo Teixeira; e o Hino aos Romeiros pró-Paz e Vitória (01/08/1943), com letra do frei Fidélis. De algumas dessas obras restam partes dos instrumentos que utilizou em suas apresentações.



Conheço, ainda, a orquestração das Astúrias (29/09/198) à qual, em 1949, agregou a parte de clarinete baixo; e a adaptação para harmônio, do mesmo ano, da Chanson Triste, de P. Tschaikowsky.



Com exceção feita à partitura da canção Você, em edição particular ilustrada com fotos do poeta e compositor, as demais mencionadas são manuscritas a bico de pena. As caligrafias de João Pinto Bandeira e José Bandeira são diferentes: a do pai, mais pesada no uso da pena e inclinada à esquerda, tem as hastes à direita das notas, tanto para cima quanto para baixo; e na do filho, leve e de tamanho menor, as hastes, como na notação musical impressa, estão à esquerda quando para baixo e à direita quando para cima.



Em 1950, o maestro José Bandeira mostrou-me uma ocarina de tamanho grande, pintada de preto, pela sua tessitura uma ocarina baixo, que fora utilizada pela Orquestra dos Ocarinistas Pelotenses. Anotei as informações verbalmente recebidas e, nos meses seguintes, consultei jornais de 1877 a 1878 da coleção da Biblioteca Pública.



Depois de algumas visitas e de ter despertado a curiosidade do Índio, rapaz que trabalhava de servente e guarda, passei a contar com sua colaboração na busca das informações desejadas. Ainda tenho o caderno no qual copiei todas as notícias encontradas sobre os ocarinistas pelotenses, inclusive detalhes sobre a constituição da orquestra, nomes dos integrantes, repertório que inclui o Hino da Vitória, de João Pinto Bandeira, dedicado ao Marquês do Herval, e outros dados pertinentes. As primeiras informações sobre as pesquisas que fiz estão reunidas em entrevista que dei ao jornal pelotense Oferta e Procura, de 28 e 29 de maio de 1977; foram registradas em artigo de Luís Ellmerich publicado no Diário de São Paulo, de 5 de julho de 1977, e constam, detalhadas, do artigo Há 100 Anos Ocarinistas Portugueses Visitarem esta Cidade e aqui Deixaram a Marca de sua Influência, publicado pelo Diário Popular de 7 de julho de 1978, que, em 1979, serviu de subsídio às referências aos ocarinistas pelotenses constantes da dissertação de mestrado Um Século de Música Erudita em Pelotas - Alguns Aspectos (1827-1927), de Cândida Isabel Madruga da Rocha, lembradas na tese de doutorado de 2002 da professora Isabel Porto Nogueira.



As famílias de João Pinto Bandeira e de José Bandeira tiveram endereços nas ruas Miguel Barcelos nº 101, Feliz da Cunha nº 867 e General Argolo nº 325.



Continuando a acreditar na conveniência de ser estudado o papel dos Bandeiras no ambiente musical de Pelotas, conforme registra crônica de arte de Francisco Vidal na edição do Diário Popular de 23 de abril de 2001, solicitei à diretora Anaizi Cruz do Espírito Santo e ao professor Mário Maia, do Instituto de Letras e Artes da Universidade Federal de Pelotas, a incentivar aos alunos daquele Instituto a pesquisar e documentar tudo o que foi feito e vivido pelos Bandeiras, reunindo, com o competente acompanhamento de um orientador, em uma tese específica, para não ser esquecida uma parcela importante do passado pelotense.



Recomendo a quem se interessar por este assunto procurar os descendentes do maestro José Bandeira, especialmente o padre Affonso Bandeira, suas irmãs Maria Isabel (Pochocha) Bandeira Caldeira que com ele reside: Magloire Bandeira Karan, ora em Porto Alegre, mãe de Sérgio Bandeira Karan mestre em saxofone e Cláudio Bandeira Karan, executante de violão e cavaquinho; e, para não esquecer, os descendentes de Pedro Mazzara Bandeira e seu irmão João Antônio que, assim como o pai, foram excelentes contrabaixistas, chegando a integrar o quadro permanente da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre dirigida por Pablo Komlos.



Permito-me sugerir que sejam vasculhados os arquivos do Colégio Gonzaga do qual José Bandeira foi aluno; do Instituto São Benedito, do qual foi professor de música; e do Bispado de Pelotas, por ter sido, desde 1933, substituto de seu pai na direção do coro da Igreja Matriz após nomeação pelo presidente das irmandades do Santíssimo Sacramento e de São Francisco de Paula, coronel Joaquim A. de Assumpção. Que sejam dadas buscas no Teatro Colón de Rosário de Santa Fé, na Argentina, onde residiu até 1918. Ali trabalhou ao lado do irmão Demétrio Duprat Pinto Bandeira, chegou a ser membro da Comissão Especial, Vocal e Vice-Tesoureiro da Sociedade Orquestral daquela cidade e, conforme escreveu, ali passou a melhor parte da sua juventude. No Museu Farroupilha, em Porto Alegre, poderão encontrar informações preciosas que permitam reconstruir o ramo da árvore genealógica dos Bandeiras de Pelotas e seus laços de parentesco com Rafael Pinto Bandeira, personalidade marcante na história da Província do Rio Grande do Sul e primeiro general rio-grandense inscrito como Dragão do Rio Grande, de quem José Bandeira era sobrinho-neto.



Durante sua permanência em Rosário, José Bandeira casou-se, em 1912, com Raquel Mazzara, natural da Reggio Calábria, na Itália, e teve seus dois primeiros filhos: Pochocha e João Antônio. Viveu naquela cidade por mais de uma década e ali conheceu e privou com grandes artistas italianos, dentre os quais o famoso tenor Alfonso Caruso, conforme foto de janeiro de 1910, do Estúdio Fotográfico Século, com endereço à rua San Martin, nº 1.218. Sobre ele e suas andanças, importantes subsídios constam do diário das viagens de 1908 a 1910 que fez a Rio Grande, São Gabriel, Uruguaiana, Bagé, Santos, Rio de Janeiro, São Paulo, no Brasil; e Salto, Concórdia, Buenos Aires e Mendonza, na Argentina, trabalhando na orquestra da companhia lírica Schiaffino.



As coleções dos jornais das bibliotecas das cidades brasileiras e argentinas aqui mencionadas certamente guardam notícias que poderão revelar detalhes da vida não só de José Bandeira mas, também, dos seus irmãos Demétrio e Domingos.



Mais uma vez concito aos professores e alunos dos setores de história e de música da UFPel a tomar a si a tarefa de resgatar tudo o que for possível com relação ao clã dos músicos Bandeira e a dar a Pelotas um documento que perpetue parte da história da Princesa do Sul.

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