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Erotico-->1. SALVAÇÃO INESPERADA -- 02/09/2002 - 06:51 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

O negrinho Orivaldo estava passando muito mal. Feridas por todo o corpo. Blastomicose, diria mais tarde o médico, no hospital. Mas, no barraco, delirava de febre e chamava pela mãe.

Cuidava dele a “tia” Raimunda, velha já, que o apanhara na rua muito pequeno, dó de quem não tivera filhos mas que não lhe permitira chamá-la de mãe.

— “Tia”, Orivaldo. “Tia”. Onde se viu moça (e pensava: “donzela”) solteira ser chamada de “mãe”. “Tia” está muito bom...

Mas Orivaldo não escutava. Dormia. Ou melhor, desmaiara e não tinha condições de entender nada. E chamava pela mãe:

— Mãe, me ajuda, mãe...

Raimunda estava atarefada demais. Era festa de São Tiago, santo da devoção. Tinha compromissos. E o menino que não melhorava. Ardia em febre. Se continuasse assim, levaria o coitadinho ao posto de saúde.

“Se continuasse assim, morreria...” — pensava lá consigo o protetor, no etéreo. “Se passasse por aqui alguém que entendesse de febre...” Dia de semana, a favela só produzia o vozerio da criançada, enquanto os rádios despejavam música americana em todos os escaninhos das ruelas e becos.

— Fica, Orivaldo, que vou buscar açúcar na venda.

Não tinha por que suspeitar de que o pequeno iria sair pelas ruas sozinho. Estava caído. Inerte. Boçalizado, ele que era tão buliçoso, irrequieto.

O Benfeitor Alfredo tentou despertar o espírito, meio desprendido do corpo. O cordão luminoso estava sombrio, mais do que simples doença de pele poderia fazer supor. Alfredo sabia que havia mais do que feridas. Havia doença nos pulmões. Havia doença no sangue. Haveria doença na cabeça, se não fosse tratada a infestação de vermes nos intestinos.

Lá embaixo, a polícia trocava tiros com traficantes. Estes vinham recuando, morro acima, resguardados pelos muros conhecidos, pelas portas que se abriam e se fechavam, oportunamente. Uma granada foi jogada ladeira abaixo, explodindo no meio dos policiais. A televisão estava com as câmaras abertas. Pegaram a cena do sangue jorrando, os gritos de dor, o desespero dos colegas, a reação das metralhadoras pipocando. E lá foram os cinegrafistas morro abaixo, acompanhando a apressada tropa a carregar os feridos. As manchetes dos jornais estampariam: “Três mortos no Andaraí de Cima.” “Chuva de granadas despenca do morro e mata três.” “Polícia despreparada perde de três a zero.”

Alfredo viu quando um dos bandidos se ferira e deixara rastro de sangue. No caminho da casa de Tia Raimunda. Queria fazer que os policiais entendessem que deveriam seguir o ferido. Não atendiam. Estavam superexcitados. Tinham perdido o medo e queriam vingança. Mas a munição era escassa e estava terminando. Fervilhava o etéreo de espíritos malfeitores.

Tia Raimunda voltou de mãos abanando. Vinha branca. Preta mas branca, de susto. Nunca o perigo chegara tão perto. O malandro estava caído à porta. Armado até os dentes. Desviara-se do comando e a perna não mais obedecia. Raimunda entrou e passou o ferrolho. Se o bandido entrasse, podia provocar a polícia a ponto de arrasar o barraco. Barraco era força de expressão, que a casinha era de alvenaria, com três cômodos, luz elétrica e água encanada. Até esgoto clandestino havia, a levar os dejetos para o rio dos ricos...

Mas a força policial finalmente correu atrás do sangue derramado. Encontrou uma poça perto da porta aferrolhada. Deram voz de prisão e atiraram. Os gritos de Raimunda não se ouviram por bom tempo. De repente, a porta vai ao chão e a polícia entra atirando. Deram com a velha a tremer e a criança translúcida. Uma bala atingira o menino na perna. Nem sentira.

Era preciso heroísmo. Um dos policiais apanhou o pequeno e o levou para a retaguarda. Raimunda vinha de contrapeso, demorando a descida, pesada e tola.

Naquela mesma noite, Orivaldo era operado e recebia atendimento de emergência. A bala salvara-lhe a vida.

Alfredo enxugava o suor, enquanto orava desenxabido por não ter conseguido nada. Ao menos, o serviço iria prosseguir e ele agradecia ao Senhor a oportunidade de praticar caridade.

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