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Cartas-->Carta aos Suicidas (patroc. Funerária Vai com Deus Amém) -- 01/05/2002 - 18:13 (Jactâncio Futrica) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
SUGESTÕES PARA OS SUICIDAS


Amigo suicida, em primeiro lugar quero lhe dar os parabéns por teres chegado ao fundo do poço com dignidade e hombridade, sem se entregar como um cordeirinho a nenhuma dessas máfias religiosas que vivem latindo nas rádios e na TV. Com certeza, é preferível perder a vida do que perder a alma nas mãos desses loucos.

Sei que é inútil dizer-te que a vida é linda; que Deus está dentro de ti; que olhes a lição daquele cara que não tem pernas e que leva a vida sorrindo... Quero apenas que leves em conta uma ligeira ponderação: já que chegaste ao ponto de não achar mais graça na vida e vais mesmo pular de cima do viaduto, por que não arrancar na marra esta graça perdida? _ Não há nada a perder! Você é o cara mais livre do mundo! Antes de se matar...

1- Que tal explodir uma fileira inteira de carros estacionados na avenida principal, em dia de festa? (uns dez bibis, pelo menos). É fácil, não tem mistério. O material e as técnicas necessárias pra se explodir um quarteirão inteiro são, cá pra nós, coisa de criança. É só querer! Uma noite festiva de sábado seria boa ocasião pra compartilhar este espetáculo artístico com o resto da sociedade.

2 - Estupre quantas mulheres puder. Pode começar por aquela médica gostosona. Marque uma consulta e compareça levando no bolso um lenço encharcado de clorofórmio (lacrado num saquinho plástico). Na primeira oportunidade em que ela lhe virar as costas, voe sobre ela, agarre-a e dope-a. Quando sentir que o corpo da vadia começou a ficar molinho em seus braços, comece a libertinagem.

3 - Levante-se da mesa no meio do jantar (na casa daqueles seus parentes esnobes) e urine em cima da leitoa.

4 - Cuspa na cara do atendente do guichê do INPS e fique sorrindo pra ele, como um retardado, esperando pra ver se ele também vai achar graça.

5 - Entre pelado numa missa solene (a Missa do Galo ou uma missa de sétimo dia, por exemplo), correndo pra lá e pra cá _ saltitante e festivo como um esquizofrênico em êxtase _ cheio de pulinhos e gritinhos deslumbrados, sacudindo os genitais.

6 - Quebre o taco de sinuca na cabeça da mulher do dono do bar, só pra ver o que acontece.

7 - Brinque de dar sustinho, desses que arriscam causar parada cardíaca. Por exemplo: saia a altas horas da noite, vestido com uma capa ou casacão comprido, com um chapéu caído sobre a cara. Escolha uma rua de pouco movimento e esconda-se numa sombra. Espere até que passe por ali alguma mulher (não muito jovem, nem velha)... A qualquer momento a vítima ideal haverá de aparecer... No momento em que ela estiver passando por você, saia da penumbra; dê três lentas passadas a frente e pare, todo esquisitão _ faça-o no bom estilo hollywoodiano: você é o psicopata frio, sexualmente traumatizado e que adora mulher (empacotada em pedaços no frizer). Quando ela tiver se distanciado uns 10 metros, comece a acompanhá-la, mantendo a distância por algum tempo. Sussurre algumas frases delirantes, entre os dentes, tipo... “Implacável é a ira do Senhor! cadela promíscua!!” Ela entenderá que está na presença dum maluco convulsionado por alucinações misóginas... Mantenha o controle do tempo cênico, a pulsação dramática do enredo. O ritmo é primordial na criação dum estado psicológico dark _ ou gótico, como queira. Você estará usando um sapato de solado duro, que produza aquele eco sinistro no silêncio da noite _ aquele ‘toc-toc’ que começa estranhamente lento e vai se acelerando à medida em que a vítima vai se dando conta de que o que está acontecendo ali é, de fato, uma caçada humana... Quando ela se virar pra ver qual é, saque do casaco um facão encharcado de molho de tomate e branda-o no ar. Grite com uma voz disforme e enfurecida: “Eu vim buscar a sua alma, vagabunda!!!” E solte uma gargalhada podre... Mulher não é um bicho feito pra correr; mas você controlará o riso e a fará correr até cagar sangue. Isto se ela não estragar a brincadeira, desmaiando logo no primeiro momento.

8 - Teste sua inteligência e sagacidade com atos de terrorismo e sabotagem, pra ver até quando consegue debochar da polícia. Jogue LSD no reservatório de água da cidade (um copinho do produto puro dá pra deixar trezentas mil pessoas alucinadas!).

A eletricidade _ incompreensivelmente negligenciada até hoje, mesmo pelos terroristas mais habilidosos _ é, sem dúvida, um recurso poderosíssimo, disponível a qualquer levadinho que queira extravasar sua revolta com a vida. Após a leitura de um ou dois manuais, você estará apto a criar as mais inusitadas armadilhas elétricas. Use capacitores de alta tensão, ligados em série, ao invés de tomadas. Ponha um pouco de luz em sua vida, eliminando alguns elementos perniciosos à sociedade. Seria proveitoso começar com alguns políticos de sua cidade. Mate também aquele babaca que não te passava a bola de jeito nenhum nas peladas de quinta à noite. Mate aquele seu colega de trabalho mais experiente que sempre te escondeu jogo e jamais te deu uma boa dica no serviço. Mate aquele médico do INPS que te tratou como um pedinte inoportuno. Mate aquele seu vizinho que soltou um foguetório quando o seu time perdeu a taça. Caso venha a tomar gosto pela brincadeira (o que eu acho muito provável), aproveite o embalo e preste um relevante serviço à nossa tão combalida pátria: esturrique o presidente da república, aquele mascate filho-da-puta; leve-o pro inferno junto com você, quebra esse galho!.. Enfim, mostre o seu refinamento, seu gênio estratégico, sua capacidade de surpreender. Divirta-se!

9 - Vá à exposição de algum sagrado babaca da pintura, munido de um estilete. Memorize bem a posição das obras que mais marcaram o século; estabeleça o roteiro e então parta pro ataque, gritando e retalhando os quadros, com o frenesi histérico dum endemoninhado... Depois, justifique-se na delegacia dizendo que aquele estrago medonho que você acabou de causar era... “uma performance artística”, “um lance muito show” _ e exponha filosoficamente os fundamentos teóricos do seu ato, usando vocabulário de bicho-grilo, cheio de intimidade com o “seu delega”. Diga-lhe, vibrando: “Foi uma experiência OR-GÁS-MI-CA, maluco!.. um lance dimais mesmo, sacô mano véi?!!”, e pergunte se ele também já não experimentou esse mesmo tipo de transe, essa “osmose psicodélica com a essência primordial da Ira”, espancando marginais ali na DP. Assevere-lhe, cheio daquelas gesticulações teatrais de carinha libertário: “É uma catarse muiiinto looôca, caaara!!”

10 - Faça uma experiência de Sociologia Aplicada sobre o pânico e a histeria de massa: entre numa grande loja de departamentos lotada e comece a atirar com um revólver de espoleta, rosnando, de olhos esbugalhados, movimentando-se como um bicho confuso e acuado; louco, incoerente, chorando e gargalhando ao mesmo tempo, dando ataques! _ como naqueles surtos terminais de desatino que você já viu no cinema, quando o cabra alopra de vez e parte pro tudo ou nada, sem se importar com as conseqüências. Mastigue umas pastilhas efervescentes e saia em perseguição à turba desarvorada, espumando como um cachorro doido. Pra que sua atuação seja realista ao máximo, concentre-se devidamente antes de entrar em cena. Use o método dos grandes atores da teledramaturgia mexicana: feche os olhos e respire fundo; imagine-se invadido por uma idílica luz azul, acompanhada do concerto no.22 de “As Quatro Estações” de Vivaldi (aquela: “tantan-tararan-tantan-tan”. Imagine que o revólver é de verdade e que você realmente tá ali pra fazer um massacre _ coloque seu coração nisso! Ponha-se na pele de um daqueles maníacos retardados made in USA. Traga à mente tudo quanto é tipo de paranóia que você já viu na vida e no cinema, e tente absorvê-las, incorporá-las, todas ao mesmo tempo, com todas as mínimas e complexas sutilezas d’alma. Mentalize:

A – (Síndrome do comunista rancoroso e complexado) – “Eu almejava ser um novo Lenin, um condutor dos povos, mas fui obrigado pelo ‘Sistema’ a acabar num mísero empreguinho, lustrando o chão da rodoviária. Às vezes me flagro orgulhoso em ver o pavilhão número 6 (o meu preferido) limpinho e brilhoso, como se isso fosse uma realização digna de um homem!.. Mas a Revolução não morreu dentro de mim! Ah, isto não!! Desse jeito é que eu não fico mais. Não vim ao mundo pra viver chupando o cabo do esfregão à troco da glória de acabar meus dias como um patético mártir doméstico! Vou partir pro esculacho! Não vai sobrar nada no lugar, e ninguém vai sair inteiro deste maldito templo de consumismo burguês!”

B - Mantenha a respiração profunda: “Sou um ex-fuzileiro que passou a vida inteira vibrando com mil lendas de bravura em combate, achando-me um bravo (como aquele menino que ganhou uma fantasia do Batman) sem jamais ter entrado em confronto direto com algo mais ameaçador que um inseto doméstico. Meras farofas ao vento! Eu... que sempre me vi como um guerreiro!.. Mas hoje o bicho vai pegar pra valer! Tudo ao vivo e a cores; com pólvora, chumbo e sangue de verdade. Quero morrer como um bravo; atirando e cuspindo fogo pra tudo quanto é lado! Só assim salvarei minha honra de bárbaro: apavorando e fazendo neguinho tombar que nem pino de boliche, numa seqüência alucinante! Daqui a dez séculos as pessoas ainda se lembrarão de mim e de meu feito imbatível, ao folhearem o Guiness Book.”

D - Concentre-se. Dentro de sua cabeça oca há uma orquestra sinfônica executando a abertura d’A Floresta Negra, de Stravinsky, no último volume! e um coral de vozes macabras que o incita à destruição total. Turibulosus zigomaticum! Turibulosus zigomaticum! ( * [Lat.] - apavora, maluco! ).

E - “Papai nunca me deu uma Harley Davidson!”

Imerso neste clima dramatúrgico de denso lirismo e ludicidade... alimentado por esta exótica salada de nóias e neuras... pronto! é só partir pra esculhambação. Atue com arrojo e perversidade; não deixe por menos! Seja descabido, desavergonhadamente escandaloso. Uma boa dose de descaramento é fundamental pra que a apoteose se dê em grande estilo. Goze até as últimas conseqüências esta sacanagem genial que é deixar mil e quinhentos babacas em estado de choque, afrontados com a morte pelas mãos de um relés débil mental, dodói dos nervos. Saia quebrando vitrines, derrubando prateleiras, decapitando manequins, rosnando e uivando, com aquela fisionomia característica, consagrada nos filmes, que é um misto de fúria, volúpia e confusão total das idéias. De vez em quando grite alguns clichês de neurose de guerra, tipo: “Os vietcongs estão chegando!!!”, ou então: “Bem vindo ao inferno, Jack!” ou ainda: “Elvis Presley não morreu!” ... “God Save the Queen!” ...

11 - Faça um buraco redondo na calça, de 15 centímetros de diâmetro, deixando o meio da bunda a descoberto. Afixe-se com esparadrapo uma argola entre as nádegas, de modo a arreganhá-las bem, expondo a tarraqueta pra quem quiser ver. Coma o que agüentar de feijoada batida com repolho, batata doce e ovos. Chupe umas laranjas e beba cachaça. Tome uma dose cavalar de algum laxante poderoso. Saia então pelas ruas, passeando contente e faceiro, como quem acha a vida muito linda. Abaixe-se pra amarrar o sapato e escancare despudoradamente o frosquete sempre que um grupo de marmanjos começar a mexer com você. Quando o laxante já tiver surtido efeito, eleja um transeunte que se mostre vestido muito caprichosamente ou que ostente ares de importância; vire-se repentinamente e lhe dê um beijo de cu acompanhado de uma cagada nas pernas. O sujeito, naturalmente, terá o reflexo de se afastar aos pulos... mas continue a perseguição a qualquer custo, de ré, peidando e cagando.

Vá até uma praça e observe os velhos sentados nos bancos. Escolha um com cara de quem foi mau no passado; chegue por detrás e solte uma vigorosa rajada em sua nuca. Quando passar por perto algum carrinho de bebê, aprochegue-se com aquele sorriso de ternurinha abobada e diga: “Ai meu Deus, mas que dendém mais bussessudo!” A mãe certamente lhe retribuirá com o mesmo sorrizinho besta. Como não tem visão de raio-X, ela nem imagina que o seu cortador-de-merda tá escancarado e latejando como um monstro de ficção científica... Pergunte: “O dendem qué tocolate, qué?.. Intão ispélaí...”. Olhe subitamente pra mulher com um olhar arregalado, como quem sentiu um treco doido por dentro ou engoliu um caco de vidro. Coloque as mãos na cabeça, ponha-se a gemer, grunhir, grasnar, fazendo tudo quanto é tipo de cara _ de desespero, de envenenamento, de bicha deslumbrada, de arreganho medicamentoso, de quem tá virando monstro... sempre gemendo. Então desabafe a sua agonia com um gritinho agudo de alívio e afogue o monstrinho em chocolate quente. Se o velho ou a mãe da criança acharem ruim, cague na mão e ameace jogar na cara: “Oóia, qui eu tô cum gonorréia no duodeno!!”

Vá a um barzinho da moda. Escolha um casal recém-apresentado (dois periquitinhos em pleno ritual de sedução) e colabore com o clima: poste-se à beira da mesa com aquele charme felino da Miss Bumbum de Ipanema e metralhe o chope dos meninos com um vendaval de caganeira. Cague em quem puder, inclusive na cara do primeiro vira-latas que vier cheirar seu rabo.

12 - Estrague uma solenidade de formatura dando um ataque de bicha-louquice demencial. O negócio é se divertir! Espere calmamente o desenrolar da cerimônia; saboreie pacientemente toda a comédia, os sorrisos, o ufanismo inhonho, que enfim culminará num momento de inefável embriaguez sentimental (a ponto de serem _ todos os presentes, você exceção _ capazes de verter lágrimas de sangue caso lhes seja lembrado o mal que praticaram, durante toda a vida, contra nossas irmãs moscas, baratas e formigas). A insólita mistura de mimos e insanidades sendo declamada ao microfone da maneira mais descarada... O momento é de vitória! e tudo será feito pra se exagerar as dificuldades e percalços quase que intransponíveis que tiveram que ser vencidos pra se chegar até ali; os méritos e qualidades desses moços e moças; a ascendência hierática sobre os muquiranas do proletariado, que a posse do canudo lhes está outorgando neste momento (e as graves responsabilidades humanísticas daí advindas). Ficções, ficções, ficções... E lá está um dos felizardos, extasiado dentro dum camisolão medieval. Ele discursa, embargado pela bobice. É a hora da Gratidão dentro do cronograma; de se tecer loas à abnegação dos papais, ao fervor dos mestres, ao capricho das faxineiras _ até pro capeta é possível se achar palavras engrandecedoras neste momento. Tudo é permitido!.. E lá vem outro pássaro pra alugar seu ouvido novamente, com outra xaropada ainda mais nauseabunda.

É agora! Levante-se do meio da platéia, dando ataques, e saia atropelando as cabeças, truculentamente, gritando, caindo, tropeçando, batendo com a testa, pulando de fileira em fileira, até chegar ao palco. Então redobre os chiliques. Agrida o orador, os padrinhos, as cortinas, os arranjos de flores... Grite ao microfone, em falsete: “Paulão, eu não posso viver sem você!!!” Mostre-se a todos um autêntico pobre-diabo, louco e bicha. E depois de fazer muito escândalo e estrebuchar bastante gritando pelo Paulão, deixe-se carregar, babando, com um sorriso de Hebe Camargo na cara. Este é o verdadeiro sabor da liberdade!

13 - Depois de tanta diversão, será muito improvável que você ainda queira levar adiante sua idéia de suicídio. Você terá descoberto o sentido de comédia da vida. Com a alma deliciosamente leve e desanuviada, você perceberá que atos dramáticos não fazem o menor sentido. Pra que a precipitação? se uma eternidade inteira do mais perfeito sossego vos aguarda. Nada debaixo do Sol (nem acima) merece muita ponderação. Faço votos de que estas conclusões libertadoras lhe sejam úteis, quando terminar de puxar trinta anos de cana depois de ter feito tanta merda!


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