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Artigos-->Bolivia: Collas x Cambas -- 11/06/2005 - 00:56 (Vitor Gomes Pinto) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Bolívia: Collas x Cambas

Vitor Gomes Pinto

Escritor. Especialista em Relações Internacionais.



Evo Morales, o deputado e líder aymará dos produtores de coca de Cochabamba e do MAS – Movimiento al Socialismo, acha que é chegada a sua hora de tomar o poder. Uma vez mais paralisou a Bolívia, bloqueando as estradas nas montanhas e nos acessos aos vales, atividade na qual é um notório especialista, até forçar a segunda e por certo definitiva renúncia do presidente-substituto Carlos Mesa, que tem o mesmo destino de Sánchez de Lozada (de quem foi o vice). Sem ter força suficiente para impor-se, Evo joga pesado na desestabilização de um governo que também já não consegue liquidá-lo. “Não vamos permitir que partidos como o MIR (de Vaca Díez, o presidente do Senado) e o MNR (de Mario Cossío, presidente da Câmara), acostumados a saquear os recursos do estado boliviano, regressem ao poder”, declarou, ao ordenar a seus seguidores a marcha para Sucre onde tentaram mpedir o Congresso de reunir-se para decidir quem seria o novo presidente, mantendo assim a instabilidade plena. Caso consiga concretizar seu projeto de mando, é muito provável que o resultado seja a radicalização das posições e o confronto entre índios aymarás e quéchuas do Altiplano (os Ocidentais ou Collas) por um lado, e os “brancos” da planície (os Orientais ou Cambas) de outro.

Quando os mineiros saíram das montanhas para se juntarem aos indígenas e militantes de esquerda nos bloqueios e passeatas que se sucedem interminavelmente, trouxeram em baixo do braço um artigo de uso comum em seu dia-a-dia: bananas de dinamite, divertindo-se ao explodi-las pelas esquinas de La Paz. Já nem sabem bem pelo que pressionam, mesmo porque Mesa já havia cedido a todas as reivindicações sem conseguir satisfazer as várias correntes que se opõem entre si. Na parte alta da Bolívia vive 60% da população, em La Paz, El Alto e nos Departamentos (equivalem aos estados brasileiros) de Cochabamba, Potosí e Oruro, onde se concentram os descendentes dos Incas. Os Collas seguem as palavras-de-ordem do MAS, pela nacionalização dos hidrocarbonetos e por um Estado de bem-estar no qual um governo forte daria emprego a todos com o dinheiro do gás. Chamam de fascistas os Cambas de Santa Cruz que, com o apoio dos Departamentos de Beni, Pando e Tarija (neste estão as principais jazidas), lutam pelo direito de exportar o gás e pela autonomia, sonhando com um país onde “cada um ande pelo seu lado, pois assim ninguém se estorva”. No meio dos dois blocos está Chuquisaca (sedia a capital oficial, Sucre), com pouco menos de 7% da população e possível fiel da balança de vontades e opiniões tão discrepantes. Os orientais “crucenhos”, que nunca conheceram a civilização Inca e só recentemente se desenvolveram economicamente, acusam os ocidentais de gastarem o tempo com passeatas, de odiarem quem não possua um sobrenome aymará ou quéchua e de não trabalharem, sugando o sangue de quem produz. Santa Cruz está longe de ser rica, mas apresenta uma situação financeira muito superior à do resto do país.

Não há, portanto, acordo em relação a uma nova Constituição nem sobre o referendo sobre a exportação do gás, ambos sob suspeita de servirem a escusos interesses do grupo oposto, seja ele qual for. Por exemplo, seguidores do MAS preferem uma aliança com Brasil, Venezuela e Argentina, nunca com o Chile que seria uma ponta de lança dos interesses norte-americanos na região. Com tantas discordâncias, agora todos se unem pela antecipação das eleições, mesmo sabendo que esta não será uma solução, apenas adiando um pouco mais a latente explosão. Morales mostrou que não aceita outro resultado que não seja a sua vitória, ao declarar que “Vaca Díez representa uma máfia política e as oligarquias de Santa Cruz, que só pedem as autonomias regionais”, enquanto seu desafeto mais radical e também líder aymará Felipe Quispe é mais sincero ao dizer que o caminho é a guerra civil para decidir quem manda e quem obedece na Bolívia. A Igreja, com o cardeal Julio Terrazas à frente, mediou o conflito iminente e aconselhou Díez e Cossío a não assumirem, abrindo a vaga para Rodríguez Veltzé da Corte Suprema, afinal escolhido como novo primeiro mandatário com a única função de convocar eleições presidenciais, que ocorrerão até dezembro próximo.

A democracia boliviana resiste desde 1982 quando Hernán Siles Suazo do MNR foi empossado pelo Congresso após vencer as eleições de 1980 e ser impedido de assumir por dois golpes sucessivos. O país recentemente perdeu todos os grandes líderes (Suazo, Lechín e, em 2001, Banzer e Estenssoro) que o comandaram nos últimos 50 anos e ainda não encontrou substitutos. Diante do caos e da falta de perspectiva para solucioná-lo, e principalmente pela escassez de tudo na capital e nas cidades bloqueadas, cada vez há mais adeptos da solução militar. Seria um novo banho de sangue e as Forças Armadas por enquanto fogem dessa idéia com o diabo da cruz, preferindo que os políticos se entendam. Como disse Frank Falcoff do Instituto Americano para Pesquisas de Políticas Públicas, as repúblicas em geral não se suicidam, mas a Bolívia pode ser uma exceção e se as tendências atuais se mantiverem poderíamos testemunhar a primeira alteração significativa do mapa político sul-americano em mais de cem anos de história. Rodrígues Veltzé, o novo presidente, é um advogado de 49 anos nascido em Cochabamba, ou seja, no Altiplano, que fez carreira na Corte Suprema de Justiça desde 1999. Os bloqueios já estão sendo levantados. No momento, Evo Morales é candidato único. Vencedor, enfrentará a secessão oriental. Perdedor, retomará os bloqueios, se puder. Pobre Bolívia.



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