Coisas do Enrico
Maria da Graça Almeida
Creio que as crises de ciúme nas crianças sejam ainda mais dolorosas do que nos adultos. Se os ditos amadurecidos não sabem lidar com os incômodos de tal sentimento...imaginem os pequenos...
Com a chegada de um irmão, sempre o mais velho sofre e percebe que precisa lutar pelo lugar que ocupava antes, deseja reconquistá-lo. Mas lutar? De que maneira? Com as armas que possui, oras, manha, irreverência e toda sorte de façanha que chame a atenção dos pais, dos avós, da professora, até mesmo deixar-se cair e sem dor chorar a "todos os pulmões"; voltar a fazer xixi na cama; pedir de novo a chupeta já abandonada. Ou, ainda, querer livrar-se da presença do estranho ser, apesar do afeto que o ciúme faz por encobrir.
Não pude resistir, registrei...
Enrico curtiu muito a gravidez da mãe, vivia dando-lhe beijos na barriga .
O irmão, lá dentro, longe de sua visão, não lhe representava nenhuma ameaça.
Escolheu seu nome, Eduardo, e parecia curtir sua chegada.
Quando nasceu o menino, Enrico percebeu que o bebê ocupou, da mãe, o colo, o tempo e os olhos, que anteriormente eram apenas seus.
Um ciúme indisfarçável veio tirar-lhe a calmaria.
Ao voltar para casa, depois de um jantar na casa do avô, Enrico perguntou a Marcela
- Mãe, o Lucas e a Beatriz são irmãos?
- Não, filho, são primos.
- O Lucas tem irmão?
-Não, não tem.
-Também não quero mais ter irmão, mãe.
-E agora? Você já tem o Eduardo!
Enrico calou-se por uns instantes e depois:
-Ah, mãe, você vai ter que engolir ele de novo!
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