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Erotico-->5. O ENCONTRO, FINALMENTE -- 23/07/2002 - 07:15 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Todo dia, Nepomuceno ligava ao hospital para receber novas sobre o estado de saúde de Virgílio. Tratava-o já com certa intimidade, tendo em vista os conhecimentos subjetivos de sua personalidade que inferiu das cartas legadas pela esposa.

Não querendo apressar o ingresso no seio do corpo dos trabalhadores do centro, aguardava o restabelecimento do amigo, para por ele ser introduzido, segundo orientação precisa da esposa. Enquanto isso, ia dilatando o cabedal de conhecimentos espiríticos, através das amplas leituras que ia realizando. Não se conteve em investigar a origem e a história do espiritismo. Enfronhou-se na teoria e na moralidade e, a pretexto de aperfeiçoamento, dirigiu-se à sede da organização central do movimento e retirou de lá cópias dos documentos necessários para a instalação física da entidade. Conhecia bem o roteiro dos contratos, de modo que lhe foi café pequeno inteirar-se dos procedimentos no setor. Ficou, assim, sabendo que qualquer cidadão poderia requerer registro de funcionamento, bastando declarar nomes e endereços dos diretores e a finalidade da instituição. O mais caminharia em função das diretrizes eventualmente propostas pela diretoria e segundo o nível de aspiração dos componentes. Imaginou logo a preponderância dos que se dispunham a trabalhar com o plano espiritual, mas não deixou de observar que a parte relativa à benemerência material era bastante significativa.

Com todos esses conhecimentos técnicos da organização, pensou que, de início, iria ter de se relacionar com os setores de assistência social, para o que dedicou especial atenção às leituras de cunho prático. Destinou verba para o auxílio financeiro, mas não se precipitou a entregar logo.; antes queria sentir até que ponto os melindres poderiam ser afetados com a ostentação de seu gesto.

A par desses aspectos materiais, ia desenvolvendo as leituras também no sentido de conhecer os tipos possíveis de contato com o plano da espiritualidade. Ao conhecer as obras de André Luís, ficou empolgado com a maravilhosa organização da colônia de agasalho dos enfermos da alma, bem como se deslumbrou com a possibilidade de tudo, no etéreo mais próximo da crosta, apresentar complexidade muito maior relativamente às leis que regem a natureza física. Atrapalhou-se muito com os arrevesados conceitos de No Mundo Maior, embaralhou-se com os de Mecanismos da Mediunidade, julgou Ação e Reação extraordinariamente difícil e não conseguiu terminar a leitura de Evolução em Dois Mundos. Mas Desobsessão deu-lhe integral noção dos deveres de simples trabalhador braçal do mediunismo, etapa primeira de crescimento na doutrina.

O nosso amigo lia rápido, pois não tinha outra preocupação, além de receber os dividendos das ações. Até a administração dos bens estava entregue a idônea firma pertencente ao filho do meio, de sorte que essa fase da vida prometia sossego para todos.

Mas a recuperação de Virgílio era lenta. O socorro do outro dia salvara-lhe a vida, dada a presteza do atendimento. Do ponto de vista espiritual, verdadeiramente, poder-se-ia dizer que a vida lhe estivera por um fio, tênue ligação mantida a custo por hábil equipe socorrista, sob sustentação energética de grupo especializado comandado pela figura de Rosaura (Josineida), como fez questão de registrar na famosa carta-testamento.

Trouxemos, de propósito, o caro leitor à presença desta enigmática personagem, para não mais lhe prolongar a expectativa a respeito da leitura efetuada pelo marido das narrativas contidas nas páginas manuscritas e que representavam, na verdade, comunicações do etéreo reveladoras de vidas pregressas, envolvendo dois seres na voragem dos sonhos e quimeras de amor universal. Mas as fantasias cediam à realidade e, a cada novo contacto no plano da carne, novas desilusões e desesperos. As informações do íntimo relacionamento, terno e sadio, remetiam tão-só à espiritualidade quando o casal combinava reencontros proveitosos, no intento do progresso conjunto e para agasalho de enorme fileira de espíritos endividados, prontos a se reabastecerem de amor no “conjugo vobis” do casal. Mas os dramas na Terra se sucediam e, quase sempre, por incompreensões mútuas, a união não se concretizava de modo absoluto, no sentido de cumprir-se a programação estabelecida.

Todas as comunicações eram assinadas pelo mesmo espírito protetor, mas havia enorme dificuldade de se reconhecer como sendo sempre o mesmo o espírito comunicante, dadas as variações de estilo e caligrafia. Dir-se-ia que eram várias pessoas escrevendo ou, se se preferir estimar o fenômeno espiritual, vários escreventes para diferentes entidades. Mas havia harmonia na citação dos nomes e coerência na apreciação dos eventos, de modo que Nepomuceno não pôde configurar com a necessária precisão a natureza das mensagens. Imaginou que pudessem ser a expressão da verdade, principalmente pela fé depositada nelas pela esposa, muito experiente no trato com os espíritos, contudo, por prevenção adquirida pelas leituras que desenvolvia, não se considerava hábil no conceituar desse tipo de argumentação. Deixaria para ouvir a voz experiente do amigo em restabelecimento.

Ia por aí a vida de nosso amigo, quando recebeu telefonema do próprio Virgílio, que o convocava a ir visitá-lo no hospital. Estava para receber alta médica, mas necessitava matar a curiosidade a respeito do esposo muito amado da companheira de aventuras espíritas. Trouxesse todo o material que o horário das visitas poderia ser dilatado a seu bel-prazer, tal a liberdade de que privava no antegozo da soltura. Viesse rápido.

Nepomuceno agradou-se da voz grave que lhe chegava aos ouvidos, da espontaneidade da manifestação, da precisão das palavras e da engenhosidade dos pensamentos, de modo que, naquela manhã mesmo, rumou todo apetrechado para o encontro.

Informado do número do quarto, não foi com pequena emoção que subiu as escadas para o segundo andar. Se pelo esforço da locomoção, se pela ânsia do encontro, a verdade é que, diante do leito do amigo, perdeu o poder da fala. Ali estava respeitoso senhor, de longas madeixas brancas, com idade suficiente para ser seu pai. Esperava alguém vibrante de mocidade, avistava-se com senilidade radiante de frescor.

Recebido com o sorriso mais terno e acolhedor, foi convidado a sentar-se ao lado da cama. Antes de se falarem, ficaram longos dez minutos calados.; Nepomuceno para acalmar-se e serenar o coração desarvorado pela novidade.; Virgílio em oração, renovando íntimas solicitações para apresentar-se do modo mais correto, para não perder para o espiritismo aquele trabalhador prometido pela amiga.

Foi Virgílio quem abriu a conversação:

— Então, caro amigo, finalmente tenho a honra de conhecê-lo pessoalmente, pois de fama a cara esposa me deu amplos conhecimentos. Se lhe disser que o esperava com ânsia e temor, acredite. Seja bem-vindo ao “Amor Divino”, pois, pelo que sei, você veio para ficar.

Nepomuceno apreciou sobremodo a recepção. Nada de perguntas indiscretas sobre a correspondência.; nada de querer saber a respeito da saúde, através das formalidades sociais de quem não se interessa pelo companheiro. Cartas na mesa, jogo limpo e direto. Virgílio era dos dele.

— Saiba que os meus sentimentos com relação ao senhor não teriam sido melhor descritos. Desde que tomei ciência da vontade de minha esposa, não via o momento deste encontro. Devo dizer que o imaginava mais jovem, talvez com a minha idade (cinqüenta e dois), mas a alegria de vê-lo tão bem disposto me conforta e me dá a certeza de que nosso relacionamento se entretecerá por força da vibração de Josineida.

Nepomuceno não era pessoa de muito falar, por isso estranhou que estivesse manifestando-se com tanto vigor e entusiasmo. Percebeu que empregara alguns termos do jargão espiritista e se espantou com a naturalidade pela qual o fizera.

Virgílio quis saber o que achara da turma do centro, dos trabalhos a que assistira e da expectativa de poder integrar a equipe.

O notário respondeu com desenvoltura e confiança e a conversa seguiu até que todo o material legado pela esposa foi passado para a experiente análise do encarcerado da enfermidade. Preso ao leito, teria oportunidade de ler e ponderar a respeito de tudo, especialmente sobre as dúvidas suscitadas pelo neófito da interpretação e exegese dos textos mediúnicos, quanto à possibilidade de mistificação e engodo.

Virgílio reparou nos cuidados do notário e estranhou que tal dúvida não lhe tivesse surgido nunca diante das maravilhosas manifestações espirituais a que dava curso no centro a boa Josineida. Não quis adiantar os elogios nesse setor do relacionamento com a esposa do amigo, mas ficou de sobreaviso para possíveis revelações do plano espiritual.

Já adentrando a noite, combinaram para a semana seguinte novo encontro, para o que deveriam antes entrar em contacto telefônico, pois, possivelmente, iriam ter de se ver na residência do convalescente.

Naquela noite, Nepomuceno dormiu pouco e mal. Sonhou com hospitais, com duendes e com vampiros. Sentiu-se indisposto e levantou-se para passear no escuro, no pequeno jardim do prédio. Era hábito antigo de quem levava os problemas da profissão para casa. Mas era meio seguro de tranqüilizar-se.

Pela madrugada, subiu, sentou-se na poltrona preferida, acendeu o abajur direcionado para o livro e começou a leitura de nova obra de André Luís: Conduta Espírita.

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