No Chile há muitos poetas. Não conseguia, eu, compreender o motivo de tal concentração, até quando, num hotel de Santiago, onde a janela abria-se, despudoradamente, para a magnitude das Cordilheiras, entendi! Envolvida por certa magia e estranha fantasia,consegui descobrir no perene espetáculo, a abundância da fonte de onde flui a inspiração do chileno. Aí não tive saída, vigiando minha respiração, que já pressentia ofegante, larguei-me a escrever, olhando pela janela, como se mirasse um quadro revelador das fronteiras do alumbramento e do limiar da alucinação.
Cordilheira
Pós- sinto as pegadas dos deuses (latinos?) pousando os pés divinos sobre terras elevadas, virgens meninas despenteadas. Se uns o fizeram sutilmente, outros calcaram, de forma tal, o chão, que o viram, entre um passo e outro, subir em altos picos, em duros bicos.
Meus olhos vagam pelo espaço alongado, recortado , sinuoso... Galgam íngremes montanhas e, vertiginosamente, despencam em quedas livres e fatais. Depois, dão-se a escorregar e deslizar em pisos lisos, ou, a rastejar, arranhando-se na aspereza da textura visual.
Quando, dos anjos meninos, o sopro cálido derreter o frio espesso e alvo que se moverá, graciosamente, sobre a austeridade do marrom, meu ser todo frágil, tolo e perplexo, suspirará ante o imensurável espetáculo do perpétuo bolo achocolatado coberto por um branco e absurdo glacê, que lindamente escorrerá desenhos abstratos e fantásticos, jamais consumidos por simples mortais.
Às vezes os Deuses sabem ser cruéis! Muitos deles zombam da impotência dos homens. Outros lhes testam o tamanho do conformismo. Nem tudo que fartamente lhes expõem aos olhos, facilmente lhes dispõem às mãos.
Maria da Graça Almeida
Maria da Graça Almeida
ma.gla@uol.com.br
texto publicado Antologia Lira de bronze
e na revista Fresta
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