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Artigos-->Nós [os americanos] não fazemos senão promover distúrbios -- 28/09/2001 - 16:39 (José Pedro Antunes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Gore vidal, escritor e polemista, fala sobre seu maior inimigo: o governo americano, em entrevista concedida a Wolfgang Höbel e Marianne Wellershoff (Der Spiegel online, 24/09/2001) e traduzida por Zé Pedro Antunes para os autores/leitores do site literário ‘usinadeletras.com.br’.





kulturSPIEGEL: Mr. Vidal, o senhor alertou muitas vezes para o fato de os Estados Unidos estarem desempenhando o papel de polícia mundial e de que esta política não poderia ficar sem terríveis conseqüências. Sente-se justificado em suas razões?



Vidal: Sim, e não me alegre nem um pouco com isso. A gente prediz alguma coisa para evitá-la. Sempre fui da opinião de que a ingerência na política interna de outros países, esta duradoura e mais ou menos secreta instalação ou deposição de governos, vai se voltar contra nós. Há um ano, fiz um discurso no Capitólio. Mirei para fora da janela e disse: Felizmente, não hei de vivenciar coisas assim, mas tenho certeza de que alguns de vocês haverão de ver o Pentágono em ruínas. Eu não tinha a mínima idéia de que isso aconteceria em tão pouco tempo.



kulturSPIEGEL: Para o praticante do atentado de Oklahoma, o senhor concedeu “senso de justiça”. Para os terroristas de agora, o senhor teria também alguma compreensão?



Vidal: McVeigh foi educado na mesma tradição americana em que eu fui educado, e todos os outros também: O governo não é nosso dono. E ele não tem a permissão para atacar o próprio povo, menos ainda com o uso de meios militares. Mas exatamente isso aconteceu em 1993 em Waco, onde havia se imolado a Seita dos Davidianos. Naturalmente, eu nunca faria o que McVeigh fez, mas eu entendo seus motivos. Não conheço nenhum árabe, mas posso imaginar que o embargo ao Iraque ou o apoio à dura política israelense contra os palestinos deva ter deixado algumas pessoas bastante iradas.



kulturSPIEGEL: Nas manchetes de capa dos jornais americanos, se lê que, com as duas torres do World Trade Center, a liberdade também teria sido arrasada. Acha isso razoável?



Vidal: Sim, mas diferentemente do que os autores, como é de se supor, pensavam. Acredito que, em conseqüência da crise atual, os direitos básicos dos cidadãos americanos serão restritos, e que caminhamos para um Estado policial. Foi Bill Clinton quem deu a partida, com seu programa antiterror, instalado depois do atentado de Oklahoma em 1995. E agora o Congresso conferiu ao Presidente George W. Bush uma lista inteira de atribuições de poder. Uma única deputada votou contra – com o argumento de que Bush já teria poder suficiente em suas mãos.



kulturSPIEGEL: Quais restrições das liberdades individuais o senhor receia?



Vidal: Todo aquele que queira adentrar um avião será tratado como um criminoso: despido, revistado. De resto, espero intervenções na vida privada, e isso, aliás, de forma claramente mais enérgica do que elas de qualquer forma já têm acontecido. O governo vai nos observar, a todos, de forma muito mais aguda.



kulturSPIEGEL: O ataque mostra, na verdade, que o medo em relação aos terroristas tinha razão de ser.



Vidal: Mas de que nos serviram os serviços secretos? A questão é se queremos de fato erigir em nosso país uma ditadura policial, com a finalidade de estarmos mais bem aparelhados contra eventuais terroristas árabes. Em cada avião, estarão sentados agentes de segurança, em cada cruzamento de rua, um militar. É isso que eu quero? Minha resposta é: não.



kulturSPIEGEL: Não poderia acontecer de muitos americanos desejarem medidas mais enérgicas de segurança, porque querem viver seguros?



Vidal: O senhor acha? Eu acredito que os meus compatriotas sejam incrivelmente irados, porque nem a CIA nem os militares os protegeram. Agora serão gastos 60 bilhões de dólares por um sistema de defesa espacial, que não passa de uma piada. O que pode esse escudo contra um avião civil seqüestrado por terroristas? Poderia nos ajudar contra mísseis Cruise, que são desferidos na Coréia do Norte. Mas estes com certeza não nos atacarão, enquanto não desferirmos um primeiro ataque.



kulturSPIEGEL: No entanto, é George W. Bush que está convencido da necessidade desta defesa anti-mísseis no espaço, um presidente eleito por uma maioria mínima dos americanos.



Vidal: Os americanos tinham de escolher entre duas pessoas, mas, na verdade, não entre dois programas. Naturalmente, agora muito mais dinheiro será injetado em armamentos militares. Mas, em última análise, esse dinheiro não flui para a América dos empreendimentos e para aquele um por cento dos cidadãos a quem eles pertencem. 80 por cento dos americanos não ganham nada com isso.



kulturSPIEGEL: Os que os americanos pensam da política intervencionista do seu governo?



Vidal: Se alguém não tem condições de manobrar a política mundial, é o governo americano. O povo americano sempre foi da opinião de que os EUA não deveriam se imiscuir, mas cuidar de suas próprias questões. Depois do ataque japonês a Pearl Harbour, 80 por cento dos americanos eram de opinião de que o país deveria abandonar a guerra. Somente os empreendimentos internacionalmente orientados têm um interesse na intervenção internacional, porque tiram seus lucros dos mercados globais.



kulturSPIEGEL: O clima deve ter mudado: 85 por cento dos americanos, de acordo com uma pesquisa do “New York Times”, opinam que os EUA deveriam usar força militar contra os responsáveis pelo ataque.



Vidal: Não é um milagre que estejam a dizer isso, uma vez que as imagens terríveis de Nova Iorque e Washington lhes são mostradas 24 horas por dia, bem pessoas urrando seu ódio diante das câmeras. A tarefa dos meios de comunicação – e da CIA – é, no momento, horrorizar os americanos e promover um grande ódio contra os muçulmanos. Devo dizer que eles fazem bastante competentemente o que faze.



kulturSPIEGEL: Na sua opinião, quem teria atribuído aos meios de comunicação americanos com esta tarefa propagandística?



Vidal: O senhor veja – a General Electric fabrica armas nucleares e, ao mesmo tempo, é proprietária da NBC, uma das maiores emissoras de televisão nos Estados Unidos. A General Electric chama isso de “sinergia”. Eu dou a isso o nome de propaganda. O objetivo é espalhar uma única forma de ver os acontecimentos: ou seja, que o terrorista Ossama Bin Laden se esconde por trás dos ataques. Caso ele, como parece, de fato seja o planejador, nós nunca seremos informados sobre isso pelos meios de comunicação americanos sobre os motivos que o levaram a esse atentado. O povo americano é levado a crer que ele seja malvado, da mesma forma como os árabes são malvados. Isso talvez seja verdadeiro para alguns, mas obviamente também é verdadeiro para alguns cristãos, pois o mundo é assim mesmo.



kulturSPIEGEL: Se Bin Laden se esconde por trás do ataque – quais motivos o senhor supõe para o seu terrível crime?



Vidal: Bin Laden é um homem rico, sua família possuía contatos íntimos com a casa real da Arábia Saudita. Ele estudou e fala excelente inglês. Portanto, não estamos tratando com um camponês bárbaro. Para um bom muçulmano, a Palestina é uma terra santa. Por isso mesmo, jamais haverá de praticar um ataque desses para cima dos judeus em cima desse solo – antes, haverá de atacar, de preferência, aqueles que dão dinheiro a Israel. Bin Laden odeia a América, porque ela apoia Israel política e financeiramente.



kulturSPIEGEL: Os Estados Unidos deveriam, portanto, se retirar da política no Oriente próximo?



Vidal: Exatamente isso. Nós ajudamos a fundar Israel em 1947/48. Era o modelo de um Estado pluralista, no qual judeus cristãos e muçulmanos haveriam de viver pacificamente juntos. Mas aí um grupo radical de judeus desenvolveu a idéia de fazer dessa terra um Estado teocrático, no qual cristãos e muçulmanos nada teriam para procurar. Isso conduziu ao conflito de hoje, e seria melhor se a América não estivesse envolvida nisso.



kulturSPIEGEL: Qual reação do governo dos Estados Unidos o senhor considera correta agora?



Vidal: Eu gostaria de citar o “Macbeth” de Shakespeare: “Fui tão longe, / Neste rio de sangue, que, a vadeá-lo, / Retroceder ser-me-ia tão penoso / Quanto ir adiante” [na tradução de Manuel Bandeira, que me foi enviada gentilmente pelo tradutor Newton Ramos, de São Carlos – SP]. Para nós, é muito difícil acionar o passo para trás. Mesmo assim, sugiro que o secretário geral da Onu, Kofi Annan, dirija-se a Bin Laden e lhe ofereça a possibilidade de esclarecer sua visão das coisas. Aí, cada qual vai poder decidir por si mesmo o que acha de sua pessoa e de suas idéias. Dêem início a um diálogo, em vez de começar um bombardeio!



kulturSPIEGEL: Está sugerindo a retirada. Mas não é verdade que muitos europeus desejam um engajamento internacional dos americanos e buscam a sua proteção?



Vidal: Ah, é? É como engajar uma serpente. Nós não fazemos senão promover distúrbios. Para nós, haveria a vantagem de economizarmos uma montanha de dinheiro. E teríamos, finalmente, tempo para nós mesmos, e poderíamos trabalhar para sermos um país civilizado.



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