A cidade das trovas (parte 2)
Sem qualidade e sem quantidade
Quando uma pessoa, um bairro, uma cidade ou um país recebe um título sem o fazer merecer, seja por falta de legitimidade ou representatividade, a nomeação pode resultar em qualquer coisa próxima do risonho. Veja o exemplo de Nova Friburgo, que foi intitulada – por decreto – de ‘Cidade das trovas’ por um grupo ligado a um braço político em ano eleitoral. O que antes poderia ser legítimo, já que Friburgo já teve grandes poetas e trovadores, resultou numa ação oportunista fora de hora sem a chancela das bases culturais da cidade. Não houve o envolvimento popular, ou campanha de qualquer espécie. O turista ocasional ou os desavisados e, quem sabe, os distraídos podem até imaginar, ao lerem esta notícia, que Nova Friburgo está infestada de trovadores e que a trova é uma prática real nas novas gerações da cidade.
Puro engodo. O título não reflete a realidade, e o que vemos é uma geração que atua em diversos ramos da arte e da cultura, como a música e a poesia, com inexperiência, com talento, com esforço, com maestria. Mas não há representatividade nem em qualidade nem em quantidade quando se fala em trovadorismo friburguense. A nova geração não foi sensibilizada, motivada ou envolvida. Percebam que estamos falando de uma cidade de 170 mil habitantes! O orgulho besta, os projetos individuais, as lideranças egoístas, os eventos trovadorescos amarrados a interesses comerciais de livrarias endividadas têm como resultado esta realidade.
Vejamos, por exemplo, o fiasco da oficina de trovas que foi realizada no Sesc, pelo trovador Sérgio Bernardo, nos dias 8, 15 e 22 de maio. Em três semanas – ou em nove horas de conversa e em 20 anos de carreira – o curso atraiu apenas 8 (oito) isso mesmo: oito jovens. Se considerarmos que um deles era de Duas Barras, a proporção ainda fica mais raquítica. O fiasco, gente, é muito pouco para sustentar o frondoso título de “Cidade das trovas”. Espero, no entanto, que essas oito sementes vinguem, e por certo, vingarão, afinal a Lei Municipal nº 3.342/03 determinou que Nova Friburgo passou a ser a “Cidade das trovas”.
A soberba é tão sintomática e esnobe que o organizador do evento justificou sua tragédia pessoal (ou a do seu curso, como queiram) citando um artigo do poeta Affonso Romano de Sant´Anna (O Globo, caderno Prosa & Verso, 7 de fevereiro do corrente ano) em que ele fala sobre a relação quantidade/qualidade. Completamente cego de si mesmo, Sérgio Bernardo chega até a frisar, em seu artigo publicado em sua coluna (literária?) na A VOZ DA SERRA: “(...) Penso, repito, que o resultado foi bom. Aliás, excelente, já que UM dos trovadores se diz mais estimulado a concorrer nos jogos florais (...)”. Falta mais humildade desses senhores ilhados numa “Cidades das trovas deles”, para perceberem os erros e, desta forma, corrigirem as direções de seus projetos.
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