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Artigos-->De verdugo a solidário, via Anchieta -- 15/03/2004 - 10:54 (Carlos Luiz de Jesus Pompe) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Faltavam poucos dias para José de Anchieta completar 20 anos quando, junto com Manoel da Nóbrega, fundou São Paulo. Anchieta nasceu em 19 de Março de 1534 em S. Cristóbal de la Laguna, nas Canárias. Aos 17 anos estava na Companhia de Jesus. Dois anos depois, chegou ao Brasil onde, por 44 anos, pregou suas crenças e acompanhou a vida da colônia. Foi, por 12 anos, professor do Colégio de Piratininga. Aprendeu com a língua dos indígenas. Escreveu a Arte da Gramática da Língua mais Falada na Costa do Brasil, instrumento de catequização dos índios pelos missionários. Enviou os primeiros missionários jesuítas ao Paraguai. Foi refém dos índios tamoios.

O conhecimento das ervas medicinais e o estudo das doenças tropicais lhe deram a fama de taumaturgo. Relatou em cartas a fundação e o desenvolvimento de S. Paulo e do Rio de Janeiro. Escreveu e encenou peças de teatro. Difundiu (dizem até que compôs) canções religiosas em português, espanhol e tupi. Fez poesias.

Em carta escrita ao Inágio de Loyola, em Roma, em setembro de 1554, contou de sua mudança para um povoado “de índios que se chama Piratininga. Isto por muitas razões: primeiro, por causa dos mantimentos; depois, porque se fazia nos portugueses menos fruto do que se devia... Por isso, alguns dos irmãos mandados para esta aldeia no ano do Senhor de 1554, chegamos a ela a 25 de janeiro e celebramos a primeira missa numa casa pobrezinha e muito pequena no dia da conversão de S. Paulo, e por isso dedicamos ao mesmo nome esta Casa”. No povoado, aplicou-se “a doutrinar estas almas” e preparou “outras mais gerações, para serem subjugados”. Anchieta escreveu em latim, castelhano e em português. Nenhum outro jesuíta, no século XVI, conheceu tão bem a geografia, a história e as condições culturais e sociológicas da população destas terras.

O ser humano é datado, histórica e socialmente. Não cabem abordagens simplistas que busquem exergir, numa determinada época, comportamentos que simplesmente não teriam correspondência em outra, com outros valores e projetos.

Anchieta escreveu, em março de 1555: “Continuamos ainda alguns irmãos nesta nossa Piratininga (que principia a ser povo de Deus) ... Estes nossos catecúmenos de que nos ocupamos, parecem apartar-se um pouco dos seus antigos costumes, e já raras vezes se ouvem os gritos desentoados que costumam fazer nas bebedeiras. Este é o seu maior mal, donde lhes vêm todos os outros. De fato, quando estão mais bêbados, renova-se a memória dos males passados, e começando a vangloriar-se deles logo ardem no desejo de matar inimigos e na fome da carne humana. Mas agora, como diminui um pouco a paixão desenfreada das bebidas, diminuem também necessariamente as outras nefandas ignomínias; e alguns são-nos tão obedientes que não se atrevem a beber sem nossa licença, e só com grande moderação se a compararmos com a antiga loucura. Donde se segue que freqüentam mais a Igreja, sofrem com mais paciência repreensões e censuras, e alguns deles, casados em legítimo matrimônio, pedem-nos com grande empenho que lhes ensinemos o modo de viver bem”.

Há que se constatar: os descobridores não chegaram ao novo continente para divulgar suas crenças. O caso desta nossa região é exemplar, até na denominação: primeiro, Vera Cruz e depois, em definitivo, Brasil, nome originário das pretensões bastante terrenas de explorar uma das madeiras aqui encontradas. Os conquistadores moviam-se pelo espírito do lucro e a Companhia de Jesus foi utilizada nesse sentido, assim como seus pregadores e pregações. Invasão e pilhagem foram as marcas dos primeiros anos dos europeus no continente. Para isso, submeteram as populações locais e impuseram seus ideários e modos de vida. Impuseram uma nova sociedade, integraram o continente ao universo europeu, destruíram as civilizações locais – seus sobreviventes hoje vagam como párias ou serviçais da sociedade oficial.

Não é a moral que move a humanidade. São objetivos bastante concretos, muitas vezes mesquinhos, a impulsionar as diferentes classes, que não raro dão provas “de verdadeira estupidez na forma de impor seus interesses”, como afirmou Karl Marx se referindo ao domínio britânico na Índia.

Dois anos antes de morrer (o que aconteceu em 9 de Junho de 1597), em Reritiba, Espírito Santo, José de Anchieta deplorou que “a maior parte dos índios, naturais do Brasil, está consumida, e alguns poucos, que se hão conservado com a diligência e trabalhos da Companhia, são tão oprimidos, que em pouco tempo se gastarão. ... Porque bem se deixa ver e os portugueses assim o confessam, que sem eles mal se poderá conservar este Estado do Brasil. E com tudo isso vai a coisa de maneira que, em caso de servir-se dos índios, cada um tem respeito a seu próprio interesse, mais que ao bem comum da terra, nem à utilização e conversão deles”.

Assim como os nativos desta terra, assim como os que aqui vieram em busca de riquezas e domínios, assim como os que para cá foram trazidos para o trabalho escravo, assim como os empreendedores, Anchieta foi um dos formadores do povo brasileiro, que naquela época iniciava sua gestação.
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