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Artigos-->Carpe Diem -- 05/02/2004 - 13:47 (Clóvis Luz da Silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Os gregos e os romanos são a referência para os demais povos do ocidente quanto à cultura, em suas mais variadas formas e manifestações. Seja na filosofia, seja nas artes, recorremos aos “clássicos” quando queremos nos “iniciar” em determinados assuntos. Foram os gregos os primeiros a especular racionalmente sobre a origem das coisas, sobre o funcionamento do Universo, sobre a “physis”. Foram os gregos que, filosofando, trataram do Belo, da natureza das coisas, do homem, enfim, da essência de tudo o que existe. Foram eles, igualmente, os primeiros a narrar as epopéias das quais participaram homens comuns, heróis, seres mitológicos e os deuses do Olimpo. E usaram a literatura para doar ao mundo as mais fantásticas aventuras de que temos notícia, relativas ao eterno conflito entre os homens e as “forças superiores”. Homero escreveu Ilíada e Odisséia. Virgílio, o grande poeta romano, escreveu Eneida. E vários outros escritores gregos e romanos deixaram os registros de uma cultura que, sendo indevido à mesma o título de superior, pode ser considerada a manifestação máxima, o apogeu da aventura intelectual do homem naquele momento da História. E tal afirmativa é pertinente quando sabemos, pelo testemunho dos registros históricos, que durante os séculos seguintes, até que a Igreja se estabelecesse como o elemento detentor das explicações sobre os mistérios da vida e da morte, a educação dos homens ricos fundamentava-se nos conhecimentos deixados pelos gregos. E mesmo os doutores da Igreja, a despeito de negarem ao povo esse direito, primavam por estudar o grego e o latim, as línguas clássicas. E não é de todo absurdo afirmar que também estudavam a literatura, a ciência e a filosofia clássica, afinal não sabemos que a Igreja detinha em seu poder alguns dos originais dos clássicos?



No auge da chamada “Idade das Trevas”, aliás uma denominação um tanto quanto injusta, na baixa Idade Média, os conhecimentos clássicos eram praticamente desconhecidos. E é injusto chamar esse período de “Idade das Trevas” porque não podemos afirmar que, à falta das explicações racionais dos gregos para o estado das coisas, ninguém usasse o intelecto para explicar a natureza do mundo. Ou, o que é mais injusto ainda, admitir que não houvesse grandes intelectos naquele período, e todos os homens fossem medíocres e limitados seres a quem a Natureza negou os caracteres genéticos de inteligência doados tão fartamente aos gênios da era clássica. O que houve foi um gradativo processo de substituição de uma visão de mundo apoiada na explicação racional e filosófica da natureza por uma outra teocêntrica, a qual, obviamente, prescindia do caráter filosófico por ser este incompatível não com a racionalidade dos doutores da Igreja, mas com as bases teológicas nas quais se fundavam os documentos eclesiásticos em questões relativas aos homens, à vida, ao mundo, enfim. Quer dizer, naquele período, o mundo explicado e dominado pela Igreja, não podia revelar homens da estirpe de Sócrates ou de Sêneca com suas inquietações filosóficas porque os grandes intelectos estavam dentro da Igreja, e eles concebiam todas as coisas com base na fé que defendiam e ensinavam. Alguém duvida que Santo Agostinho não foi um gênio? Ou que Tomas de Aquino não tenha sido dotado de um intelecto fenomenal? Claro é que as “Trevas” da fé dariam lugar à “Luz” da razão, como logo veremos.



Com o avanço do conhecimento humano e a conseqüente diminuição do poder da Igreja sobre a consciência dos homens, as amarras que impediam o acesso das pessoas aos estudos clássicos foram cedendo. O período barroco parecia estar cedendo a uma outra instância de pensamento. Foi nesse contexto de transição que alguns homens começaram a negar a supremacia da fé sobre a razão, quando, por exemplo, Giordano Brunno, um período antes, afirmava que havia entre o Homem e a Natureza um mesmo sopro de vida, uma única respiração que os igualava, Nicolau Copérnico e Galileu Galilei, que o Sol era o centro do Universo. O últimos, diz a História, negou suas teorias para não perder a vida. Giordano Brunno morreu sob o fogo da Inquisição por se negar a retratar-se perante a Igreja.



Mais adiante, um outro contexto de crescente e incontrolável avanço das técnicas de produção sob a posse de uma burguesia ávida pelo poder e reconhecimento em meio a uma sociedade ainda feudal, ainda oligárquica, ainda presa aos ditames do poder eclesial, determinou o surgimento de um ambiente propício para que alguns homens começassem a questionar não apenas esse poder eclesial como, fundamentalmente, as bases em que tal poder se mantinha. Foi dessa burguesia que, depois do século XVI, com a revolução comercial em pleno vapor, com a imprensa inventada por Gutemberg, com a Reforma Protestante estabelecida nos países da Europa, portanto com o domínio da Igreja Romana minado e questionado, surgiram homens como Voltaire, Diderot, Rousseau e Montesquieu, os quais anunciaram em seus escritos a inauguração de uma era a partir da qual a razão seria o centro elucidador para as questões que incomodavam o Homem. A essa era de supremacia da razão sobre a fé, da luz sobre as trevas, chamou-se iluminismo.



No séc. XVIII, como fruto direto desse período de “iluminação”, a literatura começa a refletir a mudança na mentalidade dos homens. Seria ingênuo supor que os escritores do iluminismo houvessem decretado, num ato solene, o fim do Barroco, passando a manifestar automaticamente em suas obras o novo modo de pensar. Sempre em um processo de transição elementos comuns a um e outro período podem existir conjuntamente, superpondo-se. É impossível falar de uma tentativa de exaltar a cultura greco-latino, no Arcadismo, sem considerar que no mesmo no Barroco, timidamente, já crescia o germe da contestação, do conflito, da dúvida, elementos que viram amadurecer plenamente séculos depois. Nem mesmo é prematuro afirmar que a incerteza do Barroco, as dores intestinas de quem, ainda preso à fé, gostaria de não mais a ela estar submetido, são provas absolutas de que do barroquismo surgiu um novo homem. Contradição? Por certo que sim. Quem ousaria questionar sua fé, admitir que o prazer do mundo é tentador, desejar que aquele sentimento de culpa inexistisse? O homem do barroco, como vemos em Gregório de Matos Guerra, não é um tipo de homem muito diferente daquele que no período áureo da dominação eclesiástica romana sequer ousava levantar os olhos para inquirir a Deus? Esse novo homem que surge no Barroco não é já um ser que gostaria de negar a existência de um Deus a quem teria que prestar contas um dia? É nesse momento que um Michelângelo, homem barroco a serviço da Igreja, ao terminar Moisés, teria dito: “Parla”. Ou seja, é um homem que se sente já capaz de criar, como Deus criou o homem, uma obra perfeita, tão perfeita que poderia falar. É nesse período que um Leonardo da Vinci, talvez sem consciência dos efeitos que suas invenções teriam no futuro, imaginou objetos que permitissem ao homem voar e mergulhar. Ou seja, é um homem que não se contenta mais apenas com os limites que a Igreja lhe impunha até então. Queria tirar os pés da terra, esta como a base única de sua existência, para ir ao céu, não ao encontro de Deus, mas para se sentir como se fora uma divindade, que tudo pode e tudo faz. Não foi esse homem, germinado no Barroco, que finalmente nasceu no Arcadismo? E mesmo o Arcadismo não manifestava já em sua produção um germe do homem romântico?



Que relação há entre Neoclassicismo e Arcadismo? Como diz o nome, o estilo neoclássico representou uma tentativa de retorno aos padrões estéticos greco-romanos, em oposição aos exageros do Barroco, ao tempo em que o Arcadismo se opunha à mentalidade barroca. Trata-se, portanto, não apenas de uma oposição estética, como também ideológica. Como podemos, então, identificar as marcas árcades, neoclássicas e do pré-romantismo nos árcades brasileiros? Para essa tarefa, é de

bom alvitre relembrarmos onde e como surgiu a escola árcade.



Em 1690 surgiu na Itália a Arcádia Romana, como reação aos exageros do gongorismo e conceptismo, com manifestas intenções neoclássicas. O próprio termo Arcádia é uma invocação à cultura clássica, pois se refere a uma região lendária da Grécia Antiga, freqüentada por aedos, os cantores, e pastores que exaltavam a simplicidade da vida em contato com a natureza. Se o barroco exagerava na forma e conteúdo, os poetas árcades elegeram a simplicidade como o ideal a ser atingido. Uma simplicidade natural, sem rebuscamentos, sem a dramaticidade e crueza do barroco. Era uma tentativa de reviver a arcádia grega, em cuja essência reinava o pastoralismo, o bucolismo e simplicidade formal e de conteúdo. Em 1756 o Arcadismo se iniciou em Portugal, com a fundação da Arcádia Lusitana. No Brasil aceita-se oficialmente o ano de 1768, com a publicação de Obras Poéticas, de Cláudio Manoel da Costa, como o de início do Arcadismo. O outro nome de vulto no Arcadismo brasileiro é Tomás Antônio Gonzaga, com sua Marília de Dirceu, de 1792.



Quais são as marcas árcades, neoclássicas e pré-românticas presentes nos sonetos de Cláudio Manoel da Costa e nas liras de Tomás Antônio Gonzaga?



Se Camões imitava Homero, os árcades brasileiros se esforçaram para imitar, na forma, tanto Camões quanto Horácio e Virgílio. Seus versos eram decassílabos. Sua poesia se mostrava equilibrada, harmônica e simples, sem os exageros formais do Barroco. Ao falar de amor, o árcade não é individualista, não se coloca na posição de um homem sobre quem recaíram todas as desgraças e desventuras, inclusive as amorosas, do mundo. Ela fala de um amor universal, que pode ser de qualquer homem, sem especificações. Por isso o árcade é impessoal, não fala de si mesmo na primeira pessoa. É objetivo, sem rodeios, sem floreios verbais, lexicais, vai direto ao ponto sem metaforismo, sem rebuscamentos estilísticos. E lança mão de figuras mitológicas, pagãs, numa nítida oposição ao estilo barroco. O trecho abaixo, da Lira II de Marília de Dirceu, mostra-nos algumas das características acima mencionadas:



“Pintam, Marília, os Poetas

A um menino vendado,

Com um aljava de setas,

Arco empunhado na mão,

Ligeiras asas nos ombros,

O tenro corpo despido,

E de Amor, ou de Cupido,

São os nomes, que lhe dão.”



Se na forma os árcades imitavam os clássicos, é no conteúdo que notamos as principais divergências entre os modos barroco e árcade de pensar. Se no Barroco havia uma intensa luta interior do eu-lírico, em face de sua conturbada relação com Deus e dos pecados que tenazmente o assediava, o homem árcade parece não estar preocupado com questões tão profundas, tão prementes. A preocupação maior dos árcades não era sua comunhão com Deus, a salvação de suas almas; sua preocupação estava em manter uma relação equilibrada com a natureza. O árcade é um homem que quer fugir da turbulência das cidades, do burburinho, dos frêmitos, da turba ensandecida em meio a demandas materiais do dia-a-dia. Os árcades querem uma vida simples, aprazível, por isso buscam um local ameno, onde reinem a paz, a harmonia, a tranqüilidade. Querem cortar o que é inútil à felicidade humana, porque somente sem ter preocupações graves é que o homem pode aproveitar a vida e ser feliz. É óbvio que o amor deve estar presente neste cenário de paz e sossego. O homem árcade, segundo as liras de Gonzaga, abre mão da correria urbana, porém não pondera que o amor seja nocivo ao homem a ponto de não ser cogitado. Num cenário de bucolismo, o homem árcade canta a simplicidade das coisas, inclusive a do amor. Vejamos como esse pequeno trecho da primeira parte da Lira I de Tomás Antônio Gonzaga, revela a essência do pensamento árcade:



“...Leve-me a sementeira muito embora

O rio sobre os campos levantado:

Acabe, acabe a peste matadora,

Sem deixar uma rês, o nédio gado.

Já deste bens, Marília, não preciso:

Nem me cega a paixão, que o mundo arrasta;

Para viver feliz, Marília, basta

Que os olhos movas, e me dês um riso.

Graças, Marília bela,

Graças à minha Estrela!





Leiamos o seguinte soneto de Cláudio Manuel da Costa:



Nise? Nise? onde estás? Aonde espera

Achar te uma alma, que por ti suspira,

Se quanto a vista se dilata, e gira,

Tanto mais de encontrar te desespera!



Ah se ao menos teu nome ouvir pudera

Entre esta aura suave, que respira!

Nise, cuido, que diz: mas é mentira.

Nise, cuidei que ouvia; e tal não era.



Grutas, troncos, penhascos da espessura,

Se o meu bem, se a minha alma em vós se esconde,

Mostrai, mostrai me a sua formosura.



Nem ao menos o eco me responde!

Ah como é certa a minha desventura!

Nise? Nise? onde estás? aonde? aonde?



Como não vislumbrar neste poema um homem romântico que sofre pela ausência de sua amada? Como foi dito há pouco, não se pode separar um homem em seções que não se comunicam, como se cada uma reivindicasse a função precípua de caracterizar o ser humano. Ou seja, afirmar que um árcade privilegiava a razão, a sobriedade, em nada significa anular nesse mesmo homem o sentimentalismo e a emoção. Alegar que o poeta árcade primava pela impessoalidade e objetividade, em nenhum momento deve sugerir que suas cogitações pessoais, subjetivas, íntimas, estavam totalmente anuladas, inertes, como se tal homem fosse um ser despido de entranhas que fervem de tristeza e saudade. Percebemos que o eu-lírico, neste poema de Cláudio Manuel da Costa, quer sim, revelar as profundezas sentimentais de um amante afastado de sua amada. Ele por ela suspira, sofre, geme. Sua alma, aflita, que ter paz, mas não aquela paz do bucolismo, pela ausência das confusões urbanas; quer a paz derivada do descanso que um coração cheio de amor encontra quando o outro, ou seja, a mulher por quem suspira, lhe corresponde o amor. Como admitir que um árcade se considere um desventuroso homem? Ele não cantava a harmonia do contato com a natureza? Como poderia ser um infeliz? A impossibilidade de ser infeliz o homem árcade seria verdadeira se verdade fosse que um homem pode projetar no seu duplo, o eu-lírico, uma existência plena, que anule os sofrimentos do poeta pela presunção de felicidade que suas palavras atribuem ao ser numa existência presumida. O Dirceu de Tomás Antônio Gonzaga e o Glauceste Saturnio de Cláudio Manuel da Costa, pseudônimos pelos quais os poetas materializavam o fingimento pastoril, podiam, certamente, fingir uma ausência de conflitos, porém, vez ou outra, como prova o poema lido acima, é impossível a um homem fugir o tempo inteiro do seu próprio tempo. E se os poetas árcades atuaram sobre o seu tempo, o seu tempo, em resposta à ação deles, imprimiu neles a sua marca, a marca da contradição, da busca incessante pelo equilíbrio, não o equilíbrio das formas, que não satisfaz a mente, senão o equilíbrio do espírito, de todo modo impossível de ser alcançado, sendo quiçá essa inatingibilidade a razão de ser o poeta um fingidor, em qualquer tempo, em qualquer circunstância. As dores românticas de Cláudio Manuel da Costa revelam o homem nunca está completamenete realizado, e se tal realização fosse possível, talvez a literatura para nada servisse, visto que a literatura é o registro das inquietações e contradições que habitam a alma humana.











BIBLIOGRAFIA:





Cadermatori, Lígia. Períodos Literários. São Paulo: Ática, 1987.

Megale, Heitor. Elementos de Teoria Literária. São Paulo: Nacional, 1974.

Moisés, Massaud, Paes J.P. In: Pequeno Dicionário de Literatura Brasileira

Renée, Arbour. Miguel Ângelo. Lisboa: Verbo Editorial

Fred, Berence. Leonardo da Vinci. Lisboa: Verbo Editorial

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