Querida, eu sempre avisei. Eu sou do tipo que pode queimar, quem se aproximou sempre esteve à deriva. Eu avisei.
Lembra de meus destemperos, minhas pequenas fugas? Apenas esconderijos, sempre de alguém que nunca encontrei; nem nos sonhos, nem na realidade que nos toca para longe um do outro, agora.
Seu perfume inebria minha alma, seus pequenos toques eriçam minha nuca, só de pensá-los. Nunca ninguém me pôs assim. Esteja certa disto.
Dentro do armário onde nossas almas se misturam em confusão de peças de roupa e gravatas e ternos de linho, está a Caixa. Deve abri-la, para o seu bem, querida.
Sei que deve estar amedrontada agora, mas prossiga. O envelope verde contém as instruções dos procedimentos a seguir. Ligue para o Alberto, meu fiel escudeiro e diga quando ele atender: “Pérolas aos porcos”. Ele desligará e desatará as aberturas do portão de Cérbero e não se assuste com o que provavelmente acontecerá. Apenas não olhe a Caixa depois que telefonar, peço-lhe, não olhe a Caixa.
Suas mãos afiladas, de lindas unhas, nunca mais passarão nas minhas. Sua suave voz nunca mais me deixará surpreso, pois nunca mais chegará aos ouvidos de quem tanto lhe ama.
Agora temos de agir rápido. Apanhe a Caixa, abra e leia o envelope e ligue para Alberto. Deixe o destino levar o mundo agora e saiba: Nunca esquecerei seus ternos olhos e seu colo perfeito.
Aprenda a correr de agora em diante, querida. Desconfie de sua sombra, abra os olhos ao menor ruído, ligue sempre de telefones públicos.
Num deles, eu atenderei quando for chegada a hora.