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cronicas-->O MISTERIOSO PODER DA BUROCRACIA -- 30/01/2012 - 21:02 (Délcio Vieira Salomon) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O MISTERIOSO PODER DA BUROCRACIA

Délcio Vieira Salomon

Segue o relato de dois fatos acontecidos realmente. Aqui serão usados nomes fictícios para evitar possíveis convocações para registrar ocorrências junto às auditorias dos bancos oficiais referidos.
O primeiro episódio ocorreu há alguns anos na cidade de Conceição do Mato Dentro, MG.
Wesley, filho de fazendeiro, cuja propriedade se situava bem distante da cidade, recebeu do tio, residente em Belo Horizonte, carta com cheque nominal a ser descontado na agência bancária daquela cidade.
Ao dirigir-se ao banco para descontar o cheque, para surpresa sua o caixa atendente era sua tia.
- Olha quem vejo! Quem está vivo sempre aparece. Wesley, quem diria, há quanto tempo não nos vemos. Como vai sua mãe, seu pai, seus irmãos? Você certamente não sabia: estou trabalhando nesta agência há um mês, pois vim transferida da capital para cá.
- Tia, que bom revê-la. Em casa, todos bem. E os seus, todos também estão indo bem? Sabe que estou aqui para descontar este cheque que seu irmão e meu padrinho, o tio Paulo, me mandou.
A tia recebe por debaixo do vidro o cheque e simplesmente, como autómata, diz:
- Por favor a carteira de identidade.
- Mas tia, que negócio é este. Sou seu sobrinho. Você me conhece desde meu nascimento. Pode atestar minha identidade mais do que qualquer documento. Exigir carteira de identidade de estranho, muito bem, mas de seu sobrinho, sangue de seu sangue?
- Infelizmente, Wesley, sou obrigada a agir assim. São determinações de meus superiores e não posso infringir nenhuma regra a nós imposta, sob pena de sofrer punição e até perder o emprego.
Sem palavras, Não precisa comentários. O leitor é capaz de julgar por si.

........................................

Tão eloquente quanto este, para mostrar o papel exercido pela burocracia na alienação das pessoas por ela atingidas, eis o segundo fato.
Sou cliente da Caixa Económica Federal. Minha agência está situada no Campus da UFMG, bem distante do bairro onde moro. Costumo usar uma agência que se situa a dois quarteirões de meu prédio.
Semana passada, precisei de tirar talonário de cheques. Ao dirigir-me á caixa eletrónica onde são fornecidos, deparei com aviso que não estava funcionando.
Recorri à menina com o uniforme "Em que posso ajudar?" e ela me disse que poderia dirigir-me ao guichê e tirasse a senha de prioritários que conseguiria rapidamente o talonário.
Ao me aproximar do funcionário do guichê, disse-lhe o que desejava.
- Por favor, a carteira de identidade
Apresentei cópia da carteira, pois havia alguns dias ela fora roubada junto com meus cartões de crédito e ainda não tinha conseguido a segunda via da original.
- Infelizmente nada posso fazer. Entretanto, procure a gerente Solange que ela vai autorizar.
Dirijo-me a tal gerente.
- Infelizmente (curioso: os burocratas sempre começam a negativa com esse "infelizmente", como se a infelicidade fosse propriedade de quem nega e não de quem necessita de atendimento), nada posso fazer. Há necessidade do original da Carteira de Identidade.
- Mas, senhora, estou com a cópia de minha carteira e posso fornecer-lhe todos os dados que me identifiquem: CPF, endereço, telefone residencial, nome completo dos pais, título de eleitor. Se quiser assino até uma declaração de responsabilidade. Afinal não estou descontando uma fortuna. Apenas solicitando um talonário de cheques.
- Professor, é para sua segurança, pois alguém pode tirar cópia de sua carteira de identidade e passar por sua pessoa.
- Minha senhora, aceito este argumento, mas dentro de sua hipótese, este possível usurpador de meu nome e até de minha identidade, aqui e agora poderia ser eu. Poderia ele fornecer os dados que acabo de lhe apresentar, como, repito, meu endereço, o telefone, meu CPF etc? Claro que não!
- Concordo com seu raciocínio, mas Infelizmente nada posso fazer. Ainda mais que esta não é sua agência. Por que não se dirige a seu gerente. Ele, por conhecê-lo, certamente lhe concederá a permissão.
- Desculpe-me, senhora. Mas a senhora acaba de me dar prova de que, para não perder o emprego ou por outro motivo, talvez para fazer carreira na empresa, deixou que seus superiores, ou melhor o sistema empresarial a que serve, a despersonalizassem. Vejo que a burocracia implantou na sua pessoa a alienação. Em lugar do bom senso lhe injetou a insensibilidade e falta de percepção do outro. Seria interessante que fosse a uma locadora e alugasse o DVD "Tempos Modernos" de Charles Chaplin. No filme, o grande Carlitos faz a mais bem feita crítica ao capitalismo, justo naquilo que esse sistema tem de mais perverso: a alienação das pessoas, que para não perderem o emprego ou para galgar postos na empresa, onde trabalham, acabam se despersonalizando. Realmente a senhora acaba de me apresentar o mais emblemático sinal de nossos tempos: paradoxalmente, por ter perdido a própria identidade no ofício que exerce, exige de mim prova de minha identidade. Passar bem e que os deuses não permitam que pessoas como a senhora atinjam a presidência da empresa onde trabalham.
E saí da agência pensando com meus botões: como é misterioso o poder da burocracia!
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