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Artigos-->miniconto: a prosa a caminho do hai-kai -- 16/06/2001 - 02:53 (José Pedro Antunes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Tese: a parataxe está para a poesia, assim como a hipotaxe está para a prosa. Bem, mas isso pensando em grego, não é mesmo?



Pois vamos ao português (bem claro?): a coordenação (justaposição) está para a poesia, assim como a subordinação está para a prosa.



A coordenação está para a sugestão poética (vazios), assim como a subordinação está para a demonstração lógica (não admite vazios).



A coordenação pode tornar a prosa mais poética, assim como a subordinação pode tornar a poesia mais prosaica.



A coordenação oferece, portanto, vazios ao leitor. Vazios que ele pode preencher em liberdade considerável, dentro da lógica proposta pelo modelo poético escolhido. Essa liberdade é sempre maior, em todo caso, do que na organização sintática por subordinação, que tende a oferecer modelos fechados, deixando pouca margem à participação do leitor.



Como forma poética, o hai-kai representa um desafio tanto para quem escreve como para quem lê. Nele, os vazios só podem ser maiores. A organização sintática ficando, quase sempre, inteiramente entregue ao trabalho imaginativo do leitor.



O miniconto, no âmbito da prosa, seria em muito semelhante ao hai-kai. O mesmo nível de exigências, de abertura para a co-elaboração do leitor. Prosa mais poética, portanto.



Tomemos, a título de comparação, as tiras dos jornais (o cartoon é um trabalho a ser realizado em três quadrinhos). Elas são um desafio e tanto à imaginação criadora do artista, instado a oferecer um máximo de participação ao leitor. Obra aberta portanto.



Neles, a imagem cumpre um papel importante, com sua sintaxe bastante peculiar (diferença a ser considerada). A imediaticidade da apreensão das imagens permite ao cartunista a adoção de formas extremamente ousadas de elaboração textual (os balões são aventuras à parte). Vamos a três exemplos colhidos na Folha de ontem, sexta-feira, 15/06/2001, pág. E 7.



Exemplo 1:



CHICLETE COM BANANA - Angeli



Devo admitir que gosto de pornografia. Cumshots, blowjobs, zoofilia, bizarrices... Nada disso me causa constrangimento. Agora, acho muito nojento aquele tal de Elton John.



Exemplo 2:



OS PESCOÇUDOS - Caco Galhardo [MAMBO E EU]



O dono:

- Desista Mambo, você não passa de um cachorro. Um animal facilmente manipulável. É só jogar um osso ali no canto que você sai correndo atrás.

Mambo (com o dinheiro na pata):

- E se eu jogar essa nota de 100?



Exemplo 3:



PIRATAS DO TIETÊ - Laerte



- Eu proibo vocês, aliens, de provocar crise de energia.

- Vamos ter que mofar o dia todo? Nada de novo no cinema... Sem grana pra balada...

- Tá, tá, vão provocar crise de energia!!

- ÊÊÊÊÊ!



Retiradas as imagens, restam textos altamente criativos, imaginativos, com a rapidez que a imediaticidade na apreensão das imagens implica, com o movimento que elas permitem. O leitor pode conferir. Qualquer um desses textos poderia trazer a classificação de gênero: miniconto . Seria procedente a questão: Por que, num site literário como o usinadeletras , por exemplo, o gênero passou a ser amplamente cultivado, contando com a adesão de um número considerável de leitores?



Os três cartoons escolhidos ilustram, à maravilha, uma afirmação da escritora Lygia Fagundes Telles. Ela dizia, em entrevista recente, que a melhor literatura brasileira, hoje, está em algumas tiras publicadas pelos jornais.



Angeli, Caco Galhardo e Laerte estão produzindo uma prosa ágil, contaminada pela poesia da justaposição das imagens, pelo poder cinemático que elas impremem às frases. Em termos de figuras de linguagem, teríamos uma predominância da metonímia: flashs, sugestões, partes que ficam valendo pelo todo. Sim, como no cinema.



Assim como o hai-kai, ouso supor ainda que, em seu âmbito, o cartoon se constitui numa forma fixa. O soneto sempre representou um desafio bastante exigente para seus cultores, amplo domínio sobre os procedimentos propícios à sua construção. Desafio que alguns cartunistas têm vencido quase todos os dias. Fosse literatura, estaríamos diante de um feito de enormes proporções. Enfrentam uma produção que obedece a um ritmo praticamente industrial, sujeita à avaliação diária de seus leitores, e enfrentando temas variados, quase sempre ao sabor dos acontecimentos do dia. Do ponto de vista político-ideológico, engajamento total, alerta máximo. Como nos três exemplos acima, eles assumem o papel de cronistas, mas dispondo de um espaço drasticamente reduzido.



Diante de tanta poesia, a escritora, só podia ter ficado mesmo toda prosa. E só podia constatar também que a literatura, aquela que é conhecida como tal, aquela que ela mesma pratica, corre o risco de ficar, para o bem e para o mal, cada vez mais prosa.



Minicontos e textos dos cartuns são a prosa a caminho da poesia mínima, a caminho do hai-kai.



[Atenção: o ensaio é, por natureza, um gênero aberto à participação do leitor. Alguns vazios são intencionais (é claro: o autor tem consciência tanto de suas próprias lacunas, como da inteligência do leitor). Outros, nem tanto. Portanto, obra aberta e em progresso. Que o leitor se manifeste.]

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