Por motivos que nunca me explicaram mas que, a partir da vida adulta, entendi claramente o pedagógico porquê com louvor e vénia, meus pais preocupavam-se imenso em colocar-me junto dos outros animais.
Na época da minha infância, no Porto, só havia no Palácio de Cristal uma mini-galeria zoológica, onde permaneciam em cativeiro um velho leão, que estava sempre a dormir, vários macaquitos brincalhões e um chipanzé do meu tamanho que, volta e meia, mostrava o seu par de tomates azuis - o gajo era portista - e, como o Diógenes, a ninguém pedia licença para masturbar-se em público quando lhe dava na veneta.
Visita após visita era sempre a mesma cena: o leão dormia, os macacos pequenos divertiam-se estupidamente entre ridículas piruetas e o chimpanzé, pimba, agarrava-se ao freio da vida para conduzir o seu pobre corpo, entre eflúvicas ondulações, para além da jaula, até ao céu.
Ao cabo de 67 anos, é de pasmar, estimadas Leitoras e estimados Leitores: só há pouco, há poucochinho, é que constatei que não passo de um velho leão a dormir com um milhão de macaquitos na cabeça e de um maníaco chipanzé a masturbar-se publicamente, como neste preciso instante... António Torre da Guia |