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Artigos-->O equívoco da empregabilidade - Adolfo Menezes Melito -- 25/04/2003 - 10:56 (Linda Cidade) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O equívoco da empregabilidade

quarta-feira, 18 de dezembro de 2002

Adolfo Menezes Melito



Ao longo dos anos 90, o mercado de trabalho brasileiro experimentou suas mais profundas transformações. Mudanças impulsionadas por recessão econômica, globalização, busca de maior competitividade empresarial, planos econômicos e privatizações. Isso sem contar com as mudanças profundas vindas da evolução de tecnologias de informação, o surgimento da rede mundial de computadores, a Internet e o barateamento astronômico dos custos de comunicação causados por essa tecnologia. Foi nesse período que assistimos à morte da moribunda "segurança no emprego" e da fidelidade ao empregador. Nunca se viu na história do país tamanho surto de desemprego.



A indústria, por conta dos avanços tecnológicos, é o setor que contabiliza as maiores perdas. De contingente humano, bem entendido. O setor de serviços chegou a ser tido como o "salvador da pátria", em termos de absorção dos desempregados da indústria. Vê-se agora que não era bem assim. A modernidade tecnológica também chegou lá e por lá também escasseiam as oportunidades. E o desemprego só faz aumentar, criando no seu rastro uma nova e numerosa categoria de trabalhadores: os "autônomos". São várias as suas denominações, dos temporários aos "sacoleiros", dos sem-carteira assinada aos camelôs. Um trabalho, é claro, mas de dignidade e qualidade duvidosas. A reorganização do mercado de trabalho em torno dessas novas realidades, no caso dos paises desenvolvidos, especialmente os Estados Unidos e os paises da Europa, não deixa dúvida que há um espaço ilimitado a ser ocupado pelo setor de serviços. No caso brasileiro a situação é dramática pelo baixo desenvolvimento econômico experimentado nesse período e também pelos ranços de regulamentação do trabalho, que teimam em persistir.



E eis que surge a empregabilidade. Perfeita na sua conceituação contemporânea e nos seus nobres propósitos. Pena que se tenha apresentado como uma noção de consolo, quase uma receita de panacéia social. Difícil de acreditar, já que não há respostas fáceis tanto para a perda quanto para a criação do emprego, qualquer que seja sua forma de manifestação. E este é o equívoco da empregabilidade.



Um novo contrato social (acordo não escrito entre pessoas da sociedade em relação às formas de comportamento aceitáveis) baseado na empregabilidade é como o samba de uma nota só. Como se tudo se resumisse na pura e simples substituição de um contrato. A verdade dura é que não há remédio indolor e, no caso do emprego, temos hoje mais questões do que soluções. Parafraseando recente e bem humorada campanha publicitária , poderíamos afirmar que "todo brasileiro tem direito à saúde, desde que pague convênio. Todo brasileiro tem direito a ir e vir, desde que pague pedágio. Todo brasileiro tem direito ao emprego, desde que tenha empregabilidade."



A empregabilidade, a bem da verdade, é um excelente paliativo que se esquiva da necessidade de confrontar a essência de um complexo enredo social. No centro, o fato: a perda do emprego e a insegurança no trabalho são experiências humanas dolorosas que provocam a perda da auto-estima e da identidade social. À sua volta, empresas, empregados e toda uma sociedade sem preparo para reconhecer e lidar com essas questões.



A empresa de hoje precisa ser mestre na arte de unir pessoas para atingir objetivos comuns, um envolvimento emocional similar ao casamento. Mas deve também, quando seu desempenho ou sobrevivência for ameaçado, mostrar determinação para decretar grande quantidade de divórcios. Resulta daí que empregados emocionalmente envolvidos experimentam profundo sentimento de perda, uma sensação de estar sendo traído. E uma tristeza, daquelas com as quais já nos acostumamos nas nossas vidas privadas, mas que dificilmente aceitamos nas nossas vidas profissionais.



Há uma forte e inescapável ligação entre os dois protagonistas desse enredo. A empresa, requerendo níveis sempre crescentes de intensidade e de comprometimento do indivíduo. O empregado, para executar bem essas obrigações, fazendo um profundo investimento pessoal em termos de comprometimento. Quando essa ligação se rompe, são inevitáveis o sentimento de perda e o sofrimento, tanto maiores quanto mais elevado for o comprometimento. A sociedade também tem um grande e importante papel. O de implementar mudanças em seus valores e práticas de modo a tratar efetivamente as questões relacionadas com a perda e o sofrimento associados à vida no trabalho.

Uma saudável e equilibrada identidade social depende, fundamentalmente, de três fatores: família, trabalho e convívio social. O convívio social é hoje, em tempos de virtualidade, uma prática cada vez mais rara. O trabalho consome a maior parte da nossa energia e do nosso tempo. Além disso, a família e a comunidade perderam força e importância em nossas vidas. A sociedade como um todo está falhando e deixando um vazio que só contribui para agravar o problema.



Dando corpo a essas afirmações, aí vão alguns fatos amplamente conhecidos:



1. Contam-se nos dedos as empresas que tratam o assunto "demissão" de forma corajosa e transparente com seus empregados. Menor ainda é o número daquelas que proporcionam algum tipo de apoio efetivo.



2. Os fatores "comportamentais" têm sobrepujado os fatores "técnicos" como os principais motivadores de desligamentos, excetuando-se as demissões em massa.



3. É cada vez mais capenga o conjunto de crenças e valores individuais, dentro dos quais reside o indispensável equilíbrio emocional e espiritual.



4. O desempregado é visto e tratado quase como um leproso social.



Somem-se a isso os fatos de que:



1. Está praticamente por conta de umas poucas e abnegadas ONG s a promoção de algum tipo de integração social.



2. Têm sido tímidas e inócuas as políticas governamentais para geração líquida de empregos.



Nesse último particular, começa-se a desenhar, paradoxalmente através do primeiro governo genuinamente de oposição eleito no país, a noção de que o Estado não é auto-suficiente, de fato, para criar a montanha de empregos que seria capaz, no primeiro momento, de simplesmente reduzir – já que zerar essa conta é absolutamente um sonho – a imensa massa de desempregados, que ultrapassa hoje no Brasil a casa dos 11 milhões – cerca de 7 % segundo o IBGE e próxima dos 20% como ainda quer demonstrar as estatísticas do DIEESE-SEADE, que nunca se preocupou em esclarecer à população que os seus números abrangem desempregados com idade a partir de 13 anos, fato absolutamente inexplicável, já que toda a sociedade e naturalmente a própria oposição, que vive alarmando a questão do desemprego, contrapõem-se à idéia do trabalho infantil de idade inferior a 16 anos. São essas as meias-verdades que a oposição tanto insistiu e que, agora como governo, certamente tratará de desmistificar perante a opinião pública.



Foi muito interessante ver a recente comparação testemunhada por importante revista semanal, que preconiza um governo de oposição de muita prosperidade, tal e qual foi o governo de oposição da Espanha de Felipe González, por longos quase 14 anos (de 1982 a 1996), que deixou uma herança formidável de crescimento e desenvolvimento, mas que, não obstante, praticamente duplicou o índice de desemprego dos não modestos 11% para o patamar nada confortável de 22,2%.



Como se tudo isso ainda não bastasse, mesmo as mais louváveis premissas da empregabilidade têm sido ou desprezadas, ou mal interpretadas, ou mal empregadas. Senão, vejamos as seguintes evidências:



1. Continuamos a carecer de uma verdadeira educação para o trabalho (não confundir com formação acadêmica).



2. A maioria esmagadora dos programas de qualificação/requalificação profissional prima pela ênfase nas competências técnicas, negligenciando as competências humanas, especialmente as emocionais.



Nesta segunda evidência, diante do enorme potencial de novos empregos, no futuro, nas áreas de serviços e, em particular, nos segmentos assistenciais, percebe-se a necessidade de um planejamento ainda mais amplo para enfrentar a falta de preparo para essas novas oportunidades. Essa preparação deve direcionar-se, em particular, aos trabalhadores do sexo masculino, cujo perfil histórico está relacionado a trabalhos que utilizam habilidades técnicas e habilidades físicas, seja na indústria ou na área de serviços, diferentemente do sexo feminino que, pela sua formação familiar e pelos hábitos sociais vigentes, terão sempre maior facilidade



Em suma, nossos atores sociais têm atuado de forma letárgica, o que é fruto da nossa tendência de procurar soluções racionais e tangíveis, como a empregabilidade. Esse neologismo pomposo, oriundo do inglês "employability", poderia também ter sido batizado como "adaptabilidade funcional" ou "qualificação situacional". Não importa. O que importa é que a legião de desempregados continua a crescer , mesmo entre os detentores de elevados graus de empregabilidade. Portanto, para que nossa peça se transforme num sucesso nacional de bilheteria, não adianta culpar o governo, nem maldizer as empresas, nem tampouco inventar artifícios acadêmicos. É preciso, isto sim, que todos os nossos atores sociais se unam para empreender ações eficazes, cuja meta seja nada menos do que identificar e resolver todas as questões relacionadas à completa formação da nossa força de trabalho, ao impacto individual e coletivo do desemprego e à busca de alternativas para criação líquida de empregos. E, principalmente, tendo o respeito ao ser humano como a pedra de toque.



Nem tudo está evidentemente perdido. As mudanças estruturais acima definem também o desaparecimento do paternalismo empresarial e ensejam uma mudança que deve começar com cada um. Evidentemente que esse trabalho se torna mais eficaz com a participação efetiva dos empresários e do governo na busca de uma solução que amenize essas conseqüências. De toda forma, chegou a hora de uma atitude mais corajosa e menos conformista dos profissionais em geral, buscando uma atualização constante das suas competências, uma avaliação periódica do seu grau de satisfação no trabalho e contribuição em sua atividade e, em última análise, o preparo antecipado para o próximo passo em sua carreira. Afinal, não vamos aqui considerar que a procura da satisfação profissional começa com uma decisão que nem sempre é tomada por esse profissional. Esse esforço pode e deve começar muito antes de uma decisão unilateral por parte da empresa.



Dentro dessas transformações já é possível prever um comportamento que tenderá a ser percebido cada vez mais no futuro: a definição de um novo desafio por parte desses profissionais como agentes principais do processo de mudanças, mudanças essas que passarão a ser delineadas cada vez mais a partir de uma atitude desses profissionais e não mais, unicamente, do lado empresarial.







Sobre o Autor



Adolfo Menezes Melito, diretor executivo da Gran Sapore BR Brasil S/A.

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