Se Deus quisesse prover
Cada cesto de um limão,
Por certo ninguém teria
Mais do que um limão na mão.
Eu sei que os pobres versinhos,
Ditos rápidos, à toa,
Não poderão provocar
Reação que seja boa.
Esta forma é mui carente
De um compromisso maior.
Se você quer perfeição,
Dedique-se com amor.
Atrás da felicidade
O homem é uma torneira.
Se a gente abre, ele fecha;
Se a gente fecha, bronqueia.
Não fique aí a cismar
Que tudo caia do céu:
Ou você se reanima,
Ou irá vagar ao léu.
Um suspiro é coisa boba.
Um suspirar é sofrido.
Que dizer, então, do hausto
Assoprado em meu ouvido?
Se você quiser, um dia,
Navegar por longos mares,
Prepare o seu coração,
Porque terá patamares
De muitas dores cruéis
Que a saudade imporá.
E não acreditará
Nestas nossas profecias,
Mas estará sempre atento
A que, menos ou mais dias,
Se sentirá perturbado,
Com o coração sofrido,
E não terá mais sossego,
Enquanto não tiver vindo
Recuperar os desejos
Da viagem encetar,
Pois o que é mais feliz:
Desejar ou velejar?
Este nosso atrevimento
Não seja nenhum tormento
P’ros sonhos do mediador.
Saiba bem que tentaremos,
Sempre que solicitar-nos,
Imprimir à sua pena
Ritmo louco e suave,
A um tempo frio e quente,
Porquanto, sabemos nós,
Será sempre atrevimento
Ficar escrevendo à toa.
Se você for duvidar
Deste tremendo arremesso,
Não permaneça parado:
Ponha-se logo a escrever,
Que iremos remediar,
Sempre que for fraquejar
E não souber prosseguir
Nesta escrita fabulosa,
Pois é preciso pautar
O seu ritmo interior,
Fazendo com que possamos
Obter de nossos guias
Uma maneira qualquer
De promover alegrias,
Saudando o fiel companheiro
Na forma peculiar,
Poético linguajar,
Que tanta celeuma causa
Quando se dá o convite
E é aceito por nós,
Que temos algum ouvido
Para ouvir a sua voz.
Não pretendemos ditar
Frases sem nexo ou padrão.
Vamos ter de cotejar
O que sabemos ou não
Com o profundo saber
De nosso querido irmão,
Que sempre se prontifica
A enquadrar-se no ato.
A mediunidade é um fato.
Graças a ela, podemos
Ingressar mais uma vez
Nesta Terra tão querida,
Onde se deu uma vez
A nossa reencarnação,
Que se quis bem sucedida,
Mas não passou de rojão
Que estourou bastante perto,
Quase rastejando o chão.
Numa hora é desacato,
Noutra é puro boato,
Mas sempre e sempre persiste
O nosso puro desejo
De guindar-nos, algum dia,
Acima destas esferas
Em que nós nos situamos,
Para poder adentrar
O mundo cheio de glória
Em que reside o Senhor,
Com toda a sua Harmonia.
Certamente eu não iria
Fazer tal comparação,
Quando se trata de Deus:
Ele é sempre muito bom
E nos ajuda a subir,
Para não ficar no chão
Sem saber o que fazer,
Sem conseguir compreender
A lição mais eficaz,
Aquela que nos dá paz
E nos permite chorar,
Alegres no coração,
Sem saber que hoje estamos
Espezinhando um irmão,
Que nos busca, agradecido,
Oferecer sua mão
Para que dizer possamos
O que vai no coração.
Estes versinhos singelos
Expressam, com atenção,
O que de mais puro temos
Por dentro do coração.
E não se retire ainda,
Ó nosso querido irmão,
Porque temos de fazer
Nossa última oração.
Mas já perdemos o impulso
De escrever em forma ativa
Os versos de sete sílabas
Como tudo o que ditamos
Neste nosso atrevimento,
Pois temos só sofrimento
Marcado em nosso pendão.
E agora, aos poucos, iremos
Deixando você na mão,
Pois não sabemos obrar
Dentro dos mesmos princípios.
Começamos a falhar,
Sem poder oferecer
Mais do que algumas palavras...
COMENTÁRIO — HOMERO
Apresentou-se irmãozinho ávido por utilizar a mão do médium para traduzir sentimentos e pensamentos na forma poética. Acreditava que era só tomar o lugar, para que, ao influxo de suas sugestões, pudesse o instrumento compor, com energia e sagacidade, algum texto que contivesse ritmo certo, como se fosse tão-só preciso das palavras para escrever poesia. Não foi capaz, evidentemente, pois lhe faltou “inspiração”, uma vez que nenhum estudo fez dessa “forma peculiar de linguagem”, como ele mesmo frisou.
Sabemos que não é fácil até mesmo para médiuns mecânicos apanhar ditados na forma de versos, uma vez que é preciso desenvolver senso de “ritmo interior”. Claro está que é o caso de nosso escrevente, que se dispôs ao trabalho na esperança de ver concretizada antiga aspiração. Esperamos que não se veja no “atrevimento” do nosso atabalhoado poeta nenhum desestímulo para prosseguir oferecendo-nos o concurso de sua pena.
Quanto aos aspectos doutrinários envolvidos na longa lista de “versos”, pode-se perceber que o irmãozinho não é maldoso, apenas ignorante. Está presente, ouvindo atentamente a nossa fala, buscando compreender o que o levou a proceder com tamanha inconsistência. Os nossos companheiros traduzem para sua terminologia a nossa arenga, para que fique confiante em que lhe ofereceremos os recursos necessários para que venha a suplantar as deficiências.
Como se pode notar no desenvolvimento da mensagem, tomou consciência de suas dificuldades e da necessidade de aperfeiçoamento, para que possa oferecer os préstimos junto às equipes socorristas. Não estamos autorizados a lhe garantir sucesso pronto nem remoto. Apenas podemos aconselhá-lo a se manter nesta atitude respeitosa diante do saber, para que possa considerar-se tão-só aprendiz, muito necessitado de ajuda e de esclarecimentos. Se concordar de boa mente, iremos encaminhá-lo para centro educacional, onde deverá inscrever-se, segundo seu nível de desenvolvimento, para principiar os cursos necessários para que sua capacidade floresça à luz dos ensinamentos evangélicos.
É bom manter o texto intacto, por dois motivos: 1.o) é o exemplo vivo de que os médiuns devem tomar o ditado sem assumir a responsabilidade pelo conteúdo e pela forma, a qual será atribuída ao espírito que perpetrou a transmissão; 2.o) é texto elucidativo do grau de desenvolvimento moral e intelectual de seu autor, que, futuramente, após prolongada estadia junto às organizações educacionais, poderá cotejar o desempenho anterior com a sua capacidade, obtendo da comparação como que recompensa pelo trabalho a que se tiver dedicado.
Afora estas considerações, achamos inútil insistir junto ao leitor que desconsidere o teor da mensagem, pois foi o resultado de atrevimento de espírito obsedado por idéias de poderio intelectual, sem o competente talento. Seria desalentador para todos nós que se visse nesse texto qualquer mérito, no sentido da elevação moral que se deve exigir dos mensageiros evangélicos e dos socorristas. Caso paire qualquer dúvida, devemos, finalmente, esclarecer que, se algum “verso” contiver a tradicional métrica dos heptassílabos ou redondilhas maiores, se deve unicamente aos hábitos de leitura do médium.
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