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Humor-->ORGASMO PATRIÓTICO -- 19/11/2001 - 14:55 (José Pedro Antunes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O jornalista Martin Kilian possui uma coluna no DER SPIEGEL online. Como imigrante com longa folha de serviços recebidos na América, ele se vê na necessidade de hastear a bandeira, num momento em que o país está literalmente vermelho-branco-e-azul.

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Por Martin Kilian (para o DER SPIEGEL online, 14/11/2001)
Trad.: zé pedro antunes

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Amantes de um Big-Mac, fregueses da Wal-Mart, cem litros de ketchup ao ano – a América nunca foi tão vermelha-branca-e-azul. No caso, a gente mesmo é obrigado, na qualidade de imigrante com longa folha de serviços recebidos, a bravamente dar testemunho, afinal não é à-toa que existe o NÓS, esse novo sentimento de pertencer a uma coletividade...


Na última semana, percorri o sul profundo da América, para, na região mais patriótica do país, sentir o pulso patriótico dos fãs de George W. Bush. Fiquei pasmo! Um mar de bandeiras! Uma só efusão de sentimentos tonitruantes! A América nunca esteve tão vermelha-branca-e-azul.
Já na autopista, viam-se tremular bandeiras do alto das carrocerias e das antenas dos veículos – a todo vapor, um orgasmo verdadeiramente patriótico. Numa "Waffle House" à margem da rodovia, serviam-se porções patrióticas: como nos patrióticos, um culto à grandeza americana. A borbotar da jukebox, as elegias patrióticas de Lee Greenwood ("God save America") atravessavam o refeitório, enquanto na entrada, ao patriótico vento de outono, stars and stripes tremulavam alegremente.

De repente me vem à memória Theodore Roosevelt: "Não existe um americanismo fifty-fifty neste país: aqui só há lugar para o americanismo 100%, mas só para os que são americanos. Do contrário, nada feito." Jesus! Eis-me aqui sentado junto ao balcão de uma "Waffle House" na Carolina do Sul, eu que não passo de um americano 90%. E então? O cozinheiro já levanta em minha direção um olhar desconfiado. Um 90%, é muito provável que ele esteja pensando. Entra em cena a paranóia. Ao dobrar a esquina, pode-se ler um monumental "freak-out". O jeito é hastear a bandeira o mais rápido possível.

"Diga lá, Buddy, o Bush não é o melhor presidente desde Clinton?", eu arrisco. "Me diga se NÓS não temos sorte? Que NÓS possamos tê-lo no salão oval?" E: "Não é o melhor que já nos aconteceu depois da invenção do microondas?" Não chega aos pés de um microondas, resmunga o cozinheiro. Trato de contradizê-lo de maneira apressada e puxo o carro.

Está mais do que na hora de adotar algumas insígnias da nova era patriótica. Em Charleston, elas são fáceis de adquirir: T-Shirts com inscrições como "unidos, NÓS somos imbatíveis" ou "Não queiram passar por cima de NÓS" ou "In God WE trust". Um cartaz na vitrine anuncia um “variado sortimento de temas patrióticos” no interior da loja. Só nos resta conferir.
Eu me decido por uma “sweatshirt” ("NÓS vamos te pegar, Osama") com uma águia no alto, uma camiseta ("América, love it or leave it"), um boné com o emblema dos nuca de couro, um brochinho com dizeres belicosos contra os 90%. Além disso, uma garrafinha de molho de pimenta, sobre cuja etiqueta uma foto ruim de Bin Laden aparece cruzada por um traço bem gordo em vermelho.
A vendedora rejeita rigorosamente o meu desejo, modestamente manifestado, de um desconto patriótico especial. "Unidos, NÓS somos imbatíveis", eu me recordo. E um desconto provaria, na verdade, que NÓS estaríamos unidos. "O senhor, de qualquer modo, não passa de um 90%", ela detona. "E não tem desconto para gente como você."

Maldição! Será que George W. sabe desse matrimônio espúrio de patriotismo e comércio? Terá consciência de que astutos exploradores comerciais da guerra enriquecem o meu amor pela América? "Sempre que ouvir um homem falar de seu amor pelo país, é sinal de que por isso ele espera ser pago", advertia o famoso publicitário americano Henry Mencken.

"I love America", é o que eu espontaneamente declaro à vendedora. Imigrante com anos de serviços recebidos. Aqui por sua livre e inteira vontade. De corpo e alma. Os melhores ovos mexidos. Bagels - oh Boy! Donuts, aqui por favor: tenho até mesmo um no bolso da calça. Fã de baseball. The Strokes. Coltrane. Michael Jordan. Uma imagem de Alan Greenspan sobre a mesinha de cabeceira. Cuecas Calvin Klein. Aficcionado do Burger-King. Amante dos Whoopper. Duas filhas americanas. Freguês da Wal-Mart. Mais de 100 litros de ketchup ao ano.

Wow! Como a gente consegue entrar numa dessas! Agora é não perder o fio da meada! Todo domingo diante da TV, assistindo futebol americano. Portador de armas de fogo. Paul Auster. Quase mórmon convertido. Philip Roth! Pato Donald! A cada festejo do 4 de julho, leitura da Declaração de Independência. Admirador dos Ramones. Pavement. Bolas de sorvete em vinho branco. Carro com dispositivos automáticos e encaixes para copos. Oito televisores, três delas sempre ligadas. Por favor, uma Budweiser. Frank Gehry, mas totalmente. Vermelho-azul-e-branco, minhas cores favoritas. W. Bush, o meu presidente favorito. O abelheiro [opções: abelharuco ou milharós] do brejo da Louisiana, meu animal preferido. Magnólias no café da manhã. E - há anos – o vento continua me levando. Ninguém mais bela do que Doris Day. Colecionador de citações de Jefferson. Philip Roth! "Esse o senhor já citou", sapeca sacanamente a vendedora. Nenhum desconto. Vou me queixar por carta a W. Bush. 87 dólares e 99 cents para enriquecer em 10% o meu patriotismo? Não é uma quantia exagerada?


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