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Artigos-->A INJUSTA LEI DO MAIS FORTE -- 27/03/2003 - 19:17 (J. B. Xavier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Desde o início da guerra do Iraque, tenho tentado escrever um artigo que refletisse meus sentimentos de admirador decepcionado com os EUA, de crente nos princípios da maior democracia do planeta, sem que nenhum dos rascunhos iniciados tenha conseguido expressá-los. Gunter Grass, com a autoridade que a láurea do Nobel lhe confere, fê-lo maravilhosamente bem. Eis seu oportuno artigo.





A INJUSTA LEI DO MAIS FORTE



GÜNTER GRASS

Nobel de Literatura - 1999



Começou uma guerra, uma guerra que é desejada e planejada há muito tempo. Contrariando todas as objeções e advertências da ONU, a ordem de lançar um ataque preventivo foi dada a um potente aparato militar, contrariando o direito dos povos. Foi desprezado o voto do Conselho de Segurança, ridicularizado e tratado como irrelevante.

Desde 20 de março, impera apenas o direito do mais forte. E, apoiado nessa injustiça, o mais forte tem poder para comprar e recompensar os que querem a guerra e para menosprezar ou até castigar aqueles que não a querem. As palavras do presidente atual dos EUA - "quem não está do nosso lado está contra nós"- trazem um eco de tempos bárbaros para os fatos contemporâneos. Por isso, não é de estranhar que a linguagem do agressor se assemelhe cada vez mais à de seu adversário.

O fundamentalismo religioso autoriza a ambas as partes abusar do conceito de "Deus" que têm todas as religiões, fazendo esse "Deus" refém de sua própria interpretação fanática. Foi inútil até mesmo a apaixonada advertência do Papa, que conhece bem a desgraça persistente causada pela mentalidade e a prática cristã da cruzada.

Dispersos, impotentes, mas irados, contemplamos a decadência moral da única potência mundial líder e desconfiamos que a loucura organizada terá uma consequência indubitável: servirá de motivação para um terrorismo crescente, de violência respondendo a outra violência.

Serão esses, ainda, os EUA dos quais, por muitas razões, guardamos uma lembrança tão boa? Será esse país o generoso doador do Plano Marshall? O benévolo mestre da disciplina da democracia? O sincero crítico dele mesmo? O país que, em outra época, ajudou o processo da Ilustração européia a superar o domínio colonial, dotou-se de uma Constituição que serviu de modelo para outros países e considerou a liberdade de expressão um direito humano irrenunciável?

Não apenas vimos essa imagem -que, com o passar dos anos, vinha se tornando cada vez mais ilusória- empalidecer, transformando-se numa imagem distorcida dela mesma. Também muitos cidadãos dos EUA que amam seu país se sentem horrorizados com a derrocada dos valores americanos e com a arrogância do poder que têm em casa.

Sinto-me unido a eles. Ao lado deles, sou pró-americano confesso. Protesto com eles contra a injustiça do mais forte, contra as restrições à liberdade de expressão, contra uma política de informação que, comparativamente, se pratica apenas nos Estados totalitários e contra qualquer cálculo cínico que, depois de morrerem milhares de mulheres e crianças, considera que isso é aceitável se se trata de defender interesses econômicos e políticos.

Não, não é o antiamericanismo que prejudica a imagem dos EUA, não são o ditador Saddam Hussein e seu país, em grande medida desarmado, que ameaçam a potência mais forte do mundo -são o presidente Bush e seu governo que agem no sentido de derrubar os valores democráticos, que prejudicam seu país, que ignoram as Nações Unidas e que assombram o mundo com esta guerra contrária ao direito internacional.

A nós, alemães, já nos perguntaram com frequência se sentimos orgulho de nosso país. A resposta não era fácil. E havia razões para nossa hesitação. Posso afirmar que a rejeição à guerra preventiva que vem se manifestando até agora entre a maioria dos cidadãos de meu país me levou a sentir orgulho da Alemanha. Depois de duas guerras mundiais com consequências criminosas, pelas quais temos que responder, aprendemos com a história.

Desde 1990 a República Federal da Alemanha é um Estado soberano. Pela primeira vez, o governo fez uso dessa soberania e teve a bravura necessária para contradizer os poderosos aliados, impedindo que a Alemanha recaísse num comportamento imaturo.

Agradeço ao chanceler federal, Gerhard Schroeder, e a seu ministro das Relações Exteriores, Joschka Fischer, por sua firmeza, eles que, apesar de todo o assédio e todas as calúnias, tanto externas quanto internas, continuaram sempre a ser dignos de crédito.

É possível que muitos se sintam desanimados. Há razões para tanto. Mas não devemos deixar que se extingam nem nosso "não" à guerra, nem nosso "sim" à paz. O que aconteceu? A pedra que empurrávamos montanha acima voltou a rolar até o sopé. Mas nós a empurraremos outra vez, embora desconfiemos que, assim que chegar lá no alto, ela voltará a nos aguardar no sopé da montanha. Pelo menos isso representa um protesto e uma oposição intermináveis, e é isso que continuará humanamente possível.



Fonte: Jornal! El país



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