50 anos depois da morte de Stálin, pergunta-se: Por que razão, já naquela época, a arte só queria ser um estilo de vida?
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Por Boris Groys [Die Zeit on-line, 10/2003]
Trad.: ZPA
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Como recordar, hoje, a época de Stálin? Um procedimento bastante adotado é a tentativa de espiar por trás da fachada propagandística, para descobrir a terrível realidade.
A elaboração histórica dessa realidade começa depois da morte de Stálin e ainda está longe de ser concluída. Cumpre deixá-la seguir, descansadamente, em sua lenta trajetória, na justa expectativa de que se vejam desvendados tantos outros crimes e atrocidades que permaneceram ocultos até hoje.
O mais das vezes, no entanto, uma tal elaboração do passado deixa de ver uma coisa: a própria fachada. Mas é justamente a cultura visual do realismo socialista de extração stalinista o que é mais interessante.
Ela faz parte de uma época em que a cultura comercial e global de massas, como hoje a conhecemos, começava a se manifestar. Foi então que ela recebeu a função que comumente vem desempenhando. A cultura oficial da época de Stálin foi parte da cultura de massas global e vivia das esperanças que esta passou a despertar em todo o mundo.
Chama atenção a semelhança exterior entre a arte stalinista e a cultura americana de massas do período. Entre os anos 30 e 50, a maior parte dos filmes soviéticos pouco se distingue dos musicais de Hollywood. O responsável pela semelhança estética? Um parentesco íntimo e profundo entre a cultura de massas comercial do ocidente e a cultura de massas ideológica dos soviéticos. Para ambas, a propaganda plasmou um estilo. Apenas que, no Ocidente, se fazia a propaganda de produtos variados, enquanto que, na Rússia stalinista, não se anunciava senão um único produto. O país, aliás, só possuía um – o comunismo.
A cultura do período stalinista não passava de uma grande campanha de marketing, cujo objetivo era trombetear a construção do comunismo. A propaganda comunista – e por isso mesmo ela está também mais próxima da propaganda comercial do Ocidente do que a propaganda nazista – não se dirigia a um grupo-alvo delimitado. A propaganda comunista conclamava a humanidade inteira a adquirir seu produto, o comunismo – tal como hoje a humanidade inteira é conclamada a consumir coca-cola ou big macs.
Mas com uma peculiaridade: eram idênticos o produto e a propaganda que dele se fazia. Antes de tudo, cumpria tornar artisticamente visível a diferença entre o comunismo e o não-comunismo. Mas, como?