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Erotico-->25. ESMERALDA -- 19/02/2002 - 08:01 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Rosalinda acabava de ter mais uma discussão com o marido. Olegário insistia em chegar altas horas da madrugada e, de manhã, não mais comparecia ao trabalho.

Pôs os gêmeos para dormir, deixando-os com a babá, e fechou-se no escritório, com a certeza de que não seria incomodada.

Resolveu que não iria chorar arrependida, que as lágrimas faziam mal até para as crianças, já que o leite escasseava, porque, aos sete meses, os dois meninos sugavam os fartos seios até esgotarem-se, precisando receber o complemento das mamadeiras.

Pensou em que ensinava às lactentes que a idéia de que a mãe poderia intoxicar os filhos, ao passarem por emoções muito fortes, era meramente folclórica, verdadeira crendice popular, mas percebeu que ela mesma não estava totalmente isenta de pensar assim.

“Eu quero ser o máximo de positiva e racional, julgando que sou capaz de dominar os meus impulsos...”

Não conseguiu, apesar de bem caracterizar mentalmente o processo psicológico, aplicar-lhe um termo adequado. Contornou o problema:

“Se não consigo dominar os impulsos, o que me leva a crer em que possa dar nome a todos os movimentos da alma? É como se eu fosse duas pessoas: a que deseja ser eficiente, determinada, e a que não mantém um padrão elevado de realizações intelectuais.”

As palavras fizeram-na mergulhar mais fundo:

“Será que tal duplicidade não pode ser encarada como animismo? Nos livros ditos mediúnicos, a psicografia não deve passar de um recurso da mente para expressar-se sem os cuidados da censura da consciência. Talvez, com a mente desperta, a pessoa não aceitasse escrever tudo quanto seu inconsciente tenha preparado, já que as preocupações permanecem desconhecidas, ou se revelam simbolicamente nos sonhos. Se eu tivesse a certeza de que os espíritos conseguem transmitir seus pensamentos, suas intuições, seus conselhos, seus avisos, suas advertências, suas experiências, em suma, eu colocaria um lápis na mão e passaria a escrever ao léu, interessada em ler o que nem sequer me tivesse provocado a atenção.”

O lápis estava a seu alcance e, sem cerimônia, pegou-o, descansando-lhe a ponta sobre uma folha em branco. Esperou alguns segundos a ver se, mecanicamente, se punha a escrever. Não tendo obtido sucesso, largou o lápis, pensando:

“Se Jesus mandasse um de seus mensageiros e ele quisesse conversar com os seres humanos através de minha mediunidade precária, com certeza iria bater em outra porta. Estudei tantas obras importantes, com mensagens atribuídas a espíritos de pessoas famosas, mas não tenho o discernimento necessário para desbloquear a mente e aceitar um pensamento alheio que possa ser útil a mim, em primeiro lugar, e a outros leitores. Será que estou divagando para esquecer os podres de meu relacionamento conjugal? E se um mau espírito comparecer, porque não estou em estado de pureza emocional? Sempre ouvi que era preciso sintonizar as ondas da misericórdia de Deus, onde estão as freqüências utilizadas pelos espíritos superiores, através de uma prece. Será que eu conseguiria a assistência de meu guia, de meu anjo guardião?”

Foi quando sentiu um impulso mais forte para voltar a empunhar o lápis.

“Se o espírito que me protege está querendo escrever alguma coisa, em nome de Jesus, pode fazê-lo agora.”

De fato, Rosalinda conseguiu escrever umas frases que se formaram em seu cérebro, sem que tivesse inteira percepção das idéias:

“Minha cara, não pense que você esteja apta a redigir a minha comunicação integralmente.; não sem antes dedicar-se bastante ao trabalho de intermediação entre os planos. Meu nome é Esmeralda. Fui encarregada de dar-lhe assistência neste tipo de empreendimento espírita. Se você estiver mesmo disposta a colaborar com a espiritualidade, volte a este posto de trabalho regularmente e nós iniciaremos um treinamento secreto, algo bastante íntimo mas legítimo, sem, contudo, entrarmos no campo das revelações das vidas passadas nem dos verdadeiros laços que prendem você a cada elemento de sua família. Faremos um trabalho preliminar, sem induzir nenhuma conclusão de caráter moral, algo bastante leve e consistente, conforme os ensinamentos mais comezinhos e elementares dos livros básicos do Espiritismo. Com certeza, você irá passar por uma fase de alta desconfiança, duvidando mesmo que tais idéias, por serem muito comuns, possam originar-se de outro espírito que não o seu. Também vai passar por sua cabeça que o espírito que lhe está ditando estas comunicações na qualidade de exercícios pretende obsedá-la, obcecá-la, exercer um domínio de possessão sobre a sua vontade. Estou dizendo tudo isto para sua reflexão. Se você achar algo que não condiga com os postulados espiritistas que vem estudando, lembre-se de assinalar, para que possamos esclarecer da melhor maneira. Fique na paz do Senhor.”

O lápis já estava sem ponta. Rosalinda pegou uma caneta, disposta a receber certas respostas a algumas perguntas que achou dever formular.

“Minha amiga e orientadora, será que terei capacidade para desenvolver a faculdade mediúnica?”

A resposta veio muito rápida, de sorte que quase não lhe foi possível escrevê-la:

“Você está querendo saber demais. Eu não lhe disse que será preciso trabalhar com afinco? Acho que você não deve preocupar-se com os aspectos materiais do relacionamento. Mesmo que venha a pensar em que você mesma é quem esteja respondendo às próprias questões, isso não nos impedirá de comunicar-nos. O que poderá afastar-nos de vez, com o risco de sermos substituídos por seres menos felizes, menos...”

Interrompeu-se a linha de pensamento, porque Rosalinda concentrou-se na caracterização dos espíritos que poderiam causar-lhe algum prejuízo, não querendo escrever uma palavra que pudesse ofendê-los ou magoá-los. Dizer espíritos baixos, espíritos malévolos, espíritos mal intencionados, não era de seu feitio. Lembrou-se de Olegário e de suas estrepolias e alcunhou-o de cafajeste, de miserável, acrescentando alguns termos de baixo calão. Foi quando atentou que seu respeito por entidades apenas imaginadas era muito maior do que por alguém que estava necessitando de compreensão e esclarecimento, porque capacidade intelectual tinha de sobra.

Pediu perdão por imergir nos problemas de seu dia-a-dia, sem saber direito se estaria ou não sendo ouvida.

Finalmente, ponderou:

“Débora diria que estou abrindo a válvula de escape da fantasia. Quando xinguei Olegário, estava ajustando-me à frustração através da agressividade.”

Percebeu que estava totalmente desperta, apta a realizar qualquer trabalho mental. No entanto, alongou os braços e as pernas, notando que estavam doloridos da ginástica com que pretendia anular os efeitos da gravidez dos gêmeos, gravidez que a obrigara a uma vida sedentária bem distante de seu padrão. Lembrou-se de que estava doze quilos acima de sua condição habitual e firmou a convicção de que suplantaria mais esse desafio, conquistando outra vitória sobre si mesma.

No dia seguinte, quando topou com a página escrita com uma letra corrida, na qual reconheceu a própria caligrafia, ficou tentada a dar uma nova oportunidade àquele espírito.

“Realmente, ninguém precisa ficar sabendo, muito menos a minha psicanalista, que pode pensar que será substituída, forçando-me a crer em que tais escritos mais não sejam do que minhas confissões subliminares.”

Riu do próprio pensamento e guardou a folha de papel numa pasta em cuja etiqueta escreveu: Esmeralda.


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