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Erotico-->23. OLEGÁRIO -- 17/02/2002 - 08:01 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Demorou para Rosalinda estabelecer um vínculo de amizade com o Doutor Olegário, seu advogado e consultor jurídico.

Mais velho que ela dez anos, tendo já completado quarenta e quatro, Olegário era antigo freqüentador da zona de meretrício, onde deixava quase toda a polpuda renda que conseguia extorquir da clientela. Gostava de variar, conforme afirmava aos mais chegados que lhe censuravam o perigoso procedimento. A estes, mostrava os envelopes dos preservativos, dizendo-se protegido e seguro.

De fato, somente quando ouviu dizer que vários companheiros de vida noturna tinham contraído AIDS é que passou a preocupar-se com o fato de que os pais, que o agasalhavam, estavam beirando os setenta e sendo requisitados pelos outros filhos, para saudável convivência com os netos.

Um belo dia, viu-se sozinho com os empregados, na grande casa térrea em que sempre vivera. Na verdade, mantinha uma garçonnière para os encontros clandestinos, onde se recolhia de quando em quando para refletir sobre os processos mais escabrosos, espécie de escritório secreto para fugir do assédio dos clientes em situação periclitante ante a lei.

Cansado da variedade maçante dos carinhos de encomenda, imaginou se não estaria na hora de dar oportunidade à vida de lhe propiciar algum conforto de caráter estável, alguém que estivesse, a um tempo, presente e ausente: presente, para o desfastio em momentos de desgaste físico e emocional.; ausente, quando necessitasse de repouso e concentração. Em suma, desejou uma esposa que não o atormentasse com monótona constância. Rosalinda pareceu-lhe a quo, expressão latina que utilizou espontaneamente, sem notar que falava consigo mesmo.

A jovem senhora bem que havia reparado na sisudez do advogado, sempre distante e cheio de termos técnicos específicos de sua profissão, tanto que, em várias ocasiões, precisou anotar para perguntar ao irmão, que convivia com diversos causídicos.

Por isso, naquela manhã, quando ele a convidou para almoçarem juntos, ela estranhou muitíssimo, sendo levada a aceitar mais por curiosidade do que por interesse.

Deu-se, durante a refeição, a mais inusitada conversa de toda a sua vida.

De chofre, Olegário foi propondo:

— Rosalinda, eu quero que você se case comigo.

Dizia aquilo, estendendo o braço por sobre os pratos e copos do caríssimo restaurante, em busca da mão dela, onde depositou um anel, que ela não permitiu que ele lhe enfiasse no dedo.

— Doutor Olegário...

— Daqui por diante, só Olegário, por favor.

— Olegário, esse seu pedido, assim, sem nenhum preâmbulo, sem nenhuma preparação...

— Você conhece a anedota do bancário que pediu a mão da moça que não o conhecia e que, a uma observação como a sua, respondeu que há anos vinha fazendo a contabilidade da conta do pai dela? Pois é bem isso o que se passou comigo. Eu venho observando-a como empresária e como mulher faz tempo. Se não dei nenhuma demonstração de interesse, foi porque julguei que seria considerado muito mais positivo, se o fizesse de repente, sem dar-lhe tempo de pensar em investigar o meu passado. Caso queira perguntar-me alguma coisa, não se acanhe. Estou pronto a revelar-lhe tudo.

— E onde fica o amor?

— Basta-me sua amizade. Se você me quiser bem e me tolerar, tenho a certeza de que seremos excelentes companheiros. Não se esqueça de que tenho propriedades e um belíssimo escritório, com farta renda, de sorte que todo o seu dinheiro permanecerá intocado por mim, tanto que o nosso casamento haverá de ser sem comunhão de bens. Acho que estou sendo muitíssimo claro, direto e honesto.

— Supondo que eu aceite, onde iremos morar? Não se esqueça de que tenho uma filha adolescente de dezessete anos que mal está começando sua vida de relacionamento amoroso.

— Eu não vou querer ser nem pai nem padrasto para minha futura enteada. No máximo, posso fazer o papel de tio ou de avô. Perguntado, respondo. Instado, vou passar a responsabilidade para você. Ela não recebe a visita do pai?

— Mais do que eu gostaria, ainda mais agora que a mesada dela está mais gorda e ela tem como patrocinar almoços e jantares para ele e para os outros filhos menores. De quebra, ele sempre vem acompanhado da atual esposa.

— Tudo indica que ela se sente à vontade de perguntar qualquer coisa a ele, mesmo porque, se perguntar a mim, talvez eu não tivesse presença de espírito para responder à altura.

— Agora você está querendo enrolar-me. Com toda essa lábia de advogado, está querendo dizer que não teria palavras...

— Conforme o assunto, eu mal sou capaz de movimentar a cabeça com um sim ou um não meramente abonatórios. Mas você está estendendo por demais o tempo que lhe dei para a minha resposta. A sobremesa está chegando e eu ainda não senti aquele gostinho doce de seu sim.

— E se eu disser não?

— Deixo de pôr açúcar no café para manter o gosto amargo na boca.

— Já que você vem propor-me casamento sem nenhum gesto meu de aprovação prévia...

— Eu pensei que você não iria opor-se, já que lhe ofereço continuar com sua inteira liberdade de ação, podendo até, respondendo à sua pergunta anterior, continuar residindo no seu apartamento. Disse-lhe que desejava uma companheira, não uma esposa, propriamente dita. Uma pessoa com quem eu possa manter uma conversação deste caráter, sem tédio, sem sentimentalismos gosmentos, sem palavrinhas pegajosas, dessas que os namorados trocam na falta de coisa mais séria para falar.

— Quanto a filhos, você vai querer tê-los?

— Isto vai depender de você. Quem eu acho que deve determinar se deve ou não passar por longos períodos de gestação é a mulher. Eu estarei de acordo com o que você decidir.

— E vai querer ser pai de seus próprios filhos?

— Se eu criar amor por eles, o que me parece absurdo não acontecer, é claro que me esforçarei por dar-lhes a melhor criação e educação.

— E carinho e afeto e companheirismo, naturalmente...

— Naturalmente, é uma boa palavra, ou seja, seguindo o curso da natureza.

— E vai levá-los ao culto, à igreja...

— Essa parte eu acho que cabe à mãe, mas, se você achar que eu preciso exercer...

— Olegário, querido, você está sobrecarregando-me de responsabilidades. Assuma o seu dever integralmente, por favor.

— Não precipite conclusões. Você nem me respondeu de modo afirmativo, eu já tomei o café com adoçante, a conta foi paga, existem fregueses esperando que a mesa seja liberada, e você está acusando-me de desleixar a educação das crianças? Tem muita graça.

— Vamos continuar a conversa no carro.

— Vamos.

No caminho, de braços dados, ambos mais pareciam um velho casal discutindo sobre problemas da vida em comum do que noivinhos prestes a contrair matrimônio.

Acomodados no carro ainda dentro do estacionamento, Rosalinda disparou a questão que lhe parecia crucial:

— Como você se comporta na cama?

— Você quer saber se conheço a anatomia feminina?

— Pode ser. Aliás, eu quero saber se você conhece os requisitos para dar satisfação física à sua parceira.

— Perdi a conta das mulheres que estiveram comigo.

Para não deixar a impressão de que havia alguma a quem ficara devendo assistência, arrematou:

— Nunca me deixei enrabichar por nenhum rabo de saia, como se dizia antigamente. Todas as minhas conquistas foram meramente financeiras.

— Então, você achou que, ficando comigo, ainda que com papéis passados, poderia manter o mesmo ritmo de vida sexual, com a diferença de que terminava com a variedade, mas tinha a segurança de uma companheira saudável e voluntariosa, capaz de lhe propiciar o mesmo prazer apressado das aventuras de uma hora?

— Se eu lhe ofendi, queira perdoar-me. Não quero que você me responda agora. Devolva-me o anel. Vamos encontrar-nos mais vezes, onde e quando você estabelecer e continuaremos a expor nossos pontos de vista, até o momento em que você compreender que estou oferecendo-lhe uma vida sossegada a dois, ou eu entender que a sua maneira de ser impede que haja uma empatia sentimental entre nós.

De fato, nos três meses seguintes, encontraram-se amiúde, em almoços e jantares íntimos, até que Rosalinda acedeu em conhecer a garçonnière. Foi lá que ela colocou o anel no anular da mão direita, prometendo que o usaria até estarem diante do juiz de paz.


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