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Roteiro_de_Filme_ou_Novela-->Renasci para o amor -- 18/07/2016 - 06:04 (João Rios Mendes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

“Camélia, que felicidade é essa?”

“Hoje encontrei o Zé...”

“Zé?”

“É, aquele Zé...”

“Nossa, ainda Zé morcego. Fazem o quê? 50 e tantos anos?”

“62.”

“Impossível, sou mais velha que você e não tenho toda essa idade...”
Falei fingindo que acreditava, que não sentia em cada pedacinho do meu corpo, do direito e do avesso, o peso da passagem do tempo. Impossível, era esse fulano, depois de tanto tempo botar brilho nos olhos da minha irmã.

Camélia foi uma menina alegre, olhos verdes intrigantes, dessas meio avoadas, que acreditam que príncipes encantados usam camisas de renda e ternos de veludo verde-musgo, que sempre chegam em alazões. Que são gentis, adiantam-se a abrir portas e puxar cadeiras; beijam as mãos ao chegar, muitas vezes com os joelhos no chão, sempre olhos nos olhos da amada!

Foi apresentada a José, por um amigo do grupo escolar. Porte de príncipe? Nada disso! Um Zé ninguém, magricela como tantos por aí... Uma timidez de dar dó.

Ah, que poder tem a imaginação! Penso até que a capacidade imaginativa de cada criatura esteja diretamente ligada ao coração, sequioso de afetos, em sua interminável busca da cara-metade. Muito daquilo que vemos no outro diz mais respeito aos nossos desejos do que ao que o outro é de fato, e seguimos transformando os amores em uma sequência de expectativas frustradas.

Zé olhou-a da maneira habitual que rapazes olham as moças bonitinhas, principalmente as ingênuas, olhar de gato que viu camundongo amedrontado... E preparou o salto!

Camélia nunca foi inconsequente como eu e tantas meninas da nossa geração. Éramos borboletas desatinadas, pousávamos aqui, pousávamos ali, sorvendo néctar sem polinizar a flor, pouco nos importávamos se os amores viriam a frutificar a seu tempo! Mas Camélia não, ela era uma romântica e deu-lhe logo um passa-fora, tipo salto agulha bem colocado no lugar certo (salto agulha tem tanto poder de ferir quantos os punhais que pai nos deu). Feriu a ele e a ela também.

Os morcegos vampiros são uma minoria bem pouco expressiva, levando apenas a fama de sugar o sangue de indefesas presas até a morte! Na sua grande maioria alimentam-se de frutos ou néctar. Alguns beijam as flores noturnas salpicadas aqui e ali. Sua língua comprida alcança o profundo cálice de alguns tipos de flores da noite. A flor, de sua parte, se entrega à estranha cópula e, logo após, desprovida de seu néctar, fenece! Ao primeiro raiar do dia, definha lentamente, para que surja de seu pedúnculo um fruto colorido e suculento, que por sua vez atrairá outras espécies de morcegos, os que se assemelham a passarinhos. Em cada um desses arroubos de paixões tão primitivas, as criaturas em busca da sobrevivência, seja borboleta, morcego ou flor... Sempre presente, ele: o beijo!
Talvez, desse para definir assim, um soturno morcego, esse tal Zé.

Tão logo foram apresentados começou o jogo. Insinuações e provocações de ambos os lados. Adversários de igual quilate, medindo forças a todo instante. As armas? Sagacidade, pele e sorrisos. Que sorrisos tinha Camélia! Capazes de desmontar qualquer timidez. De tirar da marcha qualquer pelotão, por mais que o capitão insistisse em manter o compasso ao rufar do bumbo. Pouco a pouco, quebravam-se as resistências, perceberam-se outros olhares, admiraram-se, enterneceram-se ...

Camélia desatinou. Do jeito intenso que desatinam jovens amantes desde que o mundo é mundo. Não durou. O destino, “mestre em dar nós”, descobriu a pobrezinha que ele era noivo de Margarida, a enganava deliberadamente. Efervescência de sentimentos, amor, ódio, dor... Todos se sobrepondo ao mesmo tempo. Isso durou. Lembro da tristeza e desesperança escurecendo o coração de Camélia.

Cada qual pro seu lado. Passaram-se os anos, ela dona de si, do mundo, da família que construiu.... O tempo age silenciosamente, conspirando sempre em favor das criaturas... Colocando brilho nos olhos da gente, sem considerar as rugas na pele que emolduram esses olhos.

Repentinamente ela dobra uma esquina e lá vem o destino mestre em dar nós... Cara a cara, os dois! Assim, de supetão! Verde e preto! Olho no olho! Verde olhos de Camélia... Negros olhos de José! Mesmo brilho, mesmos mistérios, mesmo rufar dos corações.

Sem amarras para amar, saem pela praça, caminhando tranquilos, relembrando a juventude distante... Lembranças aprisionadas na mente! Rebusca na memória um momento quase perdido nas rodas do tempo... Zé, eterno romântico, tímido.

“Amélia ele pediu: ‘Me dê sua mão! Feche os olhos’. Apertou forte minha mão... Prendi o fôlego! ...Pensei que fosse me roubar um beijo! Não roubou, só fez pedir pra eu ouvir o canto das aves, sentir o vento no rosto, o perfume das flores e guardar para sempre aquele momento. Guardar num lugar mágico, só nosso.”

“Sempre achei que esse Zé tinha cara e tipo de morcego.”

“Pode ser, se for, Zé sugou todo o meu néctar e tal qual uma flor renasci para o amor.”




Aspas para J. G. de Araújo Jorge
Colaboração de Jeanne Martins e Ângela Fakir
Fotos de Jeanne Martins
Morcego extraído da internet, autor não identificado
Arte Stephany Vitória

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