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Contos-->"GOLF SIERRA BRAVO" NÃO RESPONDE! -- 30/08/2009 - 18:21 (Gabriel de Sousa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Como em todas as primeiras segundas-feiras de cada mês, Michael levantou-se mais cedo do que habitual, arranjou-se, tomou um café, despediu-se da mulher e desceu até à garagem para pegar no carro. Àquela hora ainda não havia engarrafamentos e o trajecto duraria cerca de 30 minutos. Ligou a telefonia para ouvir as últimas notícias e rumou ao aeroporto.
O locutor anunciava que tinha sido decretado o alerta laranja em virtude dos serviços secretos britânicos terem recolhido fortes indícios de que se prepararia um ataque terrorista na capital britânica.
Chegado a Heathrow, estacionou o carro, pegou na pasta, tirou uma pequena mala do porta-bagagem e dirigiu-se à zona de check-in. Procurou um dos balcões que indicava como destino Moscovo e entregou o bilhete juntamente com o passaporte. Recebeu o cartão de embarque, passou pela tabacaria onde comprou um jornal, fez fila na polícia de fronteiras e nos filtros de segurança e dirigiu-se calmamente para a sala de embarque. O avião já estava encostado na “manga”, embora ainda faltasse muito tempo para a partida.
Sentou-se e pegou no jornal, passando os olhos pelos principais títulos. A vaga de frio moscovita, já com algumas vítimas a registar, tinha direito a notícia de primeira página. Era em Moscovo que a sua empresa estava a investir num importante complexo turístico, adaptado à clientela ocidental, ultramoderno mas respeitando simultaneamente as características e os costumes locais.
Michael perguntou-se, mais uma vez, se haveria clientela suficiente para rentabilizar o empreendimento. Olhou mesmo ao redor, para tentar descobrir o tipo de pessoas que, naquele dia, rumavam à capital russa. Na maioria, pareciam homens de negócios. Viam-se poucas famílias e raras pessoas com ar de turistas. Chamou-lhe a atenção um grupo de quatro passageiros, mesmo junto a ele. Não os conseguiria catalogar em qualquer das categorias citadas. Falavam uma língua estranha que, apesar dos seus rudimentares conhecimentos, poderia afirmar que não era o russo. Lembrou-se que talvez fossem marinheiros, dado o seu modo despreocupado de vestir. Um, com uma longa barba quase totalmente branca, era incrivelmente mais pequeno do que os outros e também mais velho.
Michael preparava-se para dar uns passos e “desenferrujar” as pernas, quando chamaram para o embarque.

Ouviu-se o barulho das portas do avião a fechar-se, os anúncios da praxe e em breve se sentiu o solavanco do avião, vencendo a inércia quando começou a ser rebocado. Depois, o lançar dos reactores, a rolagem e a espera de autorização para descolar, algures na cabeceira da pista. Corrida desenfreada e a agradável sensação do solo ter ficado para trás, com o avião a subir e a fazer simultaneamente uma graciosa curva para a direita.
Depois, já em altitude de cruzeiro, a azáfama do pessoal de bordo que se preparava para servir o pequeno-almoço. Os já referidos quatro passageiros, exprimindo-se agora num impecável inglês, declinaram a refeição e pediram jornais do dia.
Michael colocou no assento ao lado, que estava livre, os dossiers relacionados com a sua missão em Moscovo e preparou-se para saborear o repasto.
Os passageiros, que vimos seguindo mais atentamente, retomaram a conversa, na tal língua desconhecida, parecendo comentar as notícias que estavam a ler. Passado algum tempo, abandonaram a leitura e levantaram-se, indo dois para a dianteira do aparelho e os outros para a retaguarda.

A viagem decorria agradavelmente. Michael voltara a mergulhar no estudo dos seus dossiers. O sucesso daquele empreendimento, que estava quase finalizado, era condição sine qua non para que pelo menos mais dois projectos fossem levados a cabo em território russo.
«Senhores passageiros: é favor reocuparem os vossos lugares, endireitarem as costas das cadeiras e apertar os cintos de segurança. Por razões de ordem operacional vamos fazer uma escala em Teerão, onde aterraremos dentro de meia-hora». O anúncio foi feito primeiramente em inglês e depois em russo. Michael estranhou aquela escala não prevista, mas já antes lhe tinha parecido que o avião mudara de rumo e tinha começado a descer. Endireitou o assento, apertou o cinto como era pedido e reparou que “os tais” quatro passageiros ainda não tinham regressado. As hospedeiras e os comissários que percorreram o avião, olhando para um lado e para outro da cabina, pareciam ter um ar assustado.
Ouviu-se um estampido, outro e outro. Pareciam tiros, embora com um som abafado. Depois o ruído característico de rajadas de metralhadora. O avião perdeu altitude duma maneira brutal. De algumas bagageiras, que não tinham sido fechadas, tombaram malas e objectos dos mais variados. Michael lembrou-se de ter ouvido dizer que nos voos britânicos e norte-americanos havia a presença de seguranças especiais e voltou a pensar nos quatro homens que não tinham voltado para os seus lugares. O avião continuava a perder altitude e ouviam-se já gritos de vários passageiros. Ausência total de outros anúncios. O avião parecia desgovernado.
No solo, entretanto, o serviço de controlo aéreo que se ocupava daquele voo chamava-o em vão. «O WW-227 Golf Sierra Bravo não responde». Todos os serviços de alerta e salvamento foram avisados. Dois aviões e vários helicópteros dirigiram-se para o local de onde o comandante comunicara pela última vez, dizendo que «estava a ser obrigado a divergir» para a capital do Irão.
Numa zona algo montanhosa foram avistados os destroços do aparelho, lambidos pelas chamas. Equipas de salvamento dirigiram-se para o local, que só conseguiram atingir passadas algumas horas. Deparou-se-lhes uma paisagem dantesca. Tudo ardido ao redor, ferros retorcidos e cheiro a carne queimada. Quase todos os corpos estavam carbonizados. A um dos socorristas pareceu-lhe ouvir gemidos. Dirigiu-se para o local donde viera o som e descobriu uma pessoa miraculosamente viva. Evacuação rápida por helicóptero. Tratava-se do cidadão britânico Michael Anderson, em viagem de negócios. Foi o único sobrevivente. Esteve hospitalizado com múltiplas fracturas e algumas queimaduras graves, mas desde logo livre de perigo.
Logo que os médicos o permitiram, foi ouvido pela polícia de investigação antiterrorista, respondendo a todas as perguntas que lhe foram feitas e contando tudo o que tinha observado. Os investigadores, após a primeira análise da caixa negra do avião e dos destroços do aparelho, depois do exame exaustivo à lista de passageiros e aos corpos das vítimas, já tinham chegado a várias conclusões. O avião havia sido desviado da sua rota normal por um grupo auto-denominado “Luta e Resistência, Chechénia ou Morte” que aliás reivindicou o acto em comunicado enviado para os jornais. Os tiros disparados a bordo e que tinham sido ouvidos por Michael provinham das armas dos dois seguranças que se encontravam a bordo, mas também duma metralhadora ligeira dos sequestradores. Algumas balas tinham atingido o comandante e o copiloto, bem assim com a estrutura do avião. Ignorava-se ainda o modo como eles tinham conseguido introduzir a arma dentro do aparelho. Michael quase iria jurar que eles não traziam quaisquer objectos nas mãos, um pormenor que lhe tinha escapado, mas que agora lhe entrava pelos olhos dentro. Os corpos de três foram identificados, todos cidadãos russos nascidos em Grozny, Chechénia. De um, chamado Oleg Tcherinov, não foi encontrado o mais pequeno vestígio, tudo levando a crer que o seu corpo tivesse sido completamente calcinado pelas chamas.

Logo que foi possível, Michael foi repatriado para Inglaterra onde se encontra ainda em convalescença, se bem que já em sua casa. O que mais deseja agora é tentar esquecer tudo, regressar ao trabalho e aproveitar melhor todos os seus tempos livres, para estar junto da esposa e do filhote de dois anos.
Já passaram dois meses sobre o sucedido. Despreocupadamente, ligou a televisão para ver o Canal de Notícias e, principalmente, para ouvir as previsões meteorológicas para o fim-de-semana. Seria o seu primeiro passeio e projectava passá-lo em casa de uns amigos em Hatfield, nos arredores de Londres.
O noticiário abriu com esta notícia: «O grupo terrorista “Luta e Resistência, Chechénia ou Morte” acaba de fazer chegar à nossa redacção uma cassete de vídeo, em que o seu líder declara guerra total aos interesses russos e dos seus aliados em todo o Mundo, até que seja reconhecida a independência total da sua Pátria». O jornalista relembra que aquele grupo tinha sido responsável pelo recente sequestro e queda de um avião britânico que se dirigia para Moscovo.
Michael Anderson, incrédulo e de olhos muito abertos, reconheceu na pessoa que falara no vídeo, Oleg Tcherinov - o “homem com uma longa barba quase totalmente branca, incrivelmente mais pequeno do que os outros e também mais velho”… Esfregou os olhos com as mãos, como que estremunhado ou acabado de sair de um sonho, quase não acreditando no que acabara de ver. Como era possível ele estar vivo? Tinha de avisar a polícia. A ameaça devia ser levada muito a sério!




NB – Menção Honrosa no I Concurso Literário da Associação Nacional de Poetas e Prosadores - 2009

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