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Cronicas-->MINHA CRÓNICA DE CADA DIAS - FIM DE FESTA -- 14/08/2005 - 16:16 (Francisco Miguel de Moura) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
MINHA CRÓNICA DE CADA DIA(4)
Fim de festa


Francisco Miguel de Moura*


O mundo nos apronta as "suas".
Hoje é sábado. Pela manhã fui ao clube assistir ao lançamento de livros de dois autores, um vivo outro falecido. Com relação este se homenageava o centenário de nascimento do poeta Máximo. Magistrado, boêmio bem comportado, quando aposentado recitava poesias de sua lavra, geralmente engraçadas, paródias, críticas ao governo e à sociedade. À parte os discursos, que causaram tédio à platéia, muita gente com quem falei depois, no coquetel, conversava alegremente. Eu correspondia.
Mas volto à hora inicial dos autógrafos. O velho Moreira, que já não sabe das coisas da realidade, em virtude de suas mazelas circulatórias, já nem conhece mais os próprios colegas, havia subido ao palco, a chamado do presidente. Ele não havia sido convidado para fazer parte da mesa, inicialmente. Foi em respeito a sua idade - 80 anos - que lá foi posta uma cadeira, na última hora, onde se sentou e ficou a cochilar muito ancho.
Quando pendia a cabeça, todos nós meditávamos:
- "Um dia vamos chegar lá!"
Caiu ao descer uma escadinha de dois degraus e deu um grito alto.
Como socorrê-lo? Eu não soube. Ouvi gritos das mulheres da assistência.
- Cadê seus filhos, seus parentes, o seu motorista?"
Procura-se de um lado, busca-se de outro até que apareceu. Não fiz nada, fiquei paralisado. Antigamente eu sabia o que fazer. Hoje, minha saúde não permite, inclusive a espiritual. Sou fraco, não creio muito no que dizem as religiões. Tudo o que fiz, devagar, foi sair procurando um parente do velho Moreira.
Ninguém era, ninguém sabia.
- "Como é que deixam uma criatura dessa idade sair de casa sem ser acompanhado por um filho ou parente próximo?" - sussurravam.
O acidentado sangrava. Pancada na cabeça. Felizmente havia um médico na assistência - não, sentado à mesa da solenidade - e tudo ocorreu da melhor forma.
Vi marcas de sangue no piso sobre o qual pisei. A maca passou por mim, suspirei, senti o cheiro (ou mau cheiro) de defunto.
Amanhã ou segunda-feira saberei como ficou o colega que foi para o hospital.
"Será que chegarei vivo ao meu centenário? Poderei, caso contrário, daqui a cem anos estar sendo homenageado como o outro, o poeta, o boêmio Maximiano, ora chamado Máximo".
O certo é que cheguei a casa deprimido. Almocei. Qualquer barulho ou pancada me impressionava. Mas dormi pesadamente e tive um horrível pesadelo. Meu filho chegava e desmontava todo o meu computador, tudo era sujo lá dentro. Outra máquina minha, não sei se de fotografia, também era atingida. A mesma porcaria por dentro.
- "Agora você vai ajeitar tudo, não sei mexer nisto".
Por aqui o sonho terminava.
Levantei com vontade de lembrar, e por que não contar, uma passagem alegre, em uma das próprias reuniões do clube, ocorrida entre o velho Moreira - ali deitado na maca, diante de tanta gente - e o poeta Henry James. Aquele apresentava um poema do tempo em que era jovem e foi poeta, como todos os adolescentes, mas lia-o com muita dificuldade por causa da vista. Era um bom soneto, mas o poeta Henry James Júnior, mestre na arte de sonetear e um pouco gago, tomou-lhe das mãos e disse:
- "Deixe que eu o leia".
- "Mas se gaguejar, eu o retomo".
O poeta foi recitando, tropeçou, enfim gagueja.
A gargalhada foi geral, não pela má récita, mas pelo avanço do velho Moreira sobre o papel do soneto, como reprovação da leitura.
Assim termino o dia, pensando em risos, coisa boa para a alma. Deixo que as ruins se extingam sem minha atenção e memória.

___________________
*Francisco Miguel de Moura, escritor brasileiro, mora em Teresina, endereço: frnciscomigueldemoura@superig.com.br e saite www.usinadeletras.com.br
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