Alquimia Alucinada
“A morte já é depois, já não haverá ninguém” Gilberto Gil
“Aí onde minhas palavras revejo, / Nenhuma parábola omitir ensejo” Nicholas Flamel
Há algo ali no vão do nada,
O Altíssimo ouve a palavra vaga,
Flamel flaneur olha a almofada
O Atanor incandescia, Rogério divaga...
Até o que ia já não mais há aqui,
Ai de mim, ai de mim que para ti,
Em Parati, na feira, livros que li
Dizem que há algo ali...
A figura alucinada
Nas cores e nas formas
Vejo a coisa que não se vê iluminada,
Se reforma a aura deformada...
O leão verde impassível
Ruge e engole o Sol,
O sangue solar é visível
E o Sol de si se deixa em si bemol...
O rei de duas cabeças voa
Apoiado na cobra de três cabeças
De cão! Numa mão ergue à toa
A taça de três serpentes e noutra mão uma só peça...
A árvore frutifica onze sóis,
A ave voa ao ninho
E dá alimento às três crias reinóis,
Atrás o leão observa sozinho...
Solutio Perfecta, Putrefactio,
Caos Veterum, Subfecto Químico...
Distilatio Físico, Preparatio Físico,
Da Divisão, Aquatio...
Leo Virids, Coito,
Lápis Trinus, Calcinatio,
Sublimatio, Solutio,
Genaratio...Putrefatio...
Conceptio, Impregnatio,
Fermentatio, Separatio,
Conjuntio, Outra vez Separatio,
Conjuntio novamente, por fim separatio...
Repita-se a operação diariamente,
Todo dia, uma vez ao dia
Uma vez de noite, continuamente
Até o dia que findar os teus dias...
Qual o segredo? Qual o mistério?
Estranho levedo... Diáfano saltério...
Do que temos medo? Destes impropérios?
Nunca é tarde ou cedo... Para ruir um império...
A pedra filosofal acaso existe?
Sim, eu a tenho, roubei de ti...
Mas ainda não sei ligá-la, estou triste...
Muito embora o quanto já li...
Mas já sei alguma coisa inútil...
Que o que está ali em palavras,
Esconde a mais dura lavra
Como uma túnica inconsútil!
O cemitério de meu ego,
Em que corpos-pensamentos
Esperam o juízo final que nego;
À imaginação seus ávidos momentos!
Ser um alquimista alucinado,
Num laboratório imaginário,
Sonhar na ligação química do inventário
Do real ao ilusório ressignificado!
Renascer, rejuvenescer, ressuscitar...
Ser eterno além da morte,
E antes de reviver, com fortuna e sorte,
Viver mil vezes para amar...
Vieram me mostrar o segredo,
Achei graça, afinal se diz que é a fé,
Mas não há nenhum segredo na fé,
O segredo está no não haver segredo...
Há algo ali no vão da eternidade,
Que repousa freneticamente
Como um quark, uma corda, uma singularidade
Que ressoa muda no vazio oco do fim da mente...
Surgindo como um gesto de despedida,
Na luz extrema da operação alquímica,
Minh’alma num gesto de quase mímica
Mostra-me o segredo da vida não vivida!
O Azul do céu azula no olhar
E a alvura das nuvens abre-se em formas
Mas os olhos que vêem só podem sonhar
E o branco brinca de recriar vagas normas...
Há algo ali no vão do nada,
O Altíssimo ouve a palavra vaga,
No fundo do olho na imagem obliterada
No espelho que reflete a minha saga!
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