VIAGEM DO JACÔ II
Jacornélio M. Gonzaga (*)
Eu vou pra Jaconerlândia eu vou
Eu vou de uniforme branco eu vou
Eu vou de chapéu de palha eu vou
Eu vou convidar Wanda (1) eu vou
Se Wanda não quiser ir eu vou só
Eu vou só eu vou só
Se Wanda não quiser ir eu vou só
Eu vou só eu vou só
Sem Wanda, mas eu vou.
Podem falar o que quiserem, mas admiro muito o bom gosto do nosso atual mandatário da Nação brasileira. Gosta de bebidas finas, comidas exóticas, charutos caros, roupas da moda. Enfim, é um verdadeiro "patricinho". Após um ano de governo, cansado de esperar carro de boi em estrada e ônibus de linha urbana, resolveu comprar um avião só para ele.
Puxa-saco como sou, pensei que me convidariam para compor a comitiva de sua viagem oficial a Jaconerlândia (2), ocasião em que lula inauguraria o seu novo brinquedo. Pensei errado, não sei a razão, mas a viagem foi suspensa. No entanto, "seu apolônio" telefonou-me e disse que o presidente queria que eu fosse imediatamente a Jaconerlândia, para tratar do investimento do Fundo Nacional de Pensão dos Anistiados Políticos (FUNPAPOL), no projeto de "traçar uma função social" para as Forças Armadas daquele país.
Peguei um avião e lá fui eu para aquele paraíso tropical. Ao desembarcar, vi a razão pela qual a viagem oficial havia sido suspensa. Em nome da reciprocidade, as autoridades jacornelianas de imigração estavam identificando todos os brasileiros que chegavam ao país. Para agilitar o processo, numa clara tentativa de demonstrar que não se tratava de retaliação, lá estavam dez lambe-lambe, fotografando, e dez baldes com tinta preta, para a realização da identificação plantar.
Fiquei diante de um dilema: esperar na fila e sujar os pés ou subornar uma agente do Bureau Federal de Investigação de Jaconerlândia. Não deu outra, um "galo" brasileiro liberou-me daquela burocracia.
Enquanto aguardava os "procedimentos" de liberação, comecei a ler um jornal local, "A TOCHA", edição do dia anterior. O grande destaque era a recente visita feita por Robalo I à Beócia, onde havia recebido o título de doutor honoris causa da maior Universidade daquela antiga província grega. Robalo I gostou tanto do título, que resolveu mudar seu cognome. Não mais seria o Ignorante, pois agora possuía um diploma de doutor; teve somente uma dúvida: adotaria a expressão grega, o Boiótios ou a latina, o Boeotiu?
Mais uma vez, Daniel Perseu, o rasputin de Jaconerlândia acorreu em defesa do monarca: Meu Rei, se Vossa Alteza escolher qualquer um destes cognomes de origem grega ou latina, é possível que o povo passe a chamá-lo de o Boiola, portanto sou de opinião que o Sr adote o nome fantasia de Rei Robalo I, o Beócio. E assim, nos jornais do dia, lá estavam estampados o novo cognome.
E eu esperando!!!
Comecei a ler o último número da revista de maior circulação em Jacornelândia, o semanário "OLHA", que, dentre outras reportagens "chapa branca", trazia uma que enaltecia, descaradamente, a compra de um novo avião por parte do Rei Robalo I, agora, o Beócio. Lembro-me que, anteriormente, quando o governo republicano de Jacornelândia tentou adquirir um avião novo, a marreta foi total. Novos tempos ou novas verbas publicitárias?
E eu esperando!!!
Continuei a folhear a "OLHA" e encontrei outra reportagem interessante, que tratava de assuntos ligados às Forças Armadas do País. O Rei Robalo I, o Beócio, ao assumir a monarquia, preocupou-se, de imediato, com o poder militar do País. Queria saber de tudo. Junto com o primeiro-ministro Daniel Perseu, começou a verificar e opinar sobre os projetos de cada Força:
- Programa de Exploração da Antártica: "Trago Darisa para o Palácio para afastar-me da bebida e vocês querem que eu jogue dinheiro público numa cervejaria. Corta o Programa".
- Programa Calha Sul (em conjunto com outros ministérios): "Por que somente colocar calha no sul do País, quero no norte, no leste e no oeste. Melhor ainda, somos uma ilha, ponha calha em volta de tudo. Não quero ver goteira em nenhum lugar".
- Programa Espacial: "Isso é que é jogar dinheiro para o espaço, suspende. Procurem algo não que jogue nada para o alto, no meu governo programa nenhum vai decolar, temos que governar com os pés no chão".
- Perseu, diga-me uma coisa: os milicos só têm esses programas, nada no rádio ou na televisão?
- Não, meu Rei, estes meios de comunicação estão com a programação fechada para o Partido Monarquista, mas vou providenciar um pequeno papel coadjuvante para eles em vosso reinado. Talvez no circo voador!
Finalmente o agente federal chegou com minha liberação. Atravessando o saguão do aeroporto deparei-me com as esfuziantes passistas da Real Escola de Samba Trabalhadores e Operários, a famosa R.E.S.T.O., que tentavam, a todo o custo, minorar o espetáculo de imbecilidade proporcionado pelas autoridades migratórias de Jaconerlândia. Era o que restava inventar: o circo sem pão!
Fui para o hotel descansar. Era o que restava fazer.
***
Um leitor de nossos escritos - permita-me dizer – não tão bem informado como eu, escreveu que a Base Operacional dos Sem Terra Autênticos (B.O.S.T.A.) ficava no Palácio do Planalto. Enganou-se o nosso leitor, a B.O.S.T.A. fica em toda a Esplanada dos Ministérios, à exceção de alguns blocos (M, N, O). No Planalto fica somente o comando da B.O.S.T.A.
(1) Codinome usado por Dilma Vana Rousseff Linhares, quando atuava na ONG Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-P), até ser presa em 16 Jan 1970.
(2) Jaconerlândia é um país insular, localizado no Atlântico Sul. Depois de anos de ditadura, houve um movimento popular que mudou o regime de governo. Jaconerlândia passou a ser uma Monarquia Popular Sindicalista, seu mandatário é o Rei Robalo I, o Ignorante e o primeiro-ministro é um antigo entregador de pizza Daniel Perseu.
(*) Jacornélio é compositor, caixeiro viajante e diretor-geral do Fundo de Pensão dos Anistiados Políticos (FUNPAPOL). Tem contado com a colaboração dos passistas Paul Windows Word Spin e Miguel Sancho Quesada de Cervantes y Saavedra para levar a alegria do circo aos leitores, tendo em vista que o pão está muito caro.
23 de janeiro de 2004 e-mail: jacornélio_@hotmail.com
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