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Roteiro_de_Filme_ou_Novela-->CHUVA DE ESTRELAS -- 03/05/2010 - 06:02 (Vera Linden) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

NÃO É AINDA UM ROTEIRO, É UM ARGUMENTO.

Chuva de Estrelas

Argumento: Por Vera Linden


Há sete anos, o povoado de Pedreiras se ressente da falta de uma boa chuva.O chão está com grandes rachaduras. Caminhar com os pés descalços é uma tortura. A maioria das pessoas que aqui vivem, ou melhor sobrevivem, dependem da compaixão e da benevolência dos poucos abastados do lugar. A água vem de dois poços artesianos e, é cobrada uma taxa por ela, como nas grandes cidades. Há uma espécie de bica na praça e lá, como um cão de guarda, rifle atravessado no peito, está João do Ouro, a vender a água em litros. Padre Tomás chega e inicia o seu diário sermão sobre o crime, a canalhice que é vender água para o povo que já pagou mil vezes pelo tal poço. João do Ouro empurra as pessoas com o cano de seu rifle e se dirige ao sacerdote. Manda-o embora para a sua igreja. Diz que o serviço dele é com as almas e não com os corpos dos viventes. A voz do capanga de Cirino Malheiros é calma, quase carinhosa. Faz questão de lembrar que desde que o padre chegou não choveu mais. Padre Tomás abaixa a cabeça desanimado. Olha para o chão e diz em voz alta, em um monólogo maluco, que ele está assim por dentro, todo rachado, seco. O povo paga cada moeda do pedágio da água, sem protestar. Também estão secos por dentro, sem forças para qualquer atitude ou revolta. Um velho comenta, que nem mosca mais há no povoado. Até os insetos sucumbiram à seca.Como um cão raivoso, mas covarde, o capanga rosna entre dentes, que se Tomás não fosse irmão de criação do patrão e não vestisse aquela batina, já estaria morto há muito tempo.Ele não quer se arriscar, porque matar padre ou freira dá sete anos de azar e por ali, já tem azar demais. O povo sai carregando como um tesouro, as suas latas de água na cabeça, arrastando-as, de dois em dois, como dá no jeito. Ninguém, sorri ou fala mais alto. São tristes e cabisbaixos.Padre Tomás se dirige ao seu destino habitual: o bolicho de Pedro Martins e ao encontro da cigana Lolla.Dois velhotes carcomidos como a terra, pitam seus palheiros e comentam as desgraças do religioso. Um deles comenta que Tomás vai encher a cabeça de cachaça, para esquecer da vida e fornicar com a cigana, aliviando a sua outra cabeça.

O Padre entra no estabelecimento e o proprietário comenta com ele e os outros fregueses, que o “reverendo” (como gosta de chamá-lo) está quase meia hora atrasado. Tomás bate com as palmas das mãos no balcão e pede a sua garrafa de cachaça de sempre, da braba, daquela que mata logo. O homem gorducho, baixote e feio sorri, mostrando os caninos e incisivos de ouro e lhe diz que Lolla não gosta de bêbados, que ele beba depois. Lolla chega e tenta abraçar Tomás pelas costas. Ele não gosta e empurra a cigana. Ela se desequilibra, mas segura-se em uma mesa e não cai.Ele puxa a mulher por um braço e passam por uma abertura fechada com uma cortina de sacos, onde há uma porta improvisada.

O lugar nos áureos tempos da extração de ouro nas montanhas de Pedreiras, servira de baias para os cavalos dos mineiros. Pedro Martins transformou tudo em “quartinhos de encontros” para as suas meninas: as argentinas Lolla e Soledad.Na verdade elas não são exatamente portenhas, vieram das bandas de Uruguaiana e “hablan” um poquito de castelhano, mas fica mais chique dizer que vieram de Buenos Aires e dançam divinamente o tango. São um pouco de tudo,as meninas ecléticas: dançarinas, garçonetes e acompanhantes de executivos, como é o caso do padre.

Padre Tomás sai cambaleando do quarto improvisado, depois de ficar por uma hora na companhia da cigana. Ao passar na porta para a do antro de perdição para a rua, como dizem as beatas, desequilibra-se e quase tomba nas velhas escadas de madeira. Outro bêbado o ajuda. O sol forte do meio-dia o cega por uns instantes. Ele se sente mal fisicamente, espiritualmente e até intelectualmente. Na batina há o cheiro do perfume barato da cigana.Aflige-lhe um desespero, uma mistura de culpa, impotência, revolta. Levanta os braços para cima e começa a chamar por Deus. Seus gritos ecoam pela praça vazia. Esbraveja, chama Deus de injusto, de vendido aos interesses dos poderosos, dos ricos que alimentam as igrejas para comprarem a indulgência de um lugar no céu. Diz que as religiões são confrarias de inúteis, bajuladores de milionários. Que padres, pastores, freiras, bispos, cardeais são todos vagabundos, usurpadores e que se Deus existir de fato, fará chover estrelas de diamantes e de ouro sobre o povoado. Que quer ser purificado, que vai fazer o sacrifício supremo para que venha a chuva, a bênção da água em Pedreiras. Pede para ser crucificado na praça, assim como foi Jesus. Começa a tirar as suas vestes. Fica nu deitado no chão, com os braços abertos como se estivesse pregado em uma cruz. Ele chora copiosamente e em voz alta vai confessando os seus pecados. Duas beatas vestidas de preto, com guarda-chuva em punho, observam a cena atônitas. Uma diz que chegou o fim do mundo e a outra passa mal e quase desmaia.

Dentro da Casa Paroquial, Vitiligo, o sacristão, ouve os berros do vigário e se horroriza. Vai na cozinha chamar a mãe, Donaura.
A mulher tira o avental e empurra o filho para a rua. A boa senhora cobre o corpo do padre com uma toalha grande e o levanta do chão auxiliada pelo filho, mesmo este demonstrando pouca vontade em ajudar.
O dois arrastam o padre, que não consegue se manter de pé e parece estar desmaiado. A mulher se preocupa e quer chamar um médico, mas o filho a tranqüiliza, dizendo que é só bebedeira e sexo demais. Ela se aborrece com o filho e de sopetão ergue Tomás nos braços e manda Vitiligo chamar o doutor Mazzetti.

O médico, um descendente de italianos, forte, alto e corado
chega e ausculta o doente. O diagnóstico é o mesmo de Vitiligo. Ele aplica uma injeção de glicose, liga o ventilador e Donaura refresca o paciente com compresas dé água, que já servem para limpar a poeira do corpo. O calor é intenso. Não há ventilador capaz de amenizar aquele inferno, somente um bom ar “refrigerato,” sentencia o médico. Ele sai do quarto e vai para a cozinha. O sacristão come o seu prato de feijão com arroz e lingüiça. Nada de verduras ou legumes, ele odeia estas coisas e acredita que sua doença, o vitiligo, causa de todos os seus pesares e até do apelido, seja produzida por estas porcarias que a mãe lhe enfiava goela abaixo, desde criança. Ele crê, que a mãe é a causa de todas as suas desgraças. O doutor senta na cozinha, com o apetite desperto pelo cheirinho bom da comida de Donaura. Ele diz sem qualquer cerimônia, que só uma mulata forte e sacudida como a caseira do padre para ser boa de cama e mesa. Vitiligo tem ganas de dar um soco na cara do gordão, mas refreia seus sentimentos. O tamanho do carcamano impõe respeito e ele engole em seco. Donaura adentra a cozinha ligeira, com a bacia na mão e a toalha no ombro. Rápida despacha tudo para a área de serviço e convida o médico a sentar na mesa da cozinha mesmo, pois a sala de refeições está arrumada para o jantar do senhor bispo. O médico ateu convicto caçoa com os preparativos dela para receber a “santidade.” Reverendíssimo, corrigi Vitaligo, que não parece, mas lê e pesquisa muito e estudou até a sétima série, antes de ter a meningite. Além do mais, fez curso de ministro e chegará a diácono. O médico entre uma garfada e outra, dá boas risadas e elogia o tempero de Donaura e pela centéssima vez a pede em casamento. O sacristão pega uma faca na gaveta. A mãe percebe e o manda dar uma olhada no padre. Ela junta as mãos e pede a Deus e Nossa Senhora em voz alta, que Tomás esteja bem até à noite, na chegada do bispo.

Na casa mais bonita do povoado, o sobrado azul de Cirino Malheiros, a sua mulher, Mariana, lhe exige uma reunião para resolver assuntos sérios. O marido a recebe a contragosto no escritório. Ela é enfática e firme: ou ele fala com ela ou ela pega a mala e vai para a casa da mãe e leva os dois filhos. Cirino pede que ela seja breve. Ela diz que ele não pode prejudicar o irmão dela. Admirado, ele responde que nunca prejudicou ou prejudicará o sacristão, um pobre coitado, sem importância. A esposa diz que é o outro irmão, o padre. Mais confuso ainda, o homem pensa que a esposa enloqueceu de vez. Então, ela diz que Padre Tomás é seu irmão, filho de sua mãe, Donaura e do jornalista, poeta e bêbado Alcino Cunha. Cirino fica boquiaberto, sem entender nada. Ela explica: a mãe viera com dezesseis anos para Pedreiras, trabalhar na casa de Círio Malheiros (o pai de Cirino). engravidou do poeta e como era uma empregada muito boa e a patroa não engravidava, adotou Tomás, que muitos pensavam ser irmão bastardo de Cirino. Mais tarde casada com o peão Olavo Mendes, ela ainda apaixonada por Alcino teve o Vitiligo e somente ela, Mariana era filha do atencioso Olavo. Cirino levanta da cadeira dando risadas e agradecendo a Deus e à mulher por terem lhe livrada da carga de tantos anos, de pensar que o padreco inútil era seu irmão verdadeiro. Deu um longo suspiro e levantou a mulher do chão em um grande abraço.Ela ainda pede mais uma coisa, isenção nos pagamentos das taxas de água por um mês. Agradecido o subprefeito chama o secretário para criar a lei. Todos saem ganhando com a confissão de Mariana, que só teme a reação de Donaura. Ele pede segredo ao marido e ele não falará nada de desabonador sobre Tomás, no jantar à noite para o bispo.

Padre Tomás acorda. A cabeça pesa toneladas, lateja. Sente náuseas, dor de estômago. Donaura solícita, está do lado dele com um caldinho, sucos, frutas.Mas, ele só quer café ou muito chá. Ela traz o café e insiste para que ele coma o caldo forte e cheiroso. Ela vence, ele senta na pequena mesa do quarto e, após o café amargo e forte, toma o caldo e come as frutas. Ela diz que ele tem o estômago forte do pai. Ele pergunta que pai, porque só conheceu o pai adotivo. Ela disfarça e diz que quis dizer isto mesmo. Ele desconfiara sempre que Círio Malheiros era o seu pai biológico e estranha, pois o homem era famoso por não poder beber e ter estômago frágil. Ele questiona a caseira e ela chorando lhe conta toda a verdade, que o pai dele é Alcino Cunha e ela é a mãe. Tomás a abraça chorando e pode entender todo o seu carinho por ele, desde criança. O padre parece renascer ao ouvir toda a sua verdadeira história, suas origens e ao saber que tem um irmão, uma irmã e dois sobrinhos. Atrás da porta, Vitiligo ouve tudo e sai de casa revoltado.Pensa em se suicidar. Ele não pode ser irmão daquele padre fracote e nem daquela tonta metida à granfininha.Ele sonhava em ser rico, filho ilegítimo de Círio Malheiros, irmão do manda-chuva da cidade. E agora, toda esta decepção.Só resta a morte, um fim honroso.

O Bispo chega com toda a pompa e circunstância.Padre Tomás detesta estas cerimônias, estas visitas. Dom Eleutério Farias é um homem alto, de cabeça grande, cabelos grisalhos bem cortados, olhos verdes, frios e curiosos. O nariz romano é proporcional ao tamnho do rosto. Pode-se dizer que é um homem elegante e muito bonito. Veste um terno preto, bem cortado e exala um discreto e caro perfume. As mãos são másculas e bonitas. Quando Mariana e o marido entram na sala, ele a engole com os olhos. O padre não pode deixar de notar o acontecido.As apresentações e os cumprimentos são feitos e inicia-se a reunião entre o bispo, o padre e o subprefeito. O reverendíssimo quer saber o porquê do convite do governante. Ele esclarece que quer dar uma alegria ao povo, além de esperanças. O bispo não bispa nada mesmo. Então o outro, demagogicamente explica: o bispo vem para reforçar a crença do povo, de que é possível vir a chuva. Ele vem até o povoado, reza a missa, fala com todos e vai embora. Como pelas previsões dos meteorologistas deve haver chuva nos próximos dias, tudo se encaixa.E haverá o milagre, que pode trazer turistas, etc. etc. e progresso para o lugar e há ainda o projeto da piscina pública. O bispo finge ser contra milagres e, o subprefeito quer é enganar e iludir o povo. Mas, então Cirino pega o talão de cheques para uma ajuda à diocese e as dúvidas são imediatamente sanadas.

O jantar é um sucesso. Dom Eleutério começa tímido beliscando a comida cheirosa de Donaura, mas em minutos está mais guloso que o padre de Capela de Sant’anna.( um padre da década de cinqüenta ou sessenta, que ficou famoso por ser um bom garfo, ao visitar as famílias do lugar). É servida a sobremessa. Mariana ajuda a mãe. De repente a sábia senhora lembra que não viu Vitiligo a tarde toda e é hora de arrumar a igreja para a missa, a ser rezada às sete da manhã do outro dia. Ela procura o filho pela casa, pela igreja e nada.Fica nervosa e vai falar com Padre Tomás. Inicia-se as buscas, mas ninguém encontra o sacristão. Donaura chora desconsolada e entende que o Vitiligo deve ter ouvido a conversa dela com Tomás.

Vitiligo está escondido em uma caverna na montanha. Ele tem um plano que o fará famoso, mesmo depois de morto. Ele será um herói camikaze e, o melhor: deixará a mãe preocupada e sofrendo. Ela não lhe deu um pai rico, merece ser castigada. Ele é filho do poeta bêbado, que escrevia para o jornal por comida, pensão e cachaça e que tinha aquelas malditas manchas na pele, assim como ele. Sorrateiramente, à tarde, aproveitando a distração de todos com a visita do bispo, ele foi no depósito de Cirino e pegou armas e munições, inclusive dinamite, para iniciar a sua revolução e ser notado pela mãe e ser famoso.Ele prepara os pavios e no centro da caverna há uma área concretada, donde por uma rachadura corre um fio de água.

Os cidadãos de Pedreiras dormem cedo. O povoado está silencioso, só se ouve o pio das corujas. Mas de repente, um grande estrondo, seguido de um clarão imenso, ilumina o lugarejo todo. Quem não acordou direito e vê as fagulhas e chamas, que parecem ter caído do céu sobre a montanha, podem achar que sejam estrelas cadentes. Para dar uma idéia mais incrível ainda, um grande pássaro incandescente cai sobre as árvores no sopé da montanha. Mas, o mais impressionante é que jorrava água da montanha. Até o bispo se acordou de seu sono profundo, com a barulheira do povo.Donaura e Padre Tomás viram tudo de perto e foram quase atingidos, pois incansáveis estavam à procura de Vitiligo.Uns gemidos sobre as árvores denunciaram o sacristão fugitivo.
A água não veio do céu como previa Dom Eleutério, mas do seio da terra. E uma água abençoada, água saudável, de ótima qualidade. O povo, mesmo na madrugada pegou garrafas e vasilhas e trouxe o líquido precioso de graça para casa. Vitiligo é salvo pelos bombeiros, depois do fracassado suicídio e segue para o hospital, cercado de repórteres, câmeras de todos os jeitos, microfones. Ele voou para a fama.

Embora, não necessite mais da cadeira de rodas, o sacristão ainda a usa, pois dá muito status e por incrível que pareça, desperta a simpatia e o lado maternal das mulheres. Ele não é mais somente o sacristão, é o grande herói reconhecido, o descobridor da fonte da água milagrosa da saúde. Padre Tomás foi embora e nem é mais padre. Casou-se com uma Argentina, já tem um filho de dois anos. Donaura ainda cuida da casa paroquial.Alcério Mendes, o ex-Vitiligo, este é seu nome de batismo, é o novo administrador da igreja. Dom Eleutério é mais dom ainda, pois se tornou cardeal e com fama de milagreiro, pois parece ter pé quente, como dizem e na última cidade que pernoitou, lá pelas bandas do litoral do Espírito Santo, jorou petróleo de dentro do mar. Isto pode até ser exagero, sei não...como dizem os capixabas.As comadres da igreja dizem, que em Pedreiras tinha tanto fracassado junto: um padre bêbado, um sacristão com vitiligo, um médico que não conseguia se casar, um bispo comilão, um dono de bolicho beberrão e apaixonado por uma prostituta, que Deus, Nosso Senhor, teve pedade do povo e, se não deu para dar chuva de diamantes e de ouro, deu uma fonte da água mais pura do mundo. Tem coisa melhor ? O povoado esturricado e seco por falta de chuva, está se emancipando e vai se chamar “Boa Saúde”, um nome que tem tudo a ver com uma cidade assim. Acreditem, Deus escreve certo por linhas tortas. É pura verdade.


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