Por
Teresa Lima e João Grosso
Teve ontem lugar, na Capela lisboeta do Rato, Ã s 17.30 horas, um brilhante recital de poesia de Pascoaes, levado a cena pelos dois consagrados actores da capital. A audiência - cerca de seis dezenas de pessoas apaixonadas pela arte poética, que nunca faltam a estes eventos ficou maravilhada - ficou maravilhada pela mestria dos dois recitantes e intérpretes. A sessão, sem intervalos, durou cerca de sessenta minutos, pecando apenas a circunstància dos ingressos serem pagos. Na minha opinião, trata-se de uma forma injustificável de não fazer fomento cultural... mas, os mercenários mentores destes tristes negócios tirarão, se tiverem sensibilidade q.b. as devidas ilacções. É que, se para o alimento do corpo se poderão justificar certos dividendos circunstanciais, para o alimento da alma - neste caso a Arte Poética - não há dinheiro que o pague !
Vem a talho de foice citar o comentário do poeta António Càndido Franco que, sobre Pascoaes, escreve : "A poesia de Pascoaes tem um significado cósmico e universal, não apenas literário. Isto obriga-nos a ter pela sua obra o respeito que é devido à s coisas que, humildes e sagradas, como uma flor ou uma estrela, mais importam».
Programa da Récita :
- POBRE TOLO ( excerto )
- PRECE
- O POETA ( Parte I )
- DIANTE DE MIM
- ELEGIA DO AMOR ( Parte I )
- CANÇÃO DUMA SOMBRA
- VENTO DO ESPíRITO
- O DOIDO E A MORTE ( Integral )
Uma destas pérolas :
PRECE
Almas gémeas da minha, humildes, ajoelhai
e as lágrimas alheias comungai.
Almas gémeas da minha, abri a vossa porta
à mendiga faminta e quase morta.
Almas gémeas da minha, olhai os passarinhos
e as ruínas, Ã chuva, dos seus ninhos.
Almas gémeas da minha, erguei as mãos, rezando
ante o luar que nasce, abençoando...
Almas gémeas da minha, amai os arvoredos
e a extática tragédia dos penedos.
Almas gémeas da minha, amai o sol doirado,
e o seu sangue nas nuvens derramado.
Almas gémeas da minha, ouvi as tristes fontes
e os sapos tristes a chorar, nos montes.
Almas gémeas da minha, amai o sofrimento
da noite escura, em que perpassa o vento.
Almas gémeas da minha, amai o lírio, a rosa,
e a sombra da tardinha lacrimosa.
Almas gémeas da minha, amai as criancinhas,
nas ruas, a esmolar, enfezadinhas.
Almas gémeas da minha, olhai a criatura
na solidão terrível da Natura!
Almas gémeas da minha, entrai com todo o amor,
nos negros antros trágicos da dor.
Teixeira de Pascoaes
In VIDA ETÉREA
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