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Erotico-->10. BANHO REFRESCANTE -- 18/02/2004 - 07:42 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Teo, como era conhecido nos meios empresariais e jornalísticos, teve a impressão de que algo não ia bem em sua vasta cabeleira. Sentia comichões e ansiava por roçar as unhas por entre os cabelos, o que a grossa toca impedia.

— Devo estar infestado de piolhos e lêndeas. Santo Deus, mais esta agora! É sofrimento adicional, com que não contava. Se me tirassem a maldita máscara, poderia me cuidar, mesmo que tivesse de lavar a cabeça na bacia da privada.

Aguardou o momento mais propício, qual seja o de bater as palmas para ir ao banheiro, para solicitar que lhe permitissem, ao menos, cortar os cabelos, para evitar a coceira desesperadora.

— Se continuar desse jeito, vou criar feridas, sem qualquer possibilidade de tratamento.

Começava a desesperar. Sentia a necessidade de se aliviar do embaraço, mas a crise se expandia por todo o couro cabeludo.

— Ontem era só uma coceirinha à-toa.; hoje é este terrível flagelo.

O suor escorria pelo pescoço. Tinha com que se preocupar. Esqueceu de que deveria filosofar e só patenteava o sórdido pensamento de desprezo pelos marginais que o aprisionaram. O próprio sofrimento fez com que se lembrasse dos que penam nas masmorras e celas fétidas espalhadas por todo o mundo. Viu desfilarem em sua memória as cenas dos cárceres dos telejornais, onde muitos tinham a cabeça raspada. Nem esse privilégio ele possuía, pior tratado que os assassinos e bandidos arremessados aos magotes nos presídios e nas precárias instalações das delegacias de polícia.

— Nunca tive muita coragem de pensar seriamente na condição dessa gente marginalizada pelos crimes. Também eles buscaram...

Surgiu-lhe, claramente, a idéia de que a miséria da maioria era fruto da excessiva riqueza de poucos.

— Se o Governo melhor distribuísse os recursos que arrecada...

Não prosseguiu na linha de idéias, desviando a atenção para o fato de que ele mesmo havia burlado o fisco inúmeras vezes. Julgava temerário sonegar impostos ou não declarar todos os lances dos negócios mas mantinha um “caixa-dois” bem nutrido, através do qual manipulava verbas extraídas dos débitos legais. Não contribuía e julgava justo que assim fosse, porque, com o montante ilicitamente arrecadado, punha várias famílias na roda do capital de giro, favorecendo empregos e...

— Estou sendo muito enérgico comigo mesmo. A sociedade dos ricos compartilha da mesma realidade. Se houver uma única pessoa idônea nesse campo (e aí incluo os ministros religiosos de todos os cultos), vou oferecer-me ao sacrifício das labaredas purgativas. Existem leis que isentam as igrejas das prestações de contas e conseqüente pagamento de tributos. Se os representantes de Deus na Terra agem acobertados por medidas oficiais, por que é que eu, ínfimo perante a grandiosidade dos poderes temporais dos padres e pastores, deveria...

Ia por aí o pensamento divergente do costureiro, quando abriram a porta.

— Comida!

— Posso falar?

— Que vai ser agora?

— Estou perdido de piolhos. Será que alguém me cortaria os cabelos? Podem passar a máquina zero. O que não quero é ter feridas infeccionadas na cabeça por causa do gorro.

— Vá até o banheiro.

Teotônio se deslocou com facilidade até a beirada da bacia da privada.

— Do seu lado direito, se você esticar a corrente, vai encontrar um box com chuveiro. Entre nele.

O prisioneiro estava encantado com a possibilidade de um banho.

Assim que entrou no cubículo, que mediu com os braços abertos, sentiu que lhe abriam os fechos do capuz e da corrente. Mas a escuridão era absoluta.

— Pode se lavar. Aí tem sabão. Você tem cinco minutos.

Livrou-se das roupas e, sem se incomodar se pudesse, de repente, ser observado, abriu o registro. A água estava tépida. O sabão que encontrou no escaninho da parede, pastoso. Mas foi possível criar grossa espuma na cabeça. Sentiu que algumas regiões do couro cabeludo estavam com cracas. A dor do lado também incomodava, porém, o conforto da água escorrendo era delicioso. Passou-lhe pela memória os banhos de sais que tomava na banheira alabastrina. Mas foi cortado, subitamente, pela voz áspera do carcereiro:

— Muito bem, aqui você tem um aparelho de barba, se quiser escalpelar-se.

— Muito obrigado!

Com muita dificuldade, foi derrubando os fios da cabeça, até perceber que tinha deixado uns fiapos aqui e ali, difíceis de tirar sem espelho. Desejou pedir ao outro que lhe desse assistência, contudo achou melhor calar-se, que já havia conseguido muito mais do que pretendera.

Enquanto trabalhava, tentava localizar alguma réstia de luz através da abertura de alguma janela. Impossível.

Notou que os brincos estavam no lugar. A escuridão mais o capuz até que serviam para alguma coisa. Ouvira contar que jovens tiveram as orelhas rasgadas por assaltantes impacientes. Não teve tempo de desenvolver a idéia da retirada dos adereços.

— Vista esta calça e esta camisa.

Sem se enxugar, mal teve tempo de enfiar pernas e braços que já foi amarrado na corrente e preso à máscara. Saiu meio trôpego do banheiro até que se viu deitado no quarto. Meteram-lhe um prato nas mãos. Mais arroz e feijão, mais bife, mais uma verdura cozida. Pelo menos, a comida tinha gosto. Dessa vez, comeu com mais tranqüilidade.

— Santo Deus, será que estou me habituando com a prisão?

Foi a partir daí que começou a tossir.

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