Poema-Oração à Santa Maria Madalena
“Jesus disse. Os teus cabelos são como o rebanho de cabras descendo das vertentes pelas montanhas de Galaad. A mulher sorriu e ficou calada. Depois Jesus disse, Os teus olhos são como as fontes de Hesebon, junto à porta de Bat-Rabim.” José Saramago, O Evangelho Segundo Jesus Cristo.
I
Oh, Salve! Santa Maria Madalena!...
A que a Igreja não reconhece santa!...
A que o povo a diz puta nazarena!...
A que o mundo a julga hierofanta!...
Foste, assim, sempre marginalizada!...
Foste, pois, oculta em vários mistérios!...
Acaso é certo que vieste exilada
Às terras do sul da França? É sério?
Ao Mestre davas toda a atenção,
Ouviste, é certo, palavras secretas
Que nem nos evangelhos tais estão...
Invejavam-lhe ser a predileta...
Estivestes ao seu lado à aflição,
Não lhe negou como outros ascetas...
II
Oh, Salve! Santa Maria Madalena!...
A que a Igreja não reconhece santa!...
A que o povo a diz puta nazarena!...
A que o mundo a julga hierofanta!...
Eu, como tu, sou só um marginal,
Neste mundo não se ouve o que digo,
Meu dia é de sol a sol, de sal a sal!...
Meu rumo é agora ao teu que persigo...
Pareço um mendigo sem o seu pão,
Sou como um cão vadio e sem rota,
Careço du’a voz que não seja um não!...
Ouça, minha santa, esta estranha nota,
Em forma de prece imprópria à mão
Que acaricia um fiel de coração.
|