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Contos-->Caminhos - Parte 4/10 -- 29/06/2005 - 18:29 (Pedro de Souza Silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
PARTE 4



INTERRUPÇÃO NOS ESTUDOS PARA TRABALHAR


Voltei a morar com Tio Antero, agora em outro local da Roça do Lobo, pois ele já havia construído sua própria casa, a qual era bem melhor que os dois quartinhos alugados lá na Vila do Major Aníbal. Logo que aí cheguei, consegui ainda matricular-me no colégio Estadual, lá no Barbalho, mas não fiquei por muito tempo pois necessitava trabalhar também e só havia curso ginasial durante o dia, o que seria incompatível em horário com qualquer emprego que pudesse arrumar. Assim, depois de algum tempo, consegui o emprego de estafeta na Western Telegraph e abandonei os estudos, tendo apenas iniciado o segundo ano ginasial.
O trabalho de mensageiro era bastante movimentado e cansativo, pois me obrigava a percorrer muitas ruas ali do centro de Salvador, tanto na cidade baixa como na cidade alta, e quase tudo teria que ser feito a pé, subindo e descendo aquelas velhas ladeiras íngremes e escorregadias; mas a necessidade e a vontade de ir em frente me davam bastante força para continuar, apesar de um pouco frustrado por ter parado de estudar.

A minha convivência com o meu tio, apesar das suas exigências e disciplina, era boa, pois ele era uma pessoa muito justa e gostava de ajudar os outros, mas a convivência com a sua mulher já era muito difícil, pois ela não perdia a oportunidade de ironizar as pessoas que dela dependessem e isso a deixava muito realizada, como se podia notar. Assim, eu era o alvo principal de suas ironias. O tempo foi passando e então resolvi sair para procurar um outro serviço, uma profissão que me desse uma liberdade maior, que me levasse para longe da dependência de familiares, pois só assim, pensava eu, poderia encontrar acertadamente o meu próprio caminho na vida.

O contato com o mar, com a beira do cais, todos os dias - pois o escritório da Western, onde eu trabalhava, ficava bem próximo ao cais do porto - foi me criando uma grande afinidade com aquilo e, por fim, o desejo de embarcar um dia em um daqueles navios e sair, viajar pelo mundo, conhecer outros povos e suas estranhas linguagens.
Passando da vontade para a ação, comecei a visitar o cais do porto e, certo dia, encontrei atracado ali um enorme navio de passageiros de bandeira francesa, de nome “ Provence”. Não resisti e subi a escada que dava acesso ao navio para falar com o marinheiro que vigiava a entrada. Com um francês muito precário, do pouco que havia aprendido no colégio, tentei conversar com o marinheiro, mas apesar do esforço de ambos os lados para o entendimento, o nosso papo não foi muito longe. Assim, agradeci a sua atenção e despedi-me com um grande sorriso de felicidade, por ter conseguido, pela primeira vez, me comunicar, mesmo com dificuldade, em uma língua estrangeira com um estrangeiro realmente. Alguns dias depois, em outra passagem pelo cais do porto e já com a idéia fixa de trabalhar em navio, fui a bordo de um, do Lloyd Brasileiro, que estava ali atracado ao cais, e lá perguntei ao marinheiro o que precisaria fazer para conseguir aquele emprego. O marinheiro explicou-me que só poderia embarcar com um documento chamado Carteira de Marítimo e que tal documento só poderia ser retirado na Capitania dos Portos. Já mais entusiasmado, perguntei-lhe se poderia trabalhar na cozinha, que era o que eu mais desejava; ele então explicou-me que poderia, mas para mim seria melhor se eu tirasse uma carteira de moço de convés, pois teria mais futuro embarcado. Daquele momento em diante, ser moço de convés tornou-se o meu novo ideal e, para isso, toquei em frente. Dali mesmo fui à Capitania dos Portos de Salvador. Lá na Capitania, dirigi-me ao funcionário que atendia ao balcão e, disse-lhe que desejava apanhar ali uma carteira de marítimo, de moço de convés, a fim de embarcar em um navio. O funcionário olhou-me um tanto surpreso com o meu pedido e, em seguida, perguntou-me a idade.
Respondi-lhe que era de abril de 1938, todo orgulhoso com a minha velhice, e ele então explicou-me que eu tinha apenas quinze anos, era muito novo, e por isso não poderia retirar uma carteira de marítimo para embarcar. Diante dessa informação, fiquei muito decepcionado e triste, sem saber o que iria fazer dali para frente.
O funcionário tentou então ajudar-me, dizendo-me que eu poderia esperar mais um pouco, ou seja, mais três anos, o que para mim significava uma eternidade, e voltar ali com os papéis, a fim de requerer a tão desejada carteira de marítimo para embarcar. Não conseguindo convencer-me, ele então informou-me que, ali ao lado, havia a Escola de Aprendizes-Marinheiros, onde talvez já estivessem recrutando garotos para nova turma e que, com quinze anos, eu já poderia ser aceito para a inscrição. Não perdi tempo e, ato contínuo, para lá me dirigi, a fim de saber o que era necessário para ingressar naquela escola.
A Escola de Aprendizes era um grande edifício ali ao lado, de construção bem antiga, com dois pavimentos, encimada por um torreão no centro e muito bem conservada, o que lhe dava lhe dava um ar imponente, e a sua saída dava para a rua bem defronte ao antigo Mercado Modelo. Fui até lá para tomar as informações, quando então me disseram que os próximos exames para a nova turma ainda iriam demorar, uma vez que a turma atual de aprendizes teria começado há poucos meses atrás, mas que, se eu desejasse ficar ali como agregado, teria então que falar com o tenente Mansur e ver se ele autorizaria. Eu não tinha a menor idéia do que seria agregado, mas desejava muito já ficar por ali mesmo, pois aquilo seria o caminho para eu chegar ao navio futuramente. Fui até ao gabinete do tenente Mansur, onde fui atendido por um sargento na entrada. Ele então falou-me que eu poderia ficar e, em seguida, explicou-me qual seria o meu trabalho durante este tempo, até que chegassem os exames e eu me tornasse aprendiz-marinheiro. Eu, como os outros que já estavam lá agregados, teria como incumbência toda a faxina interna e externa da Escola, limpeza diária das privadas e banheiros e qualquer outro serviço pesado e sujo que aparecesse, sendo que tal não poderia ser recusado, sob pena de considerar-se indisciplina, o que poderia, como pena, ir para o bailéu.
Ouvi atentamente o sargento a respeito das condições impostas pela Escola e as aceitei com a maior naturalidade, pois trabalho, leve ou pesado, para mim não seria problema, visto que já me acostumara desde criança ao trabalho duro. Dei o meu nome para que ele anotasse e combinei que voltaria dentro de uma semana mais ou menos, pois teria que ir até Tobias Barreto para ver com Papai a minha certidão de nascimento, pois não a possuía em mãos, a fim de apresentá-la como documento.
No dia seguinte, apanhei a marinete para Tobias Barreto, a fim de encontrar-me com Papai e saber onde eu havia sido registrado, para tirar uma cópia da certidão com a máxima urgência e, voltar para Salvador. Papai então informou-me que eu havia sido registrado em Sambaíba, no Estado da Bahia, pois havia nascido em Lagoa Redonda e, para isso, eu teria que ir até aquele lugar. De Tobias Barreto até Sambaíba é um bom pedaço de chão e, normalmente, se apanharia uma carona de caminhão, mas como eu não poderia esperar tanto, comecei a andar rodagem afora, debaixo de um sol causticante, muita poeira da terra vermelha e com piçarra no sapato, até Sambaíba, onde fui à procura do cartório.
No cartório, falei com a funcionária que desejava tirar a certidão e ela então pediu-me o meu nome completo, o qual, de acordo com a informação de Papai, seria Pedro da Silva Filho ou Pedro Joaquim da Silva Filho, cujos nomes a funcionária não conseguiu encontrar nos livros, até descobrir o erro. Pois, na verdade, o meu nome não era este no registro, mas sim Pedro de Souza Silva, pois teria o Souza da minha mãe, e o Silva, do meu pai. Mas Papai propositadamente havia retirado do meu nome o sobrenome Souza, por conta própria, após a sua separação da minha Mãe.
Terminando a cópia da certidão, a funcionária disse-me o valor do serviço, o que deixou-me bem atrapalhado, pois eu não possuía todo aquele dinheiro comigo e também não poderia deixar de levar a certidão. Conversei e expliquei-lhe a minha situação e ela então cobrou-me um valor bem menor, o qual já poderia pagar com o pouco que tinha no bolso. Saí dali correndo para o posto fiscal da rodagem, a fim de ver se pegava uma carona de volta a Tobias Barreto. Ali fiquei por algum tempo, até que surgiu um caminhão carregado com sacos de amendoim. Pedi a carona e subi para sentar-me lá no topo da carga, em cima dos sacos, onde já haviam mais outros dois companheiros de carona. Foi uma ótima viagem, fomos comendo amendoim até Tobias Barreto.


VIDA DE AGREGADO NA ESCOLA DE APRENDIZES


De volta a Salvador, comuniquei a Tio Antero a minha decisão de ingressar na Escola de Aprendizes-Marinheiros, a fim de entrar para a Marinha de Guerra, e que, como ainda iriam demorar a inscrição e os exames, eu já pedira para ficar por lá mesmo, fazendo faxina até chegar a época de passar a Aprendiz. Tio Antero a princípio questionou um pouco a minha idéia, mas no final ele percebeu que motivos mais sérios me fizeram tomar aquela decisão, os quais seriam decorrentes da convivência difícil com a D. Adalgiza, sua mulher.

Logo de imediato voltei à Escola e apresentei-me para ficar como agregado e, sem maiores problemas, entrei no esquema imediatamente. O edifício da Escola era bastante espaçoso, o andar superior era ocupado pelos alojamentos dos aprendizes e salão de recreio, além do gabinete do comandante, que ficava bem ao centro da construção. O primeiro pavimento, ou térreo, era onde ficavam a administração, sala de estado, as salas de aula e a cozinha. Aos fundos, o cais da escola, com o trampolim e o abrigo dos escaleres, embarcações que eram muito usadas para exercício de remo e vela. Ao lado do edifício da escola, instalado em uma base de concreto, havia um velho canhão Bofors, que estava sempre coberto por uma lona. Pela parte da frente, em toda a sua extensão, havia um grande jardim muito bem conservado, que se estendia até a Avenida das Naus, que era a rua principal e a entrada para o complexo das instalações da Marinha, composto pela Escola, Capitania dos Portos e residências dos oficiais mais graduados, como a do comandante da Escola e outros. Do outro lado desta avenida, ainda dentro do terreno da Marinha, havia ainda uma grande área com pista de atletismo e campo de futebol.
Após a minha apresentação ao sargento responsável pelos agregados, este mandou que eu me apresentasse ao Apto. B, (que era de um aprendiz-marinheiro de uma turma anterior que não havia conseguido passar a pronto devido a alguma deficiência), a fim de que este me mostrasse o alojamento onde eu iria dormir e os locais por onde poderia circular. Em seguida, ele levou-me ao almoxarifado e pediu uma camiseta branca, usada, para mim, onde foi pintado o meu número de agregado, que era 333. Em seguida, deu-me algumas informações sobre os horários de faxina e refeições, para os quais eu deveria ficar bem atento, pois iniciado o toque de reunir, aprendizes ou agregados deveriam se dirigir correndo para os seus locais de formatura e lá chegarem antes da caixa parar de tocar, o que demorava em torno de trinta segundos, sob pena de serem anotados e punidos por aquela falta.
Logo chegou a hora do primeiro reunir em frente à Escola e, imediatamente procurei entrar em formatura no pelotão dos agregados, que era o último pelotão a entrar no rancho. Este era um imenso salão de refeições com diversas mesas de marmorite e bancos de concreto.

No rancho, após entrar o último pelotão, não era permitido mais a entrada de alguém que porventura tivesse chega do atrasado e, para isso, era mantido à porta um aprendiz de serviço, com ordens de não somente impedir a entrada do atrasado, como também anotar o seu nome e levá-lo para o sargento de serviço. Dentro do rancho, os pratos de refeição, já preparados há algum tempo, eram colocados nas mesas, devidamente espaçados um do outro e assim todos iam entrando, se dirigindo a uma determinada mesa e colocando-se em frente a cada prato, mantendo-se o indivíduo de pé, até que fosse dada a ordem para sentar-se. Os agregados, como eram os últimos a entrar, tinham a molho com o aspecto esbranquiçado, devido ao sebo que formava por comida bem fria, ficando a carne e o cima, mas com a fome que já estávamos quando ali chegávamos, essas coisas eram de nenhuma importância.

A rotina da Escola começava bem cedo, logo ao clarear do dia, quando éramos acordados pelo toque de alvorada, dado pelo corneteiro de serviço. Neste instante, os plantões de alojamento saíam pelo alojamento adentro aos brados gritando - ALVORAAADA ! - e batendo com cacetetes de madeira nos tubos pés de carneiro que suportavam as macas onde dormíamos. Os alojamentos de repente se transformavam, de um ambiente de relativo silêncio dentro da madrugada, em uma barulhada infernal. Todos pulavam imediatamente de suas macas e arrumavam os cobertores, que eram dentro delas enrolados em forma de charuto. Com cabos de fibra, a maca era amarrada por fora com voltas circulares espaçadas, ficando aquela tripa compacta; em seguida a extremidade livre era bem esticada no suporte do tubo oposto e ali amarrada, ficando, no final, todas no mesmo plano horizontal. Isso teria que ser bem feito, pois em seguida viria uma inspeção para verificar se todas estavam bem esticadas, sob pena de serem anotadas. Os agregados enrolavam as suas esteiras e as levavam para o depósito lá embaixo, no bailéu. Esse trabalho de arrumação teria que ser feito em muito pouco tempo, pois dali corríamos para o banheiro geral onde se dava uma verdadeira corrida contra o tempo, isso porque em mais alguns minutos seria dado o toque de reunir e a batida da caixa. No momento da correria para o reunir em frente à Escola, o espaço da escada de caracol era muito pouco para suportar o grande número de pessoas descendo ao mesmo tempo, por isso havia também, para facilitar a descida, um tubo de ferro na vertical, ligando por fora o andar superior ao chão, por onde escorregávamos bem rápido e, com isso, ganhávamos tempo. Mas às vezes a pressa era demais e duas pessoas desciam quase juntas, uma em cima da outra, o que poderia machucar quem estivesse ainda embaixo.
A corrida era desembalada até o local da formatura e a grande maioria chegava a tempo de entrar em seu pelotão, mas se, porventura, quando a caixa parasse de tocar, alguém ainda viesse correndo para o seu local, esse deveria parar no ponto em que estivesse e aguardar o homem de serviço que viria anotar o seu número para o registro no livro de faltas.
Ali na formatura, diante de cada pelotão, o mais antigo fazia a verificação da presença dos seus componentes e anotava as respectivas faltas. Em seguida, íamos para o café da manhã lá no rancho, onde era servido uma caneca de café já misturado ao leite e dois pequenos pedaços de pão passados na manteiga misturada com banha. Após o café da manhã, novo reunir era tocado, agora para distribuição de afazeres, quando então os aprendizes se dirigiam com os instrutores para fazer educação física e nós, agregados, éramos distribuídos para a faxina geral em vários locais da Escola, fosse na cozinha, banheiros, privadas ou para varrer toda a área das ruas, ou escovar o saguão, com um enorme e pesado escovão, durante horas. Por vezes, também mandavam alguns de nós para a casa do comandante ou do imediato da Escola a fim de fazer faxina nesses locais, ou nos mandavam de caminhão lá para a Base Naval de Aratú, afim de cavar barro e trazer para a Escola.
Durante a tarde, após o almoço, a rotina de faxinas se repetia, mas era menos rigorosa que a da parte da manhã e assim, lá pelas quatro horas da tarde, já podíamos estar liberados para praticar um esporte ou algum outro lazer dentro da área da Escola. No fim da tarde, algum tempo após o toque de banho geral, quando os alojamentos eram reabertos, vinha o reunir, lá em frente à Escola, para o jantar.
Após o término do rancho noturno, grupos se espalhavam por toda a área externa da Escola ou iam para o salão de recreio dos alunos, lá no andar superior. Eu particularmente gostava muito de estar sozinho e ir sentar-me junto ao cais, próximo ao abrigo dos escaleres, pois era um lugar muito calmo e repousante durante a noite, de onde podíamos apreciar o pisca-pisca da sinaleira lá na ponta do molhe da entrada do porto, a chegada silenciosa dos enormes saveiros que vinham do outro lado da baía para o cais do Mercado Modelo e ouvir o bater suave das ondas ali nas pedras abaixo, aos nossos pés. Esses momentos de descanso e recolhimento eram muito inspiradores, tendo nessa época escrito muitos poemas sobre assuntos os mais diversos, inclusive alguns dedicados ao centenário de fundação da Escola, que se comemorava naquele ano de 1954. Alguns fragmentos que ainda me restam na memória diziam mais ou menos assim :





Escola amiga, hoje cheia de tantas glórias
Sacra missão para a raça marinheira
Tens um centenário pleno de histórias
Sempre brilhando mais a Pátria brasileira
Como o sol, seus longos raios desvanecem as trevas
Com os sublimes raios de amor e esperança
És o guia ao timão, és o farol a brilhar
És o ninho de procelárias bravas
Que singram as ondas do mar
..........................................

Eram muitas estrofes e, hoje, já não me lembro mais, mas recordo-me que fiz estes poemas na noite anterior ao dia da comemoração e, no dia seguinte pela manhã, bem antes do início da cerimônia, fui até ao pequeno obelisco de granito que haviam construído nos jardins em frente à Escola e, ali na pedra, comecei a escrever, com um lápis, aqueles versos. Enquanto estava escrevendo, um sargento que passava em frente ao local, perguntou-me o que eu estava fazendo ali dentro do jardim, junto ao obelisco. Respondi-lhe que estava escrevendo uns versos que eu havia feito, dedicados ao centenário da Escola e ele então veio até perto para conferir e começou a ler as primeiras estrofes que eu já havia escrito. Entusiasmado, olhou para mim e falou - mas você é um poeta garoto ! E daquele dia em diante passei a ser conhecido na Escola como o Poeta, apelido pelo qual passei a ser chamado por todos os colegas e superiores da Escola naquela época.

Ao término do recreio da noite, entre nove e dez horas, não me lembro bem, havia um toque de reunir só para os agregados, em frente à sala de estado, para a retirada dos nossos apetrechos de dormir, que eram esteiras de palha, pois nós não tínhamos direito a macas de lona como os aprendizes. Ali, já todos formados, aguardávamos em silêncio a chegada das esteiras, que iam sendo apanhadas lá dentro do bailéu e jogadas ali mesmo na calçada à nossa frente. Nem sempre as esteiras estavam em boas condições, pois, após um certo tempo de uso, elas começavam a se desfazer, soltando as palhas e, assim, restavam poucas inteiras. Por isso, logo que liberavam o grupo para apanhar cada um a sua, havia uma verdadeira correria em cima do monte e quem era mais fraco sempre ficava na pior, pois, às vezes, nem uma esteira rasgada conseguia, porque nem sempre havia esteiras suficientes para todos. Após cada um apanhar a sua, o grupo já ia subindo para o alojamento, a fim de encontrar um melhor local para estirá-la e, às vezes, com muita sorte, encontrar algum aprendiz que pudesse emprestar um cobertor ou alguma roupa velha para se cobrir à noite ou colocar por debaixo das costas, pois o piso de marmorite do alojamento era muito frio para se agüentar a noite toda.

A maioria dos meus colegas agregados vinha de famílias muito pobres e não possuía nada absolutamente de seu, além de uma camiseta branca e uma bermuda azul, que eram dadas pela Escola, e um par de botinas usadas, que às vezes era oferecida por algum aprendiz ou marinheiro que se compadecia diante daquela situação.

Ali trabalhávamos durante todo o expediente e às vezes fora dele, tendo a obrigação de manter tudo bem arrumado e limpo, sem ter o direito a reclamar de alguma coisa errada contra nós. Tínhamos que nos submeter à disciplina militar rigorosa, não sendo ainda militares e sem direito a soldo algum, o mais ínfimo que fosse, tendo em troca disso tudo, apenas o prato de comida. Mas o que nos mantinha ali, de uma certa forma voluntária, submetidos àquele tipo de escravidão e com todas as humilhações decorrentes dessa condição? Certamente o sonho por um futuro melhor!

Passado uns dois meses, tive a oportunidade de ir, certo dia, fazer faxina lá na enfermaria da Escola e aí pude contatar o pessoal que lá trabalhava, como o sargento Catarino, que era o sargento mais antigo, responsável pela enfermaria, e o Bidinho, um civil que trabalhava em serviço geral de faxina, e assim fui convidado para trabalhar ali com exclusividade. Para mim foi a melhor coisa que aconteceu durante o período em que passei como agregado, até esperar os exames e passar a aprendiz-marinheiro. Agora como exclusivo da enfermaria, eu não precisava mais dormir lá no alojamento, deitado em esteira naquele chão frio, ou participar de todas as formaturas dos agregados, pois além de fazer a faxina normal na enfermaria, durante o expediente de atendimento médico, passei a ajudar os enfermeiros e, em pouco tempo, aprendi o básico de primeiros socorros, como aplicar injeções, fazer curativos e auxiliá-los no tratamento aos doentes. Durante os primeiros dias na enfermaria eu não tinha cama para dormir, por isso, para não ir lá para o alojamento, improvisei a dormida ali mesmo, dentro de uma banheira na qual colocava algumas roupas de cama e travesseiros que já haviam sido retirados das camas da enfermaria e, assim, passava a noite mais confortavelmente. Depois de algum tempo, os enfermeiros me arrumaram cama e até roupa e sapatos de marinheiro e, daí em diante, passei a andar sempre limpo e alinhado, pois o próprio ambiente exigia que assim fosse. Após um certo tempo de trabalho na enfermaria, chegou um novo oficial dentista para a Escola, o dr. Roberto. Este, após conversar comigo, pediu ao dr. Seabra, que era o chefe do serviço médico da Escola, para que eu ficasse como auxiliar dele no gabinete dentário. Essa nova incumbência foi muito importante para mim, pois me deu a oportunidade de contatar pessoas com melhor nível cultural e, por diversas vezes, a pedido do próprio dr. Seabra, tive a oportunidade de apresentar, ali mesmo em seu gabinete, poemas de minha autoria às esposas dos oficiais, que ali chegavam para consulta médica ou para o tratamento dentário.

Como companheiro de faxina na enfermaria eu tinha o Seu Bidinho, que praticamente estava ali encostado pois tinha sérios problemas de saúde produzidos pelo alcoolismo, sendo que, certa vez, fôra até internado pelo dr. Seabra para tratamento, mas que infelizmente surtiu efeito só por pouco tempo. Bidinho era uma pessoa muito querida por todos ali e ele era o companheiro para o qual eu mostrava, em primeira mão, os meus versos, pois também era um grande apaixonado pela poesia. Fazia poemas e ainda tocava um violão com muita sensibilidade. Ao violão, ele cantava ou declamava muitos dos seus poemas de um dos quais ainda consigo lembrar um fragmento que dizia:

Fantasia de poeta, oh meu amor!
É como a trepadeira, quando o tronco abraça
É que o tronco infeliz enche de flor ...


Nos fins de semana ou feriados, como não tinha dinheiro para sair, a minha diversão mesmo era praticar defesa pessoal com outros colegas ou nadar sozinho, por entre as embarcações fundeadas, até o forte de São Marcelo, onde permanecia por longas horas.
O Forte de São Marcelo é uma fortificação muito antiga, que fora construída pelos colonizadores portugueses, para a defesa local, em uma ilhota na entrada do porto, e onde ainda podiam ser encontrados pesados canhões dirigidos para o mar, de onde poderia vir o inimigo. Mas agora, totalmente deserto e abandonado, era um lugar ideal para se estar só, para meditar, não somente sobre as coisas de então, mas sobre aquele passado já tão distante, e que ali ia se descortinando para mim, enquanto cauteloso caminhava por aqueles corredores ou me adentrava em uma daquelas celas. O ar pesado do interior do forte, dava lugar a um mais ameno e poético, quando se chegava lá no terraço superior, e dali podia se ter toda uma vista de Salvador, com a cidade baixa e alta e, a elegante construção do Elevador Lacerda, ligando as duas partes, ou a vista oposta, onde se observa a entrada da Baía de Todos os Santos, arrematada ao fundo pela Ilha de Itaparica e outras menores.
O Forte de S. Marcelo era, assim, um lugar privilegiado, que servia como refúgio para quem gostasse de se desligar por algum tempo do convívio humano e dialogar consigo mesmo. Por isso, para ali me dirigia, sempre que havia uma oportunidade.

O CURSO DE APRENDIZ-MARINHEIRO


Antes do final do ano de 1954, quando a turma Vevê (W) já estaria terminando o curso, os candidatos da próxima turma, a Xara (X), onde eu seria incluído, prestaram os exames de admissão. Alguns depois, já se tinha os resultados, inclusive a classificação por dias notas, onde consegui obter o nono lugar entre uma centena de aprovados. Dias depois, chegaram os outros candidatos que se inscreveram e foram aprovados lá em Sergipe ( Aracaju), quando então a nova turma, a XARA, foi reunida pela primeira vez. No primeiro dia, formamos todos em frente à Escola, ainda em trajes civis, e ali ficamos por um longo tempo para ouvir a chamada inicial de nossos nomes e para a anotação dos nossos nomes de guerra, pelo qual cada um passaria a ser chamado e conhecido a partir daquele momento. Em seguida, tivemos a preleção inicial, dada pelo Imediato da Escola, em que este nos chamava a atenção sobre o nosso novo estilo de vida, dentro da disciplina militar, a qual teríamos de observar rigorosamente, a fim de que pudéssemos levar com sucesso a carreira que voluntariamente havíamos escolhido. Ali, todos muito atentos, ouvíamos aquelas palavras e, cada um, certamente de modo diferente, imaginava o seu futuro dentro daquela organização não-democrática e disciplinada, onde a vontade do indivíduo seria a vontade do seu superior, de quem receberia ordens, e onde pensar por si próprio e tomar decisões por si mesmo seria um luxo não permitido em nenhuma hipótese. Na verdade, o termo voluntariamente, era uma força de expressão e bem fora da realidade, ou melhor, da nossa realidade, pois ingressar na Marinha era uma das pouquíssimas e raras oportunidades para a maioria de nós - que éramos provenientes de famílias muito pobres daquela região do Nordeste - de escaparmos da aviltante pobreza que havíamos deixado para trás.

Logo após a preleção, fomos distribuídos em vários grupos (pelotões) e começamos a receber os nossos uniformes, que eram compostos de um par de sapatos, uma calça com cinto e uma ganga, que era uma espécie de blusa fechada e sem botões e com a gola tradicional de marinheiro, a qual era vestida pela cabeça.
Começamos imediatamente o programa de ensino, o qual era dividido em três partes bem distintas: a de conhecimentos gerais, que constava de um programa de nível entre o primário e o ginasial da época; a parte profissional marinheira, onde era ministrada toda a arte marinheira que seria aplicada a bordo dos navios; e, finalmente, a formação militar, onde aprendíamos os regulamentos com todo o seu protocolo.
Na parte profissional existiam matérias essencialmente práticas, como a marinharia, onde aprendíamos todos os nomes das partes e acessórios de uma embarcação, inclusive das embarcações antigas, a vela. Aprendíamos a confeccionar todos os tipos de nós em cabos, serviços que futuramente teríamos que realizar a bordo. Para esta disciplina tínhamos um sargento instrutor - o sargento Reimão, que se tornou, ao longo do tempo, uma figura ímpar, pelo seu estilo de dar as aulas na sala de marinharia. Ali havia diversos tipos de embarcações em escala reduzida, mas muito bem reproduzidas, o que nos permitia ver todas as suas partes e acessórios expostos com a maior fidelidade e, bem no centro da sala, havia o maior modelo, que era de um navio a vela que possuía praticamente todas as peças que possuiria um navio daqueles, em tamanho natural. Durante a aula, o sargento Reimão colocáva-nos em volta daquele modelo e, num ambiente de silencio total, com a vareta de instrutor em punho, ele ia apontando cada peça da embarcação e dizendo o seu nome, de modo bem pausado para que todos os alunos ali em volta fixassem aqueles estranhos termos marinheiros. De repente, ele parava de falar e apontava em seguida a vareta para um determinado aluno, habitualmente para o menos atento, e, em seguida, apontava para uma peça do navio e perguntava-lhe o nome - o aluno normalmente não dava a resposta certa, o que enfurecia o instrutor, que passava então a apontar a mesma peça dezenas de vezes repetidamente, obrigando o aluno a repetir o nome correto da peça a cada vez que ele a apontava, até o cansaço.

A respeito desse sargento, eram contadas muitas passagens curiosas ali dentro da escola e uma delas era a de que, certa vez, em uma das turmas anteriores à nossa, ele pegou em flagrante um aprendiz, à noite, tentando pular o muro da escola para a rua, a fim de fugir e, em tempo, conseguiu impedi-lo. Em seguida, ordenou ao aprendiz que se apresentasse à sala de estado para ser registrada a falta disciplinar no livro de castigo, que era um espécie de livro onde eram anotadas as ocorrências disciplinares. No momento de registrar, pois o sargento Reimão não era de dispensar ninguém, especialmente em se tratando daquele tipo de falta, pediu o nome completo do aprendiz e, como o nome era um tanto incomum, o sargento achou então muito complicado escrevê-lo e, diante disso, em vez de redigir a parte contra o aprendiz, optou por adverti-lo apenas e dispensou o rapaz.
Outra aula prática que tínhamos com o sargento Reimão era a de remo e vela. Para isso, logo pela manhã bem cedinho, arriávamos o escaler na água e colocávamos toda a palamenta - ou seja, os mastros, remos, vela, ancora, leme e cana do leme, coletes salva-vidas e tudo mais que fosse necessário para fazer-se ao mar. Em seguida, levávamos o escaler até junto à escada do cais da escola, próximo ao trampolim, a fim de que o sargento pudesse embarcar, pois ele era grande, muito gordo e barrigudo, e não conseguiria descer pela escada de quebra-peito, que usávamos para o embarque no escaler pelo cais defronte, de onde arriávamos a embarcação.

Todos a bordo, já sentados e segurando os punhos dos remos, o sargento Reimão, sentado à popa segurando a cana do leme, dava então a ordem para afastar a embarcação do cais .
Embarcação afastada do cais, recebíamos então a ordem de - Remos n’água!. E então começávamos a remar de modo cadenciado, com o sargento ao leme gritando a cadência dos remos na água e driblando, uma por uma as embarcações fundeadas, que por ali se encontravam em grande número, até que deixávamos pelo través o Forte de São Marcelo e, em seguida, a Sinaleira da ponta do molhe da entrada do porto de Salvador. Dali para frente, aproávamos para a Ilha de Itaparica, pegando o mar aberto da entrada da Baía de Todos os Santos. Depois de algum tempo remando, recolhíamos os remos e içávamos as velas, de acordo com as ordens do instrutor, e ele, a cada instante, ia nos mostrando a técnica da navegação à vela em pequenas embarcações.
Na Escola se praticava vários tipos de esporte e, dentre esses, o que eu mais apreciava era a natação, pois isso já fazia parte da minha infância, lá às margens do Rio Real. Ali também tínhamos uma boa equipe, formada pelos que mais se destacavam na natação, como o Esdras, o aluno mais graduado da turma e que viera lá de Sergipe, onde já praticava o esporte há muito tempo. De tempos em tempos, era criada uma competição entre os melhores nadadores aprendizes-marinheiros, quando então todos íamos lá para a ponte de atracação do caça-a-pau, que ficava no molhe da Sinaleira, e, dali, todos os concorrentes aguardavam as ordens do instrutor para se lançarem na água para o início da competição. Era uma prova de velocidade e a luta era feroz para se conseguir os três primeiros lugares, os quais receberiam prêmios que seriam vales para a compra na cantina da Escola. Mas o que mais importava mesmo para nós era a consagração dada pelos colegas, que ficavam ao longo do cais gritando os nomes dos primeiros colocados. Lembro-me que, certa vez, numa dessas competições, eu já me encontrava a pouco menos de cinqüenta metros da escada de chegada e haviam quatro ou cinco concorrentes à minha frente e as minhas forças começavam a faltar para conseguir ultrapassá-los, quando então alguns colegas começaram a gritar lá de cima do cais, estimulando-me, - Vamos lá Poeta! Vamos Poeta!. Naquele instante senti uma energia enorme dada por aquele estímulo e comecei a nadar muito mais rápido, conseguido ultrapassar quase todos os que estavam à minha frente, chegando em segundo lugar, quase junto com o Esdras, que era sempre o melhor nadador em todas as competições na Escola.

Nos primeiros quatro ou cinco meses, do curso de dez meses que recebíamos, as matérias lecionadas eram as mesmas para toda a turma de aprendizes, mas, daí para a frente, após uma seleção feita pela escola, éramos distribuídos em dois grandes grupos, sendo um de máquinas e outro de convés, seleção esta que, na verdade, não obedecia em nada ao desejo de cada um, de seguir uma determinada profissão e, assim, compulsoriamente, a Marinha nos ditava o tipo de serviço que iríamos realizar no futuro a bordo dos navios de guerra. Após essa seleção, fui escolhido para o grupo de serviços de máquinas, onde havia diversas especialidades, das quais uma seria escolhida para mim no futuro, seguindo o mesmo critério anteriormente adotado.
Já no grupo de máquinas, as aulas eram dirigidas para os assuntos da mecânica e da eletricidade em geral, assunto que aos poucos foi me empolgando e, por isso, não perdia a oportunidade de, mesmo fora das aulas, sempre que possível, pedir mais esclarecimentos aos nossos instrutores, como ao Suboficial Paulo ou ao Suboficial Epaminondas, que eram especialistas em motores, os quais estavam sempre prontos a nos responderem as questões.
Os meses se passaram e, na terceira quinzena de dezembro de 1955, terminávamos o nosso curso básico na Marinha, como Aprendizes-Marinheiros e, no dia 28 de dezembro daquele ano, coroava-se o nosso esforço com a cerimônia de formatura, quando passamos de Aprendizes para Grumetes da Marinha do Brasil.
O dia da formatura foi de muita alegria e emoção para todos nós. Para mim, particularmente, era mais um degrau da longa escada que a vida pôs à minha frente para escalar, assim minha felicidade era grande, mais ainda pela presença de Tio Antero, que sempre me estimulou e me ajudou no que pôde e, ali, eu o via também muito feliz.
A cerimônia foi preparada lá no campo de atletismo onde um grande palanque foi armado para abrigar as autoridades militares e civis, como o governador do Estado da Bahia, na época o Dr. Antônio Balbino. A nossa turma formou-se ao longo da pista de atletismo, defronte ao palanque, havendo, após alguns discursos, a tão esperada hora da entrega dos prêmios aos primeiros colocados da turma. Para mim, como para alguns outros da minha turma, aquele era um momento de grande expectativa, pois ninguém sabia de antemão a classificação obtida por cada um e, este mistério, perdurou até o último instante, quando então ouvimos o primeiro nome a ser chamado lá do palanque, e que era justamente o meu, como o primeiro colocado do grupo de máquinas. Para lá dirigi-me, quando então aproximou-se de mim o governador Antônio Balbino, para felicitar-me e entregar-me o prêmio, que era um lindo relógio da marca Lanco, folheado a ouro. Fiquei imensamente feliz com aquele presente e não parei de admirá-lo por um longo tempo.
Após a formatura, preparamo-nos para a longa viagem que iríamos começar, nos despedindo dos nossos amigos e parentes e, em seguida, rumando para o cais onde embarcaríamos a bordo do navio-transporte Custódio de Melo, que já se encontrava atracado, e que nos levaria para o Rio de Janeiro, para o início de uma nova vida.


VIAGEM PARA O RIO DE JANEIRO

Todos a bordo e em formação no convés, começa então a manobra de desatracação do navio do cais do porto de Salvador, enquanto, ali em terra, dezenas de parentes e amigos esperavam o instante da partida para o adeus, para o último aceno; e nós, a bordo, procurávamos manter a postura militar na formatura, mas, por dentro, todos tremíamos de emoção por aquele momento único de nossas vidas. O navio afasta-se lentamente, distanciando-nos aos poucos dos nossos entes queridos lá no cais, até estes se confundirem às nossas vistas, uns com os outros, nos acenos de adeus e boa viagem.
Deixando para trás o Forte de São Marcelo, os fundos da Escola e a Sinaleira, e com o navio aproado para a boca da barra da Baía de Todos os Santos, já sentíamos os primeiros caturros produzidos pelo mar aberto .
Para a maioria de nós, que nunca tínhamos viajado para fora da barra, estar em mar aberto fora uma experiência nova e sofrida nas primeiras horas, pois o mar aos poucos foi engrossando, deixando a maioria sem condições de se alimentar direito ou dormir. Na hora do almoço ou jantar, nos dirigíamos para a fila do refeitório, onde era servida a comida em bandejas, mas como não havia lugar para todos no salão, tínhamos que ir para o convés, a céu aberto, e ali procurar um lugar para sentar, fosse em cima das tampas das escotilhas dos porões ou em algumas tubulações que passavam ali pelo convés. Na primeira noite, dormir foi quase impossível, pois, com os caturros do navio, não havia quem conseguisse ficar deitado no beliche e o nosso corpo subia e descia sem parar em cima do colchão.


Nota do Autor

Esta é a parte 4 do livro Caminhos - Uma Viagem ao Passado.
Ao leitor que estiver interessado em adquirir esta obra de 10 capítulos, por favor contatar o autor por e-mail: psouza38@uol.com.br



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