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Contos-->Um anjo nu -- 06/08/2004 - 09:40 (Clóvis Luz da Silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Chamo-me Gabriel e vou lhes contar duas de minhas aventuras. À primeira impressão os fatos seguintes não são para se contar em rodas familiares, onde haja crianças que deles necessitassem tirar proveitos quaisquer para suas tenras vidas. A natureza dessas aventuras logo será percebida pelos leitores mais atentos, e somente não a revelo de imediato para não espantar os seres moralistas, aqueles que declaram ser impróprio às crianças se meter em assuntos que só os adultos deveriam discutir, ainda mais se tais assuntos tiverem a ver com intromissões carnais, ou melhor, introduções carnais, intercursos sexuais ou coisas do gênero.

Não estou sozinho nessa árdua tarefa de ultrapassar os limites que o moralismo impôs historicamente às crianças, negando-lhes o direito fundamental a qualquer ser humano de fazer com o seu corpo aquilo que sua consciência lhe autorize, depois de acuradamente verificar se os proveitos de suas ações serão maiores que os prejuízos. E ninguém há no mundo que faça melhor juízo dos fatos que as crianças. Pois bem, dizem que Shakespeare, aos oito anos, sob o banheiro onde se lavava uma prima sua, obteve pela primeira vez o prazer carnal conseguido de forma solitária e manual, e não mais parou de fazê-lo até o dia em que seu primo David, irmão da indefesa banhista, flagrou-o no ato obsceno, revelando o segredo para os pais do jovem William, os quais, como castigo, enviaram-no para estudar piano em Oxford. Contam também que Agostinho, antes de se tornar Santo, ainda criança, bulinava as partes da empregada que servia a casa de seu pai, alto oficial romano a serviço do império em Tagaste, pequena cidade africana. Como não posso me comparar, por plena incapacidade intelectual, a esses dois gênios da humanidade, tomo-os ao menos como exemplo naquilo em que a inteligência para pouco serve como norte, que são as aventuras sexuais na fase áurea da vida de qualquer homem.

Sou paraense, nascido aqui em Belém no dia 25 de junho, 1956. Minha vida quase toda teve como palco o bairro da Matinha, hoje Fátima, por causa do santuário erguido no bairro. O antigo nome devia-se ao fato de serem o matagal e os canais circundantes o cenário comum daquele tempo. Morava na Oliveira Belo, numa palafita que se sustentava sobre pontes, que serpenteavam os igapós da Matinha. E nesse tempo, meus colegas eram o Sérgio, o Perneta, o Jorge “Gia”, outro Sérgio, de alcunha “Carioca”, todos na faixa dos quatorze anos, menos o primeiro Sérgio, com dezesseis, sendo eu o mais novo deles, então com doze anos. Estudávamos no Pio X, colégio de freira. Era o ano de 1968, e costumávamos nos reunir depois do colégio, por volta das cinco da tarde, na Praça Brasil, descendo na rua da Souza Cruz, da fábrica Ocrim, que hoje é um moinho, para tomar banho na maré da baía do Guajará. Antes, obviamente jogávamos bola e pedras nas mangueiras. O banho era sagrado, pois tínhamos que chegar tuíras em casa, como prova de que o dia tinha sido bem vivido.

A diretora do colégio, irmã Angélica, tinha cerca de vinte e oito anos. Cabelos lisos e curtos. Rosto de anjo. Sob as longas vestes de freira eu supunha haver um belo corpo, e tanto que minha fértil imaginação a desnudava completamente. Eu não suportava o desejo de ver irmã Angélica nua. A casa das irmãs ficava no terreno do colégio, e como não podia mais agüentar o desejo de ver o lindo corpo da freira, chamei o Sérgio mais velho:
- Vamos ver a freira nua?
- Como, Gabriel?
- Eu descobri que a casa das freiras tem uma parte que dá pro forro, não tem grade, vai ser fácil, basta furar um buraco em cima do banheiro. Dizia isso com a maior naturalidade do mundo, sem nenhum medo que Deus me fulminasse com um raio no exato momento em que começasse a escalar a parede da casa.
- Não sei não...E se descobrirem? Vamos ser expulsos do colégio!
- Deixa de ser medroso, rapaz. Tu num tá a fim de ver a diretora peladona? Essa é a hora.
- E como tu vai furar o forro sem fazer barulho?
- Ora, rapaz, o meu pai tem um arco de pua...fácil, fácil vai surgir um buraco, sem nenhum barulho, no forro.

O banho das freiras às vezes coincidia com o horário do recreio, lá pelas quatro da tarde, uma hora antes de terminarem as aulas. Era uma segunda-feira quando eu fiz o buraco no forro. Na terça, veio a oportunidade. Por volta de quinze para as quatro, soou a campainha da merenda. Veio o suspense para saber se naquela tarde a irmã Angélica iria tomar banho no intervalo. A resposta veio com o fato de ela ter se dirigido à casa, e, minutos depois, com o barulho de chuveiro ligado. Chegara o dia de ver um anjo nu. Eu nunca tinha visto uma mulher nua na vida. Mesmo morando com duas irmãs, não tinha idéia de como era um corpo de mulher. Pra minha surpresa iria ver algo mais do que simplesmente uma freira tomando banho.
- “Meu Deus! Ela está enfiando o dedo no próprio sexo...”(pensei, porque se falasse alto tanto o Sérgio ia me puxar pra ver a cena como a freira iria ouvir e descobrir o fato criminoso). A água escorrendo por seus lisos e negros cabelos, acariciando suas alvíssimas mamas, às quais os raios do sol possivelmente chegaram apenas na infância antes que começassem a se avolumar, imediatamente levou meus olhos para aquela área escura, triangular, cabeluda, abaixo do umbigo, e minha mão para dentro da calça. Os céleres movimentos e os batimentos cardíacos acima dos níveis normais, evidenciavam o grau da libido prestes a fazer irromper do vulcão que a mão segurava um mero vapor. O êxtase de uma erupção vulcânica é um belíssimo espetáculo de fumaça, cinza e fogo, que abrasa, devora, consome tudo o que encontra pela frente. No meu caso, os doze anos permitiram um simples estremecimento no ventre, sem que uma mínima porção da lava do sexo masculino evidenciasse que havia chegado ao prazer solitário. A parte de Sérgio nesse episódio não me cumpre relatar.

Passados dois anos daquela memorável experiência, outro episódio marcaria minha conturbada juventude. Eu e Sérgio fomos estudar na Escola Técnica Federal do Pará. Mas foi o Jorge “Gia”, que não estudava lá e tinha dezoito anos, o meu parceiro nessa fabulosa aventura.
- Gabriel, tu queres conhecer uma mulher? Perguntou-me “Gia”.
- Conhecer, como? Eu conheço várias mulheres: a mamãe, minhas irmãs, a Suely. Respondi meio sem jeito, quase que revelando saber do que de fato o Jorge estava falando. Eu não queria, receoso, dizer pra ele que nunca havia tido relação com um mulher, pois na Matinha, naqueles anos setenta, os caras se dividiam em duas turmas: os considerados de maior, e os outros. O critério para essa divisão não era matemático, ou seja, não bastava ter dezoito anos, tinha que já ter “transado”. O inverso obviamente era verdadeiro. Quem já tivesse deitado com uma mulher era considerado pelos “experientes” um cara de maior, mesmo que fosse menor. O que eu iria responder pro “Gia”? Vai ver ele queria que eu passasse pelo ritual de admissão na turma dos considerados de maior pelo fato de sempre ter dinheiro pra dar uma “forra”.
- Não, homem, quando digo conhecer uma mulher quero dizer naquele sentido bíblico, sabe? Deitar com uma. Se tu quiser eu te levo lá, é só juntar o dinheiro da merenda de uma semana.
- Eu vou juntar o dinheiro e sábado tu me leva lá. Esse “lá” eu conhecia de tanto passar pela frente, já que ficava no caminho da feira da Jutaí. O nome do paraíso era “Mangueirinha”, perto da sede do Paraense. Bem, eu imaginava que fosse um paraíso porque toda hora entravam e saíam homens de todos os tipos, invariavelmente felizes, com o rosto cheio de satisfação. Um local onde os homem entram e saem sorridentes não é um paraíso? Quantos homens em Belém hão de se lembrar desse nome...

Houve um tempo em que os pais se preocupavam em disciplinar os filhos, cuidando que somente pudessem se divertir se antes tivessem cumprido todos os deveres escolares. No meu caso, papai somente me deixava sair para passear em um sábado no mês. Claro, na semana que antecedeu o sétimo dia, esforcei-me como nunca para ser o melhor filho do mundo. E fiz por merecer o passeio daquele sábado. Eu e Gia marcamos o encontro para as cinco da tarde na esquina da Diogo Móia com a Três de Maio, único local já aterrado de toda a Matinha, ponto de reunião da turma, onde brigávamos e nos divertíamos.
- Cadê o dinheiro, moleque?
- Calma, Gia, tu tá mais afobado que eu...Respondi com certa calma, não deixando parecer que estava mais ansioso do que uma mulher cujo filho recém nascido está sendo limpo para ser apresentado à mãe. Os minutos seguintes foram de total esvaziamento de todos os meus medos, sentimentos de culpa, nada me restando na mente senão a certeza de que a partir daquele dia seria respeitado por todos, pois teria me transformado em um homem de verdade, não mais submisso às constantes brincadeiras humilhantes de que eram vítimas os “baitolas”, os meninos que ainda não tinham “comido” uma mulher. Chegando às portas da vila onde as mulheres da Mangueirinha prestavam serviço, uma senhora aparentando ter mais de quarenta anos, olhando-me com um ar de desprezo, disse-me:
- Vem, menino, tenho pouco tempo, meu marido está quase pra voltar. Tira essa roupa, meu anjo, quero ver o que tu tens aí...

E assim foi a tarde e a noite do primeiro dia dos anos dourados de minha vida. Hoje, depois de trinta e três anos, ainda ando por essas ruas de Fátima, onde, no lugar da Mangueirinha, surgiu um imenso supermercado, chamado Formosa. O ser angelical, cujo corpo eu observava pelo buraco do banheiro, deu vez a uma mãe exemplar, que abandonou a vida religiosa por não suportar o abrasamento no corpo. O anjo que eu era aos olhos da prostituta, transformou-se em alguém dominado pelos instintos sexuais, que não pode viver sem a presença constante de um corpo feminino. Sem essas mulheres de minhas lembranças eu não seria o que sou. Talvez se não as tivesse conhecido fosse mais feliz. Por hora, vou fazendo a felicidade daquelas que me procuram para satisfazer seus desejos. Eu não cobro nada para amá-las e o que elas me dão em troca não tem preço. Quanto vale ser feliz? Quanto vale ver um anjo nu?
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